Encontramos Luís Boal num barracão de aparência decrépita à beira da estrada, perdido no meio de um bosque de carvalho-cerquinho, lá para os lados de Alqueidão da Serra, no concelho de Porto de Mós.
Foi, durante anos, um espaço como tantos outros naquela região, dedicado à calçada portuguesa. Ficou, depois, ao desdém, até que nos últimos tempos voltou a ter actividade, ainda que completamente diferente. A pedra calcária foi trocada por rodas.
Num concelho com algumas das melhores pistas de downhill do País, como a do Figueiredo e mesmo a de Alqueidão da Serra, não é difícil os jovens terem um carinho especial pelas duas rodas.[pub-by-id pubid=’195′ f=’1′]Neste mundo, quem tem as loucas descidas das serras de Aire e Candeeiros só pode pensar naquilo e foi assim que, seguindo os passos de um primo mais velho, Luís Boal se agarrou ao volante e aos pedais por volta dos oito anos. Foi tanto o entusiasmo que não mais os quis largar. Até hoje.
Quando entramos no galpão, sentimo-nos num subúrbio de uma qualquer megalópole do primeiro mundo. Rara é o dia em que não vai fazer umas manobras. Só ou acompanhado. Naquele espaço da família, até então votado ao abandono, este rapaz de 20 anos decidiu há coisa de um ano criar o Rampyard Park.
Arranjou o patrocínio de uma marca de ferramentas e com a ajuda dos amigos, pintou, serrou, martelou, cortou. “Fomos buscar umas rampas abandonadas a Leiria, que iam ser destruídas.” Consertou-as, deu-lhes uma nova vida e novos utilizadores. Depois, foi só curtir, saltar, fazer manobras.
No fundo, este brinde que ofereceu a toda a comunidade foi um primeiro passo. [LER_MAIS]Percebeu que a vida que sempre aplicara às BMX, que lhe dera muitas alegrias, que o fizera ganhar muitos prémios, seria muito mais completa se em vez de se dedicar apenas à vertente competitiva pudesse ser, também, uma forma de vida.
Divulgar aquele mundo do freestyle que, “ao contrário do skate, tem perdido espaço”, passou a ser “uma missão”.
O pontapé de saída para esta mudança de paradigma acabou por ser uma lesão no joelho. Percebeu que uma carreira desportiva é sempre efémera.
Que o facto de ter sido o primeiro no País a conseguir fazer loucas manobras em voo, como o cannonball barspin ou o oppo tailwhip para barspin, eram medalhas que de pouco lhe valeriam. Queria ser líder num projecto e filantropia.
E como a zona Centro, mormente o distrito de Leiria, foi sempre “o ponto mais forte do País” – “quem não se lembra de Nuno Milhinhos?” –, não demorou a começar a ser visitado.
“Então quando chove…” Vêm de Pombal, de Leiria, das Caldas, de Rio Maior, do Norte, do Sul. “Na semana passada esteve cá um rapaz de Vigo. Até para ele estas são as rampas cobertas mais próximas.”
É algo que o deixa realizado. Sentir-se “útil” ao grupo. Até foi por isso que decidiu avançar com a criação da Rude Action Bike Tour, um grupo de bikers – do qual faz parte – que faz demonstrações de freestyle em eventos, o último dos quais na Batalha.
“É óptimo sentir que estão a fazer o que mais gostam, estão a divertir-se e a sentir-se reconhecidos, e no final ainda recebem alguma coisa por isso”, sublinha.
Pumptrack
É incontestável, Luís Boal é um rapaz empreendedor. E foi por causa desse espírito que Alqueidão da Serra tem “a melhor pumptrack do País”. No final do ano passado, submeteu a votação do Orçamento Participativo do concelho de Porto de Mós a implementação de uma pista desta variante de BMX.
O povo da terra e a comunidade freestyler aderiram em massa e tornaram o projecto vencedor, com 533 votos, mais 375 do que o segundo classificado. Até pode ter havido ciumeira nas outras freguesias, mas a obra avançou e é uma referência desde que foi inaugurada, em Outubro último.
“Vem gente de todo o lado e espero que seja possível receber neste espaço um grande evento internacional, patrocinado pela Red Bull,” sublinha Luís Boal, satisfeito, também, por poder dar este instrumento decisivo aos jovens da terra que se queiram iniciar na modalidade.
É que uma pumptrack permite desenvolver a técnica, pois trata-se de uma pista caracterizada por múltiplas elevações, depressões e curvas sobrelevadas, que em conjunto formam obstáculos que permitam manter a velocidade do ciclista que deve percorrer a totalidade do percurso sem necessidade de pedalar, ganhando velocidade apenas com a transposição dos obstáculos.
As ideias continuam a pulular-lhe na cabeça. Projectos não lhe faltam. Sabe mexer-se. Os patrocínios que tem recebido, seja de marcas de roupa, de ferramentas, de uma agência de comunicação, de um óleo de limpeza e anti-ferrugem ou de óculos de sol são, acima de tudo, em material. Mas continua a magicar.
Pensa lançar uma marca de bicicletas. Tem previstas novidades para o espaço circundante à Rampyard. Fica a nossa previsão: este miúdo vai longe.