“O meu objectivo é que saiam daqui bastante mais confusos do que entraram e com muito menos certezas.” Foi assim que Alexandre Quintanilha, presidente da Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, começou a Oração de Sapiência da abertura do ano lectivo do Instituto Politécnico de Leiria (IPL), subordinada ao tema Os Desafios Actuais na Biomedicina.
Revelando algumas “curiosidades”, o físico disse que “herdamos da nossa mãe 50,05% do nosso material genético e 49,95% do pai. Somos, por isso, mais filhos da mãe do que do pai”.“Noventa por centro das células do nosso corpo não são humanas, são bactérias e fungos. Mais surpreendente ainda é que 99% da informação genética que transportamos não é humana: 80% é de vírus, 15% é das tais bactérias e fungos, 4% ninguém sabe de quem é e 1% é humano”, acrescentou.
Segundo o investigador, através das ciências naturais, sociais e humanas, “fomos alterando o nosso ambiente natural em milhares de anos”. A estimulação intelectual, a alteração da biologia ou de estados emocionais são exemplos. Para Quintanilha, tudo o que está a acontecer nas nano-ciências, na engenharia genética, nas tecnologias da informação e nas ciências cognitivas está a trazer discussão pública que, adianta, deve ser feita especialmente em instituições de ensino.
[LER_MAIS] Apontando que a anestesia, a reanimação, a contracepção ou o antibiótico foram inovações que trouxeram algumas resistências, Quintanilha lembrou que houve vozes que se mostraram preocupadas com esta evolução, considerando que se estava a “interferir demasiado com a natureza”, que “aparece como uma coisa mais ou menos perfeita”.
Alexandre Quintanilha dá um exemplo: “Há uma religião que não permite transfusão de sangue. Ou a doença se cura por si própria, ou não se cura. Isso é um extremo. Depois há o outro extremo, de quem acha que o nosso envelhecimento é só uma questão de canalização. Quando algo deixar de funcionar, substitui-se.”
O professor recordou ainda que a vacinação também já foi, ou é, muito controversa, pois quem é contra entende que “é interferir na natureza”. “A vacinação mantém pessoas vivas que deviam morrer e que não vão contribuir para o processo normal da evolução da criação de existências.”
Para Alexandre Quintanilha, é uma certeza que todos consideram que a inovação, seja no ensino de qualidade, na nutrição saudável, nas vacinas, ou em muitas outras áreas, é importante para as gerações futuras.
E questiona: se promovemos esses recursos e vantagens ambientais, por que não promover também recursos genéticos? “Não só eliminando doenças, que já fazemos, mas também dando algumas protecções. Se soubéssemos que havia uma combinação de letras do DNA que impedisse que as pessoas que têm HIV desenvolvessem a sida, quem não queria ter isso para os seus filhos?”, conclui.
De 670 mil euros para 11 milhões
Naquele que foi o seu último discurso de abertura do ano lectivo, enquanto presidente do IPL, Nuno Mangas fez um breve balanço dos oito anos e salientou que “hoje o Politécnico de Leiria tem uma oferta formativa mais diversificada e diferenciada e, sobretudo, mais relevante para a região e para o País”.
Lembrando que o número de estudantes de mestrados triplicou, o presidente salientou que a instituição tem cerca de 1800 estudantes a frequentarem Cursos Técnicos Superiores Profissionais, sendo a “instituição de ensino superior nacional com mais estudantes inscritos neste tipo de formação”.
Nuno Mangas destacou que ao nível da investigação e inovação, registou-se a “maior evolução nos últimos anos”. Estão em desenvolvimento 89 projectos de investigação, desenvolvimento e inovação, envolvendo mais de 130 instituições, incluindo 60 empresas. “O valor global dos projectos desenvolvidos ascende a mais de 59 milhões de euros, dos quais 11 milhões correspondem a financiamento referente à participação do IPL. Em oito anos passámos de 670 mil euros em 16 projectos para 11 milhões de euros em 89 projectos”, revelou.
Mangas alertou ainda para o facto do financiamento público do IPL ser “dos mais baixos no contexto do ensino superior em Portugal”. “Só foi possível manter o nível de actividade com contas equilibradas, graças ao grande esforço de contenção e racionalidade” e à “geração crescente de receitas próprias adicionais, muitas delas com origem nas actividades de investigação e inovação”.
Considerando que o IPL “tem tido um papel crescente na produção, disseminação e transferência do conhecimento”, é “crucial que não veja a sua capacidade de actuação limitada”, alertou Nuno Mangas, salientando que o plano estratégico do horizonte 2020 aponta “como orientação estratégica a evolução para Universidade Técnica”.
Manuel Heitor, ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, destacou o “caso exemplar” da formação superior nas cinco escolas do IPL, que são “consideradas referências a nível europeu”. “A minha presença aqui é o reconhecimento do vosso trabalho. O Politécnico de Leiria desempenha uma posição líder e de referência neste ensino.”
Manuel Heitor referiu ainda que a “próxima década passa por alargar o esforço do ensino superior e da investigação a todas as zonas do País e, nesta zona, o IPL é instituição charneira em torno da qual gera actividade de âmbito social, económico e cultural”.
O governante acrescentou que o IPL “é das instituições com maior penetração na área de investigação” e desafiou que são necessários “mais politécnicos de Leiria”.