Como vê a instalação de novas superfícies comerciais em Leiria? Vai nascer um empreendimento no espaço da antiga Proalimentar e outro na antiga Auto-Leiria…
Penso que a vinda destes espaços para Leiria é importante, é boa para a cidade, é sinal de que está em crescimento e é empreendedora. Também ao nível da empregabilidade, é bom para a região termos mais empresas a criar emprego. Acredito que para o comércio de rua também será bom. Não vai trazer qualquer tipo de problema. Quanto mais pessoas trouxermos para a cidade melhor, porque há um défice de pessoas em Leiria. É como o mercado ao sábado. Não gosto dele, não é digno para uma cidade como Leiria, mas atrai muita gente. É pena que a loja Pingo Doce a abrir no novo shopping não seja de maior dimensão. Actualmente temos apenas uma superfície de grande dimensão, pelo que não temos poder de escolha. Devíamos ter alternativa que lhe pudesse fazer concorrência.
O que está por trás desse défice de pessoas na cidade?
Tem que ver com o facto de não haver habitação disponível, nem para comprar nem para arrendar. Isso é um problema. A crise levou muitos jovens de volta para casa dos pais, saindo do centro da cidade.
E fecharam serviços, fechou a Zara…
Sim, mas abriram outras lojas. Os comerciantes têm cumprido com o que lhes compete, que é inovar, para atrair pessoas, mas também é competência da Câmara Municipal promover serviços que fazem falta à cidade e que poderão colmatar a tal falta de pessoas. Como a Loja do Cidadão, de que há anos se fala. Esperamos que venha para Leiria, e que seja instalada na antiga Zara. Será uma nova centralidade que se cria, que atrairá pessoas, o que será importante para o comércio.
Há demasiada oferta para a procura existente?
Não. A oferta é diversificada. Temos muita gente de fora da cidade que nos procura, porque o nosso comércio é dos melhores na região Centro. Isto nota-se nomeadamente quando se realiza o Shop On, que atrai pessoas da Figueira da Foz, Coimbra, Torres Novas, Alcobaça, Caldas da Rainha, Santarém e outros locais Temos um bom comércio. Faltam é condições para receber as pessoas. É o caso do estacionamento, que é caríssimo, quer nos parques subterrâneos quer à superfície. Isso é um problema muito grave que outras cidades não têm. Os parques de apoio, afastados do centro, não funcionam. Não há uma cidade onde isso funcione. Temos associados que têm 10 e 12 funcionários, que vêm de fora, e que não têm onde estacionar o carro, porque foram colocados parquímetros nas zonas onde trabalham. Ninguém na Câmara pensa nisto. Parece que as pessoas não existem, que não precisam de vir para a cidade trabalhar, parece que para esta entidade o comércio e os serviços não existem, quando na verdade são a grande força da cidade, o maior empregador. A Câmara Municipal e os seus responsáveis deviam olhar para os comerciantes de Leiria de forma mais digna. Não estou a dizer que não tenham sido feitas algumas coisas, mas é preciso mais, como o plano de mobilidade e as obras na Avenida Heróis de Angola, para ter menos carros e melhores condições, nomeadamente ao nível da iluminação, que é obsoleta, e o arranjo dos passeios em várias ruas da cidade.
O comércio de rua tem sabido reinventar-se? Houve milhares de euros de apoios para modernização…
[LER_MAIS] Sim. Há uma nova geração a criar novos espaços e novos negócios. Isto é muito importante. A juventude, com a sua vivacidade e empreendedorismo, tem feito muito por Leiria. Há muitos jovens a pegar em negócios e a criar emprego.
Tem havido resistência ao encerramento da rua Direita ao trânsito, mas a verdade é que, mesmo com tráfego, esta zona está cada vez mais arredada do circuito comercial da cidade…
A zona histórica precisa de condições, quer para comerciantes quer para residentes. Não pode continuar a verificar-se o que se passa à noite, o vandalismo. A Câmara tem de olhar para a rua Direita e para a zona histórica de forma diferente. Nunca foi olhada de forma digna. Tem sido abandonada nos últimos anos. É uma falta de respeito tanto pelos comerciantes como por quem lá vive. Noutras cidades têm-se feito um bom trabalho nestas zonas. É uma montra da nossa cidade, tem de ser revitalizada em termos de construção, é preciso levar gente para lá habitar, criar espaços culturais e outros que atraiam as pessoas. Hoje vamos à baixa de Lisboa e ao Bairro Alto porque há condições. O comércio está lá, as pessoas investem, existe o que procuram. Nós temos um dos melhores monumentos a nível nacional, que é o Castelo de Leiria, que nem visitas tem porque não há condições nem acessibilidades. Temos museus que poderiam ser muito mais visitados, mas a informação não existe. E não é com elevadores que se resolve o problema da acessibilidade ao castelo, há outras formas de o fazer.
Por exemplo?
