Numa economia em que um número crescente de actividades está a ser automatizado, são as pessoas que fazem e distinguem as empresas. Aos desafios colocados pela digitalização será preciso responder com a qualificação dos recursos humanos e com a valorização das chamadas soft skills.
O alerta foi deixado na passada sexta-feira por Luís Mira Amaral num dos painéis do X Congresso da Indústria de Moldes, onde vários empresários defenderam a necessidade de a formação académica e profissional ser adaptada aos novos paradigmas. Para o representante da CIP, “as atitudes e comportamentos perante os desafios são questões fundamentais”.
A transformação acelerada a que as empresas estão sujeitas, aliada à automação de inúmeras tarefas laborais, levará a uma cada vez maior valorização das competências comportamentais e sociais, como a capacidade de resolução de problemas complexos, criatividade, capacidade de colaboração e inteligência emocional, entre outras.
Mira Amaral lembrou ainda a falta de recursos humanos, sentida não apenas pela indústria de moldes mas também por outras, considerando que “é o grande estrangulamento” ao desenvolvimento da economia portuguesa. “A fábrica Portugal SA tem falta de recursos humanos para poder crescer”, disse no evento realizado na Quinta do Paul, concelho de Leiria.
Nuno Silva, da Moldit, lembrou que as mudanças em curso trazem associada a necessidade de novas competências, pelo que o grande desafio é a adaptação da formação. Reconhecendo a importância das soft skils, o empresário destacou também a importância do conhecimento técnico. E frisou que, não havendo pessoas suficientes para entrar no sector, “será preciso aproveitar as que temos da melhor forma possível”.
O também presidente do Centimfe mostrou-se ainda preocupado com a formação que, num contexto de cada vez maior digitalização, será preciso dar às 11 mil pessoas que trabalham actualmente no sector dos moldes, a maioria de “idade madura”. Colocá-las ‘à vontade’ face a novos processos pode ser “extremamente difícil”. Por isso, a transformação em curso implica um “olhar urgente” para a formação.
“Vamos continuar a precisar de pessoas, apesar da digitalização. Os novos processos tecnológicos vão ajudar a colmatar a falta de mão-de-obra”. Nuno Silva partilhou a ideia, antes avançada por Mira Amaral, de que as empresas tenderão a contratar pessoas que mostrem capacidade de aprender ao longo da vida, mesmo que vindas de outras áreas. Depois, cada empresa ministrará formação técnica à medida.
A este propósito, Tiago Cruz, gerente da Neckmolde, referiu que nesta empresa há três “casos de sucesso” de profissionais cuja formação base é da área da cozinha. Mas têm competências consideradas fundamentais na área dos moldes, como a organização e a capacidade de trabalhar sob pressão.
“São as pessoas que dão vantagens competitivas às empresas e as tornam inimitáveis”, defendeu por sua vez Jorge Santos. O director-geral da Vipex afirmou que a única coisa que pode diferenciar uma organização é a forma como se articula, porque todos sabem onde comprar equipamentos e matérias-primas.
[LER_MAIS] O gestor lembrou que muitos dos nossos talentos saem do País e não se mostram disponíveis para voltar, até porque a fiscalidade os desincentiva. Um ordenado de dois mil euros paga mais de 300 euros de IRS, exemplificou.
As empresas só poderão pagar melhores salários se a produtividade aumentar, e para isso o País tem de ser mais competitivo. O que não está a acontecer. “Há países que seguem por estrada alcatroada, mas nós, apesar de tão bem equipados como eles, vamos numa estrada de areia”.
Partilhando da opinião de uma outra empresária do sector, Jorge Santos defendeu que “estamos a viver a indústria 4.0 mas temos um Estado 2.0”, o que dificulta a gestão e a atracção de talento. Exemplificou com a questão do banco de horas e com a legislação que leva a que haja duas realidades distintas: os que “pretensamente têm emprego para toda a vida”, porque as empresas não conseguem despedi-los se forem maus trabalhadores, e os que vivem de trabalho temporário ou a contrato, porque as empresas têm receio em torná-los efectivos.
Para Joaquim Menezes, também as lideranças são fundamentais. “Podemos ter gente muito qualificada, mas precisam igualmente de ter vontade de fazer, de fazer diferente, de aprender. Isso tem muito a ver com líderes, que escasseiam”, disse no segundo dia do congresso o presidente da Iberomoldes.
Os novos desafios a que a indústria de moldes vai estar sujeita obrigam a “encontrar novas soluções”. “O rápido desenvolvimento tecnológico e a constante assimilação de novos processos têm sido constantes e terão um peso enorme nos novos investimentos das empresas”, lembrou João Faustino no encerramento do congresso.
Automação, estandardização, digitalização, design for manufacturing ou produção zero defeitos foram alguns dos temas discutidos. “São e serão conceitos cada vez mais presentes e para os quais deveremos estar devidamente preparados para responder”.
Para tal, “a aposta na inovação, no conhecimento, na qualificação e formação sistemática das pessoas será fundamental”. Contudo, defendeu o dirigente, será a capacidade de colaboração, cooperação e criação de massa critica que será estruturante, quer para a indústria se diferenciar quer para se situar “um passo à frente” da concorrência internacional.
A indústria precisa de técnicos “altamente qualificados, integrando equipas multidisciplinares, com atitude crítica e pró-activa, pelo que será fundamental continuar a actuar em dois sentidos: reter o talento existente nas empresas, por um lado, e atrair novas competências, por outro”.