Foi uma das personalidades que mais se destacaram em 2019 e 2020, na área do Ambiente em Portugal, ao ser uma das faces da luta contra as dragagens no estuário do rio Sado.
Uma operação que, explica, além de destruir as “pradarias marinhas” existentes no local, pode desalojar permanentemente a colónia de golfinhos ali existente, única no Mundo.
Raquel Gaspar é natural de Leiria, bióloga marinha e co-fundadora da ONGD Ocean Alive, organização sem fins lucrativos, sediada no estuário do rio Sado, que promove a educação sobre o mar e cuja missão é incentivar comportamentos para a protecção do meio marinho, pela educação e envolvimento das comunidades locais costeiras.
Mas a missão está agora a sofrer um revés devido à pandemia, que impede que o trabalho seja realizado. “Estamos numa fase complicada de dinheiro. A Ocean Alive sustenta-se com serviços educativos e de team building, com grupos de pessoas, porém, devido à Covid-19, em 2020, a facturação foi nula”, revela.
Além disso, a organização não conseguiu o apoio de nenhum dos cinco projectos a que se candidatou.
Para que haja a esperança de que a ONGD possa continuar a defender o mar, as pradarias marinhas e o seu papel no sequestro do “carbono azul”, foi lançada uma campanha discreta de angariação de fundos, junto de empresas e particulares, em Dezembro, em www.ocean-alive.org/doar.
Mas os donativos foram curtos e estão longe do objectivo de 30 mil euros que são necessários. Ainda assim, Raquel não baixa os braços. Tem uma visão de [LER_MAIS]futuro onde quer continuar a trabalhar em 2021 e que passa pela promoção na estratégia para o ambiente e alterações climáticas da reflorestação do mar e a sua importância do “carbono azul”.
A marca do gorro vermelho
Natural de Colmeias, Leiria, Raquel Gaspar estudou no Colégio Conciliar Maria Imaculada e na Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo. Foi nesta instituição que o seu professor de Biologia, Costa Reis, haveria de marcá-la e ditar a sua paixão pelo mar.
Ele e os documentários, na RTP, sobre o mundo natural dos oceanos do explorador francês e inventor do escafandro autónomo Jacques-Yves Cousteau, que recordamos acompanhado pelo seu gorro vemelho.
Estudou Biologia na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, estagiou num estudo sobre os golfinhos do Sado e o doutoramento foi sobre a dinâmica populacional destes mamíferos.
“A reflorestação das pradarias marinhas, que são pouco mais de uma dezena em Portugal, combate a perda da biodiversidade e as alterações climáticas”, sublinha, explicando que os portugueses mantêm, há séculos, uma ligação forte com estas zonas, mesmo que isso lhes passe ao lado.
Número
35
O bacalhau cresce nas pradarias marinhas do norte da Europa. Sem elas, não há bacalhau. No Sado, albergam chocos, robalos e douradas, embora já tivessem tido muitas mais.
“Há dez anos, havia extensas pradarias na Caldeira de Tróia que hoje já não existem. Se recuarmos 40 anos, o estuário era um mar de pradarias. Além disso, as pradarias sequestram o carbono, responsável pelas alterações climáticas no solo, em vez de ser no corpo das plantas, como acontece com as florestas fora de água.”
A investigadora lança mais números à equação: por hora, são destruídos pelo Homem, o equivalente a dois campos de futebol de pradarias.
Se atendermos ao facto de que elas são apenas 0,25% do fundo marinho e que são responsáveis por capturar 10% do carbono armazenado pelo mar, facilmente se percebe o número seguinte: “um hectare de pradaria marinha sequestra 35 vezes mais carbono do que um hectare de floresta terrestre”.
E há ainda o impacto na diversidade daquilo que é pescado e nos chega à mesa, e no emprego, num momento em que muitos afirmam que o mar, como foi noutros tempos, será o futuro de Portugal.
Raquel Gaspar, que foi uma das pioneiras, em Portugal, da luta contra o plástico no mar, refere que a Ocean Alive pediu ao Governo que inscrevesse estas zonas e os sapais como sequestradores de carbono, no roteiro para a neutralidade carbónica.
No dia 6 de Janeiro, a cientista acordou com a notícia de que a Agência Portuguesa do Ambiente pretendia reunir com a sua ONGD e outros parceiros para discutir o “carbono azul”.
Uma pequena vitória que a Raquel diz ser uma motivação para continuar o trabalho de protecção do mar, que há décadas desenvolve.