Homenagear todos os que, no distrito, assumiram publicamente a sua oposição à ditadura, independentemente da forma como o fizeram, é o principal objectivo do projecto “Memória da oposição – Leiria 1945-1974”, que se propõe a elaborar uma lista, em versão física e digital, com os nomes dos opositores ao regime neste círculo eleitoral.
A iniciativa partiu de um movimento cívico, cuja comissão executiva é coordenada por José Miguel Medeiros, ex-governador civil e filho e neto de opositores à ditadura. Da comissão fazem ainda parte Acácio de Sousa, antigo director do Arquivo Distrital de Leiria, João Cunha, advogado de Leiria, e Jorge Sobral, também jurista de Caldas da Rainha.
Segundo José Miguel Medeiros, o trabalho consistirá no levantamento do nome dos cidadãos do distrito que se manifestaram contra o Estado Novo das mais diversas formas, desde a integração de listas da oposição, de mesas de voto ou de comissões de apoio a candidatos, até á prisão ou a assinatura de manifestos políticos e eleitorais. “A oposição podia ser simples, mas era sempre perigosa. Ficava-se marcado”, afirmou Jorge Sobral, durante a apresentação do projecto, que teve lugar esta quarta-feira.
“Todos eles arriscaram. Nuns casos a prisão, noutros o emprego e a sua sobrevivência económica e da família, a vigilância policial, as comunicações violadas e, em muitos casos, viram-se sujeitos à prisão, à tortura e, não raro, pagaram com a sua própria vida”, reforçou José Miguel Medeiros, frisando que “qualquer gesto de oposição tinha sempre consequência”.
Ora, é precisamente para preservar a memória e homenagear essas pessoas que nasce o projecto agora apresentado, com a elaboração de uma lista de nomes, de “heróis já conhecidos, mas também “pequenos heróis da resistência que deram o seu contributo, muitos vezes na sombra” à oposição ao regime, frisa Acácio de Sousa.
Cidadãos desafiados a colaborar
A recolha dos nomes – que ficarão disponíveis numa base de dados digital e num documento imprenso – será feita através de documentos oficiais, como listas de candidatos, relatórios da PIDE, artigos de imprensa e processos eleitorais, mas também de testemunhos orais.
Para esta última componente, a comissão espera o apoio de antigos familiares de oposicionistas e de outras pessoas que, nos diversos concelhos, possam recolher informação. Estes “contributos de cidadania” devem ser enviados por email (oposicao.leiria.1945.74@gmail.com) ou através da página de facebook do projecto Oposição no Círculo Eleitoral de Leiria 1945-1974, a disponibilizar em breve.
Da lista constará não só o nome, mas também alguns dados de identificação pessoal e, quanto for viável, um “pequeno apontamento” biográfico, explica José Miguel Medeiros, assumindo que “este não trabalho académico” e “nunca estará acabado”, mas que será “rigoroso” e que a versão digital poderá ter actualizações.
O coordenador da comissão executiva justifica ainda a baliza temporal fixada em 1945 com o facto de ser esse o ano de criação dos círculos eleitorais e por, “só a partir daí, a oposição ter tido condições, ainda que muito limitadas, de participar nos processos eleitorais”.
Na apresentação do projecto José Miguel Medeiros explicou também que a ideia nasceu do desafio lançado na última sessão comemorativa do 25 de Abril em Leiria por Alberto Costa, antigo ministro que foi um oposicionista ao regime, para que fosse feita esta listagem, a propósito dos 50 anos da Revolução dos Cravos, que se assinala no próximo ano.