A Grande Reportagem da SIC invocou, na semana passada, o 30.º aniversário do terramoto de 1969. Uma questão foi deixada no ar: estará Portugal preparado para enfrentar uma nova catástrofe?
Em 2017 escrevi um disco conceptual sobre o Grande Desastre de Lisboa (1755). Além da pesquisa poética, visitei por duas vezes o IPMA e coloquei a questão aos seus cientistas.
Senti que o Instituto leva a questão muito a sério e que está pronto para dar o alarme quando o consensualmente inevitável tremor se abater sobre o nosso país, entrando por Lisboa.
Outra certeza com que saí foi a dificuldade em sensibilizar a classe política para o investimento a fazer em todos os campos, em essencial no da prevenção.
A convite da Sec. D. Inês de Castro, em Alcobaça, fui falar sobre o terramoto de 1755. A “aula” foi interrompida pelo exercício A Terra treme, dinamizado pela Protecção Civil. Além da galhofa e simulações feitas longe da vista e a passo de caracol, o resultado ao nível da sensibilização foi nulo, ninguém a falar directamente com os alunos, nem um panfleto.
Assim, arrisco-me a dizer que a resposta é não. Portugal, Lisboa, está muito longe de estar preparada para enfrentar um sismo de maior magnitude que os habituais abanões entre os 3 e 5 graus na escala de Richter.
O funcionamento da Protecção Civil, primeira na ordem dos responsáveis, é-nos, infelizmente, familiar.
O seu falhanço foi absoluto na tragédia dos fogos florestais na nossa região e o desenlace posterior enche de vergonha e de descrença quem se voluntariou ou doou o seu tempo e dinheiro na onda de “solidariedade” que se seguiu.
Hoje estamos a levar autarcas a tribunal e a resumir às queimadas grande parte da responsabilidade pelas ignições.
O Estado, através da gula camarária de [LER_MAIS] Lisboa, incentiva a construir edifícios ricos e imponentes à beira-rio. As gaiolas pombalinas são retiradas nas renovações de apartamentos em nome da luz dos open spaces.
Assunção Cristas quer que Lisboa seja uma Cidade do Mar. Cuidado com o que desejas. Quando o IPMA der o sinal com um avanço de 30 segundos, muitas coisas funcionarão.
O alerta permite desligar estações de alta tensão, bloquear edifícios, e iniciar a comunicação que será, pelo menos, mais rápida que em 1755 ou em 1969.
Nas ruas, julgando pelo laissez faire, laissez passer dos governantes, estaremos no “olho da tempestade”, entregues a nós próprios, como há quase trezentos anos.
Neste momento Lisboa só está preparada para se exibir ao turista, com todos os olhares na bolsa destes. Quando tremer, não haverá vaidade, nem nacionalidade, nem dignidade. Só o arrependimento de não levarmos a Natureza a sério.
*Músico