Quando abriu portas, há quase seis anos, havia a expectativa que o Centro Cívico, localizado no coração do centro histórico de Leiria, trouxesse mais movimento à zona. No entanto, com o passar do tempo, essa esperança foi esmorecendo entre quem mora ou tem negócios abertos nas imediações do edifício, da autoria do arquitecto Gonçalo Byrne.
O espaço, cuja dinamização está entregue às associações SempreAudaz e Fazer Avançar, passa hoje longos períodos encerrado, havendo, por isso, quem reclame uma alteração ao modelo actual, que permita outro tipo de ocupações, mantendo ou não os utilizadores actuais.
Entre quem sugere a instalação de serviços públicos no local, como o Balcão Único da Câmara, o posto de turismo ou um gabinete de reabilitação urbana do centro histórico, há também quem proponha a concessão parcial do edifício para café com esplanada, ao mesmo tempo que se devem abrir “mais” as portas a outras associações culturais do concelho, para aí promoverem eventos.
Moradora no centro histórico, Fernanda Sobreira acredita que, mesmo amputado do projecto inicial, que previa um auditório, o centro cívico “podia e devia” ter mais actividade. “Está muito mal aproveitado. Encontra-se fechado a maior parte do tempo. Tal como está, é um elefante branco, muito carinho por sinal”, diz, referindo-se ao custo da obra, que rondou os 900 mil euros.
No seu entender, é necessário “reformular a função” do Centro Cívico. Sem prejuízo de as associações que actualmente ocupam o espaço se poderem manter no local, a moradora considera que há margem para o movimento associativo se juntar e dinamizar o espaço, “com actividades regulares”.
Por seu lado, Ana Paula Moreira gostaria de ali ver a Loja do Cidadão, mas agora que esta está destinada a ocupar o antigo Paço Episcopal, a lojista defende que o Centro Cívico poderia acolher o posto de turismo.
“Pelo menos, 'obrigaria' os visitantes a vir até à rua Direita”, alega a proprietária da Chapelaria Sapataria Liz, localizada em frente ao edifício, que se confessa “triste” por o ver não só subaproveitado, mas também frequentemente “vandalizado”, com as suas paredes e vidraças a serem usadas “como casa de banho”.
[LER_MAIS] Além de sugerir a instalação no local do posto de turismo, ideia que é partilhada por outros lojistas, Ana Paula Moreira admite que no Centro Cívico poderia também caber “uma livraria com espaço para café”. E, seguindo uma ou outra via, ou até as duas, o local devia acolher “mais eventos”, que trouxessem pessoas ao centro histórico, apontando como “bom exemplo” o festival A Porta.
Considerando que, tal como está, o Centro Cívico “não é uma mais-valia para a cidade”, Luís Ferreira, sócio- gerente do Espaço Eça, acredita que a melhor forma de dinamizar o edifício será através da “instalação de serviços públicos”. Isso sim, diz, “iria trazer dinamismo” a esta zona da cidade, porque “as pessoas teriam de circular”.
A par do posto de turismo, Luís Ferreira sugere a mudança do Balcão Único da Câmara para o Centro Cívico. “A falta de estacionamento é uma falsa questão. Nas imediações existem vários parques, como o da antiga Zara, o da Fonte Luminosa ou do Mercado de Sant'Ana. É verdade que são a pagar, mas junto à Câmara também se paga para estacionar”, alega o empresário, acrescentando que, com a informatização, esses serviços não implicam ter no local os processos em papel.
Luís Ferreira admite ainda que a instalação de um gabinete de reabilitação urbana poderia também dinamizar o espaço, ao mesmo tempo que seria “um bom apoio” para quem pretende investir na zona histórica.
Proprietário do restaurante Mau Manel, vizinho do Centro Cívico, Diogo Figueira Silva considera este é “mais um exemplo do desleixo com que a Câmara trata os comerciantes da zona histórica”. No seu entender, “é preciso pensar como se pode potenciar o espaço”, dando- lhe mais actividade, através, por exemplo, da dinamização de eventos culturais.
