É uma viagem às entranhas de Timor-Leste. André Reis e Hélio Frade, espeleólogos de Ourém, integram a expedição portuguesa que, até ao próximo dia 6 de Outubro, estará naquele território para conhecer e explorar os segredos que o subsolo de Timor ainda tem por revelar.
A presente missão faz parte de um projecto mais vasto, iniciado em 2016, e ao qual se encontram associados Sofia Reboleira, bióloga natural de Caldas da Rainha actualmente ligada ao Museu de História Natural da Dinamarca, e vários espeleólogos do GPS – Grupo de Protecção de Sicó, uma das quatro associações de espeleologia portuguesas que dinamizam a iniciativa, contando com o apoio da Universidade Nacional de Timor-Leste e da Fundação Oriente.
Sérgio Medeiros, que esteve em Timor na primeira expedição, realizada em 2016, conta que o projecto Timor Subterrâneo é concretizar de uma ideia que começou a germinar na mente de alguns dos seus intervenientes em 1999, quando assistiram em Lisboa a uma apresentação sobre grutas do sudoeste asiático.
“Timor aparecia com muitos pontinhos vermelhos, que demonstravam o potencial espeleológico daquele território, ainda totalmente desconhecido.”
Mas só em 2015 é que ideia ganhou forma, quando Manuel Freire, do Núcleo de Espeleologia da Universidade de Aveiro (NEUA), lançou o desafio a mais três associações congéneres portuguesas para avançar com o projecto, que pretende fazer o inventário e cantografia das grutas de Timor-Leste e, ao mesmo tempo, melhorar o conhecimento do potencial hídrico do país.
“Um dos problemas de Timor é o abastecimento de água para consumo das populações, mas também para actividades agrícolas e pecuárias. O território tem um enorme potencial em termos de água subterrânea, que é fundamental preservar”, frisa Sérgio Medeiros.
É por isso que, a cada expedição, a equipa estabelece contactos estreitos com a população, mostrando imagens do que fazem e realizando acções de sensibilização ambiental.
[LER_MAIS] A formação de espeleólogos locais, que possam dar continuidade ao trabalho, é outro dos objectivos do projecto. “Quando chegámos, em 2016, encontrámos apenas alguns jovens curiosos que faziam actividades esporádicas. Hoje, com a nossa ajuda, já existe um grupo de espeleologia Díli”, revela aquele especialista do GPS.
“Estamos a implementar a espeleologia no país. Em sonho algum podíamos ter sonhado com isto”, confessa, com indisfarçável orgulho, André Reis que, tal como Hélio Frade, integra o Centro de Estudos e Actividades Especiais (CEAE) da Liga para a Protecção da Natureza.
Espeleólogos desde 2008, tanto André Reis como Hélio Frade já participaram em “variadíssimas” experiências do género na Europa, mas, asseguram, “nenhuma se compara a esta”.
A relação histórica e afectiva entre portugueses e timorenses fazem desta uma expedição especial. “É um povo único com uma ligação incrível connosco. Sentimos isso quando estamos na montanha e descobrem a nossa nacionalidade”, contam os espeleólogos, que estão em Timor desde 9 de Setembro e que aí vão ficar até 6 de Outubro.
Os dois são repetentes na experiência. André vai já na terceira expedição, enquanto Hélio participa pela segunda vez. “Timor é uma experiência incrível. Nunca se esquece e, quando voltamos, surpreende-nos sempre. Queremos continuar os trabalhos dos anos anteriores. Esse é o principal objectivo”, avançam os espeleólogos de Ourém.
Refúgios da resistência timorense
A par da formação em espeleologia, a equipa presente em Timor irá prosseguir com o inventário e cadastro das cavidades, explorando grutas já conhecidas e descobrindo e dando a conhecer novas.
“Timor é um país pequeno, mas tem um potencial brutal. Grande parte do território é constituído por calcário em zonas de montanha – a mais de dois mil metros de altitude -, com grande probabilidade de ter grutas gigantesca”, nota Sérgio Medeiros, frisando, contudo, as dificuldades em pôr a descoberto esse potencial.
Além dos acessos precários – “fora da capital, quase só se circula em viaturas todo-o-terreno” -, “faltam pessoas com conhecimento” do território. “Não podemos esquecer que durante a ocupação Indonésia houve muita gente que morreu. Pessoas que conheciam bem aquelas montanhas e que já cá não estão para passar esse conhecimento”.
Muitas das cavidades naturais, que fazem parte do património espeleológico de Timor, terão, aliás, servido de refúgio para a resistência timorense, que fez frente aos militares indonésios durante os anos de ocupação.