Criar condições para que os autocarros turísticos estacionem junto ao estádio, e depois subir as pessoas para o castelo a pé. A mudança da PSP seria importante. Está numa situação altamente preocupante e perigosa. Basta haver uma avaria ou um carro tapar o acesso que ninguém sai dali. O local onde está a PSP podia ser um espaço museológico, com um parque onde as pessoas pudessem estacionar para visitar o castelo. Temos já esquadra nos Marrazes, podia criar-se outra em Leiria, ou na Cruz da Areia… Descentralizar. Ou por que não colocar todas forças de segurança no quartel da Cruz da Areia, onde caberiam GNR, PSP e Exército?
A mudança da PSP e GNR não depende da Câmara…
Não, mas o poder local tem de fazer força para que aconteça. A mudança seria boa tanto para a PSP como para a GNR e para a cidade. O problema é que não se pensa a cidade. Os políticos só pensam a cidade para o mandato de quatro anos. Temos tido muito isto em Leiria. Ninguém pensa no que se quer a 20 anos. Os políticos usam o nome da cidade da forma que querem, mas só quando há eleições.
Faltam líderes?
Fazem-nos muita falta algumas pessoas. É o caso de José Ribeiro Vieira. Conseguia, em Lisboa, junto dos políticos, trazer muita coisa para Leiria. Muito do que temos deve-se a ele. Também Leonel Costa começou a fazer um caminho semelhante, mas infelizmente desapareceu igualmente demasiado cedo. Falta na região uma figura, não digo política, mas falta termos alguém com peso, na minha opinião ficou um vazio.
Batalha e Porto de Mós são realidades diferentes de Leiria em termos comerciais?
Muito diferentes. A Batalha tem uma atracção de turistas muito forte, um comércio diferente de Leiria, mas muito bom, com gente muito dinâmica. A faixa etária dos comerciantes da Batalha é muito baixa. A vila tem uma Câmara e um presidente que têm ajudado muito o comércio. O presidente está muito preocupado com o comércio e com o turismo e tem ajudado muito os comerciantes. Em Porto de Mós o vazio é total. Não conseguimos interagir com a Câmara Municipal, fizemos vários pedidos, sem resposta. Espero que o novo presidente tenha uma conversa com a Acilis, para que possamos ajudar o comércio na vila. Nota-se que os espaços comerciais em Porto de Mós estão a fechar. Alguma coisa tem de ser feita. A Acilis está disponível para ajudar, mas é preciso que o novo presidente também tenha essa vontade.
Quando se candidatou a este mandato, o aumento do número de associados para mil era um dos seus objectivos. É uma meta realista tendo em conta o panorama actual do comércio?
É. Temos actualmente cerca de 860 associados pagantes, contra os 600 que existiam quando chegámos. Não se pode olhar para a associação nem para o associativismo como há 20 anos. Temos de acompanhar as dinâmicas. Há cerca de um ano os estatutos foram alterados e a associação passou a abranger também a área dos serviços e do turismo, que têm vindo a crescer nas cidades.
Continua a fazer sentido a associação ter a vertente comercial e industrial, numa época em que os desafios destas duas áreas são bastante diferentes?
Diria que sim. A associação vai fazer 120 anos, foi a primeira de Leiria. Embora exista outra entidade que representa a indústria, a Nerlei, com a qual temos excelentes relações, e que tem feito um trabalho espectacular. A Acilis tem associados da pequena indústria. São entidades complementares.
A associação pode até ter mil sócios, mas às vezes contam-se pelos dedos das mãos os que participam nas assembleias gerais…
É um facto. Uma das grandes dificuldades que temos encontrado ao longo dos anos é conseguir trazer pessoas às assembleias gerais. É um dever e um direito participar na vida activa da associação. Mas, muitas vezes, as pessoas fazem-se sócias e depois ficam simplesmente à espera que alguém lhes resolva os problemas. É fácil criticar sem estar disponível para ajudar. O associativismo é uma questão cultural. No Norte do País está enraizada, mas aqui temos de andar a pedir às pessoas [para se associarem].
O “bichinho” do associativismo
Lino Ferreira, 60 anos, foi eleito em Março passado presidente da direcção da Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Leiria, Batalha e Porto de Mós (Acilis), em representação da inCentea, da qual é um dos administradores, depois de há quase sete anos o grupo ter integrado as empresas de que era gerente (Teleleiria, Voznet e Leiritel).
Não é a primeira vez que lidera a associação, da qual já foi presidente entre 1998 e 2003. Depois presidiu à Assembleia Geral, durante dois mandatos. Admite mesmo ter o “bichinho” do associativismo, já que ao longo dos anos foi dirigente de inúmeras estruturas: União de Leiria, Associação de Futebol de Leiria, Federação Portuguesa de Futebol, Conselho Nacional de Arbitragem desta entidade.
O gosto pelo futebol “apanhou-o” era ainda jovem e jogava no clube da sua terra, Regueira de Pontes, e depois na formação do SCL e Marrazes. Não descarta a hipótese de voltar a ser dirigente na área do futebol. “É importante ter cultura associativa”, defende, lembrando que “os dirigentes associativos trabalham graciosamente”. “Se fossem pagos estavam cá os boys dos partidos todos”.
Em termos profissionais, começou por trabalhar na Stop, enquanto estudava à noite, e depois abriu com dois sócios a Farrapo, “a primeira boutique de roupas em Leiria”, já lá vão 40 anos.