“O edifício já está a degradar-se e é frequentemente vandalizado, servindo como casa de banho. Custa vê-lo como está”, confessa.
Actividades para seniores e na área das línguas
A dinamização do Centro Cívico está, desde a sua abertura, entregue às associações SempreAudaz e Fazer Avançar.
A primeira desenvolve actividades relacionadas com a sua Academia Sénior, que funciona de Outubro a Junho, entre as 14 e as 17:30 horas, de segunda a sexta-feira, sendo que o protocolo com a câmara prevê que a associação abra também o espaço ao sábado à tarde. “Não faz muito sentido. Iremos tentar rever esse ponto do acordo”, adianta Graça Sampaio, presidente da SempreAudaz.
No último ano, a academia contou com cerca de 70 inscritos, “a maioria professores aposentados e antigos funcionários da Caixa de Providência”. A instituição disponibiliza aulas de história, gastronomia, literatura portuguesa, inglês e música, dispondo também de um coro e de grupo de cavaquinhos. Dinamiza ainda outras actividades culturais, umas só para os seus utentes, outras abertas à comunidade, como “apresentação de livros ou conferências”.
Por seu lado, a Fazer Avançar informa que desenvolve no local actividades relacionadas com vários projectos da associação, em áreas como “acompanhamento e suporte a pessoas refugiadas”, “intercâmbio de línguas e culturas e organização de eventos”.
Segundo o presidente da organização, Hugo Menino Aguiar, recém-reconduzido no cargo (ver peça ao lado), também costumam “ceder espaço a actividades de outras associações quando o solicitam” e, no futuro, pretendem usar a sala para “um programa de mobilidade jovem com parceiros nacionais e europeus”.
“Pela sua natureza, o Centro Cívico deve ser um espaço ao serviço do movimento associativo do concelho. Ali têm desenvolvido actividade associações que realizam o seu trabalho junto de distintos escalões etários da nossa sociedade, os jovens e os seniores”, refere o vereador da Cultura e vice-presidente da Câmara.
Gonçalo Lopes considera, aliás, que esse “é um factor de grande importância, uma vez que se pretende, por esta via, contribuir para uma maior aproximação, diálogo e interacção entre estes dois grupos etários”.
Reforçar ligação ao movimento associativo
Além da actividade da Fazer Avançar e da SempreAudaz, “que naturalmente poderão ter períodos de maior ou menor dinamismo consoante a sazonalidade das suas propostas de intervenção”, o autarca alega que “a praça [Eça de Queirós] tem sido utilizada para a realização de outras actividades, de que é exemplo o festival A Porta” e que o desejo da câmara “é que outras iniciativas de cariz social, cultural ou solidário ali possam decorrer, sempre privilegiando o movimento associativo” do concelho.
“Esta é uma filosofia que nos parece adequada ao Centro Cívico e que desejamos que seja aprofundada”, reforça. Gonçalo Lopes sublinha ainda a importância que o projecto teve na reabilitação daquele espaço, que, “além de degradação, passava um sinal contrário àquilo que é o desejo do Município de estimular a renovação da zona histórica”.
“Acreditamos que a sua construção contribuiu para motivar os privados a apostarem na renovação dos seus imóveis, um fenómeno que actualmente se verifica com grande intensidade.”
Projecto inicial previa auditório
O projecto inicial do Centro Cívico previa um auditório em cave. A decisão de eliminar o anfiteatro suscitou polémica, com os críticos a alegarem que o auditório permitiria actividades que poderiam gerar afluência ao centro histórico.
Apesar de lamentar a opção, a maioria socialista justificou-a com o facto de este ser um projecto-âncora de uma candidatura e que, se a obra não estivesse concluída dentro do prazo previsto, o que aconteceria com a criação do auditório, perdiam-se os fundos para as restantes intervenções.