Quase 3,2 milhões de euros é quanto custará à Câmara de Leiria a resolução do imbróglio relacionado com a urbanização Vale da Cabrita, evitando a demolição de 151 fogos já determinada pelos tribunais.
Após mais de 20 anos de processos judiciais, o Município chegou a acordo com os proprietários dos lotes que ainda se encontram vazios e que estiveram na origem do processo que levou à sentença de demolição.
A solução passa pela aquisição dessas parcelas pela Câmara, por cerca de 3,2 milhões de euros, aprovada na terça- feira pela Assembleia Municipal, com dois votos contra (BE e PCP) e uma abstenção (presidente da Junta de Colmeias e Memoria).
“É a única hipótese que temos. Esperamos que tenha sucesso e que seja uma porta de saída para um problema que se arrasta há tempo de mais”, afirmou o presidente da Câmara.
Raul Castro explicou que, “se o município for proprietário”, pode pedir a “revogação” da execução da sentença que determinou a demolição de 21 lotes no Vale da Cabrita, num total 151 fogos, e a remoção das infra-estruturas urbanísticas (redes de águas, saneamento e telecomunicações).
Frisando que para executar a sentença “seriam necessárias dezenas de milhões de euros”, “o que poria a Câmara Municipal numa situação de insolvência”, Raul Castro adiantou que, após a resolução do processo, a intenção da autarquia é “pôr à venda” os lotes que agora irá adquirir.
[LER_MAIS] “O Município não pode fugir às suas responsabilidades como principal culpado de um processo que se arrasta há quase 34 anos [o loteamento foi aprovado em 1985]”, defendeu José Cunha, presidente da União de Freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes, que sublinhou a “incerteza” com que têm vivido os moradores da urbanização, “sem saberem se a sentença é ou não executada e sem conseguirem vender”.
Por outro lado, os proprietários dos nove lotes “não podem construir”, “pagam adicional ao IMI e estão ser notificados para limpar os terrenos”, acrescenta José Cunha, para quem a solução agora encontrada vem “minimizar todos os erros que o município cometeu ao longo dos anos”. Esse é também o entendimento de João Cunha, eleito do PSD, para quem a solução permitirá “repor a normalidade na vida de quem” ali mora.
Ilegalidades “sem sanção”
Por seu lado, Teresa Neves, do PCP, considerou que “não é justo ser toda a população do concelho a pagar pela leviandade de agentes concretos” e que “não é claro que seja esta a decisão que iliba de responsabilidades” os órgãos municipais.
“Não contem connosco para lavar um passado cheio de mágoas”, afirmou a representante do PCP, que justificou ainda a posição do partido com a “insuficiência de argumentos” que sustentem a decisão da Câmara.
O presidente da Junta de Colmeias e Memória questionou o executivo se houve responsabilização de quem permitiu que os índices de construção dos lotes edificados fossem ultrapassados ou se o caso passou com impunidade. “Penso que não houve qualquer sanção aos procedimentos”, respondeu Raul Castro.
O caso remonta a 1988, quando a Câmara de Leiria aprovou o loteamento que compreendia 50 lotes. Quando os proprietários dos nove lotes finais quiseram avançar com a construção, já o índice do loteamento estava esgotado, com aedificação de pisos a mais em alguns prédios.
Para tentar regularizar a situação, foi alterado o alvará do loteamento, à custa da redução dos índices de construção dos lotes ainda vazios. Um dos proprietários moveu um processo contra a câmara e viu a justiça dar-lhe razão.
Em 1999, o Tribunal Administrativo de Circulo de Coimbra (agora designado por Tribunal Administrativo e Fiscal), considerou nulo o alvará de alterações e determinou a “demolição dos edifícios já implantadas na sequência das alterações ao alvará”, sentença que foi confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo.