O que é o Tune Rocket e o que traz de novo para a indústria da música?
Aqui há um ano, mais ou menos, eu estava um bocado frustrado com como é que um artista independente lança música hoje em dia e comecei a seguir algumas pessoas que são, supostamente, gurus na matéria, fiz alguns cursos e percebi que estava a fazer tudo errado. As noções que eu tinha do passado, de ter trabalhado com editoras, já não se aplicam muito, e depois, se por um lado há muito mais gente a fazer música, se não me engano, à volta de 100 mil músicas por dia colocadas no Spotify, por outro lado nunca foi tão fácil para os artistas conseguirem ter acesso a ferramentas, a tecnologia, que permita fazer canções e lançar canções com muito menos recursos do que dantes. E no meio disto tudo, como o meu background é técnico, pensei “eu consigo fazer uma aplicação que me vai ajudar nisto”: lançar música de acordo com aquelas guidelines que eles ensinam nos cursos e depois promover a música também dessa forma. Ainda não lancei a aplicação no mercado, estou naquela fase de recolher feedback inicial para perceber se este é o melhor caminho ou não, mas acho que a tecnologia pode ajudar muito. Esse é o objectivo: fazer uma aplicação que ajude os músicos independentes a lançarem e a promoverem música da melhor forma e da forma mais barata também.
Com recurso a inteligência artificial?
Sim, em algumas coisas.
É difícil, para um músico independente, chegar a um público mais abrangente?
É difícil atravessar o barulho, ou seja, é fácil do ponto de vista de que social media [redes sociais] está acessível a toda a gente, por outro lado é muito mais difícil porque há muito mais gente.
Que obstáculos se colocam aos músicos independentes?
A maior parte dos músicos, eu incluído pelo menos até há uns meses, não gosta de fazer conteúdo para social media. Ou então não consegue. Isso está errado. Não estou a dizer que é fácil, mas conseguimos ser genuínos e fazer conteúdo interessante para as pessoas que são o nosso target. Fazer um disco é uma coisa que para um artista mais pequeno não faz grande sentido hoje em dia. Portanto, está-se a voltar ao formato de lançar uma canção. Um disco é uma odisseia muito grande, além de ser mais caro. Um artista desconhecido, que faça um disco, provavelmente as pessoas só vão ouvir uma música desse disco, anyway.
É um problema de visibilidade?
Há tanta gente a competir por atenção, como é que se consegue furar? Como é que se consegue encontrar aquilo que se chama a fan base?
O Tune Rocket pode ter encontrado pelo menos parte das resposta para esse desafio?
A minha aplicação foca-se, para já, em resolver duas partes do problema. Um, criar um calendário supostamente optimizado para os algoritmos de quando é que se deve lançar música, porque há toda uma ciência por trás que eu também desconhecia; dois, uma vez tendo música para lançar e para promover, através de AI ajudar a gerar conteúdo para promover as músicas. Continuo a achar que o artista deve ser genuíno e único, portanto, aquilo não vai andar a gerar vídeos com AI e o artista não tem de fazer nada, mas, pelo menos, vai ajudá-lo no tipo de posts que deve fazer, onde, quantas vezes por semana, sobre o quê.
Nunca houve tanta música nova disponível, mas, se calhar, ouvimos sempre os mesmos artistas?
Concordo, sim. O que é uma pena. Às vezes, bandas com muita qualidade, streams no Spotify, nem aos mil chegam.
Porque é que isso acontece?
Não estão a ser capazes de passar pela quantidade infindável de músicas que são colocadas lá todos os dias, portanto, eles não conseguem chegar às pessoas que provavelmente vão gostar da música deles. E não vai ser o Spotify a fazer isso. O Spotify, tipicamente, só começa a promover uma música quando o algoritmo pega nela, mas para o algoritmo pegar nela, a música tem de fazer todo um caminho até lá chegar. E isso é muito difícil de acontecer. Acho que os músicos, acima de tudo, têm de fazer música genuína, fazer conteúdo de forma genuína, e isso vai dar, obviamente, uma fan base maior.
Os Phase, de que fez parte, que há 25 anos assinaram por uma grande editora multinacional, a partir de Leiria, um caso realmente raro, encontrariam mais ou menos dificuldades em 2024?
Acho que seria mais difícil. O caso dos Phase não é um caso normal, mesmo há 25 anos. Há um valor inacreditável nas poucas editoras independentes que temos cá. E temos um caso excelente em Leiria que é a Omnichord. O que essas editoras fazem, o valor é incalculável. Portanto, acho que os Phase hoje não iam para uma multinacional, porque as multinacionais hoje para assinarem com alguém querem ver números muito grandes, querem assinar com artistas já conhecidos.
De uma ponta a outra do processo, o que traz a inteligência artificial para a indústria da música?
Eu estava a ver há uns tempos um vídeo do Billy Corgan e adorei a forma como ele pôs a coisa. Os Smashing Pumpkins, quando se formaram, e estavam na garagem a fazer as suas primeiras músicas, na prática estavam a querer imitar alguém. Tal como os Phase. E depois aquilo acaba por passar por uma metamorfose qualquer e o pessoal vai descobrindo um som mais único. Demora tempo. Hoje em dia, as pessoas também querem soar a qualquer coisa, só que carregam num botão, já não passam por esse processo todo em que está a descoberta do som realmente único daquele artista ou daquela banda – isso perde-se um bocado, mas, por outro lado, torna as coisas muito mais acessíveis. Se nós formos pensar como é que a AI pode ajudar um artista, pode ser uma coisa tão básica quanto o artista vai ao Chat GPT e pede planos de lançamento de música, de marketing. E é uma ferramenta brutalmente boa para isso. Ou então, pode-se ir muito mais à frente, na parte de gravação, com plugins para masterizar música. Não quero dizer que vai ficar melhor masterizado do que se fosse masterizado por um profissional, tipicamente não vai, mas vai abrir portas a que eu consiga lançar uma música a custo zero e isso não é necessariamente mau, porque há talentos inacreditáveis que vão ter acesso finalmente a poderem fazer coisas por si só. O reverso da medalha é que há talentos que não são nada inacreditáveis que vão conseguir fazer o mesmo. A tecnologia não é má, o que eu acho que é mau é as pessoas usarem a tecnologia para tentarem fazer um atalho tão grande que na prática não há criatividade nenhuma. E é aí que está o perigo.