As escolas apoiam os alunos estrangeiros, na ausência de mecanismos optimizados para a vaga de novos estudantes. E, se há quatro anos, se falava em fechar as escolas por falta de alunos, o cenário agora é de estabelecimentos de ensino sobrelotados.
“No Centro de Estudos de Fátima (CEF), temos 24% de alunos estrangeiros. Ou seja, um em cada quatro, é oriundo de outro país”, contabiliza Manuel Bento.
O director do estabelecimento de ensino do concelho de Ourém adianta que, além dos portugueses, há ainda mais 18 nacionalidades a conviver nesta escola que, no ano passado, teve de abrir mais uma turma do ensino secundário.
“Tem sido um desafio, no sentido de ser uma oportunidade”, garante.
Afinal, o CEF, em 2013, até concorreu ao selo de Escola Intercultural e conseguiu-o. Talvez por isso, tenha sido mais fácil lidar com a chegada de tantos novos alunos oriundos de outras latitudes.
“Desta vez, o processo de chegada foi muito mais rápido”, reconhece o responsável.
Para apoiar quem chega e, em especial, aqueles que, ao contrário dos brasileiros, não comungam do mesmo idioma, ressalvadas as necessárias diferenças e maneiras de entender um idioma comum, no CEF colocou-se em prática um programa de mentoria, onde são os alunos portugueses ou estrangeiros a viver há mais tempo em território nacional, que vestem a camisola de mentores ou “melhores amigos”, dos recém-chegados.
Ajudam-nos a relacionar-se com a turma ou até, no caso das raparigas vindas de países com culturas muito diferentes, a praticar desporto ou a ir à piscina.
“Quinze por cento dos nossos jovens oferecem- se para serem mentores. Isto é, mais do que o número de estrangeiros. É um processo estruturado, que dura o ano inteiro e não se limita aos primeiros tempos na escola”, explica Manuel Bento.
Estudam em conjunto e auxiliam-nos, gradualmente, a ultrapassar o problema da língua.
“Só depois da socialização é que vem a aprendizagem”, reconhece o director, dando como exemplo de sucesso uma aluna de origem paquistanesa que foi uma das melhores no curso profissional de técnico de apoio psicossocial.
“A irmã seguiu-a e vem estudar na nossa escola.”
Valter Branco, responsável pelo Colégio João de Barros, nas Meirinhas, no concelho de Pombal, explica que ali não aumentou o número de turmas, uma vez que a decisão do Ministério da Educação não foi nesse sentido, mas reconhece um “boom” no número de estudantes estrangeiros.
O esforço tem sido no sentido de os integrar o melhor possível nas turmas que já contam com as mesmas nacionalidades.
Em Leiria, no Agrupamento de Escolas de Marrazes, um quarto dos alunos é estrangeiro ou filho de pais estrangeiros.
O “desafio” de acolher jovens estrangeiros foi facilitado pela criação de um manual de acolhimento em várias línguas e por anos de experiência colhida pela convivência com comunidades oriundas de Angola e Moçambique.
“Temos um corpo docente estável, onde 91% dos professores pertence ao quadro e isso deu-nos facilidade e flexibilidade em receber os estudantes estrangeiros que nos procuram”, conta o director, Jorge Brites.
A maior dificuldade é sempre o idioma, pois muitos alunos falam apenas a sua língua materna ou dominam mal o inglês.
“Usamos o que temos à mão; o telemóvel, o computador ou o Google para traduzir.
No ano passado, a escola dos Marrazes recebeu alunos somalis que, hoje, estão integrados, muito pela acção da comunidade estudantil.
“Temos o cuidado de integrar estes estudantes em turmas onde há outros da mesma nacionalidade já adaptados. É uma mais-valia termos diferentes culturas e encarregados de educação que vêem a escola de outras formas”, entende Jorge Brites.
Sistema não está estruturado para receber estrangeiros
A integração não é um processo fácil e, bastas vezes, apesar da abnegação dos professores e direcções, não há condições para fazer mais.
“Precisam de bases, mas as escolas não têm estrutura para dar apoio”, diz Teresa.
Docente do 3.º ciclo no Agrupamento de Escolas Domingos Sequeira, em Leiria, já passou por outros estabelecimentos na região e conta que, mesmo os alunos brasileiros, geralmente, ficam “retidos” um ano.
“São raros os que transitam. O sistema não está preparado para os receber. O currículo é diferente do nosso e a língua é a mesma… mas não é.”
Também é pouco comum trazerem consigo o processo escolar, que facilitaria a avaliação das capacidades do recém-chegados.
Teresa começou a ajudar, gratuitamente, estes alunos, no final das aulas, para tirar um peso do coração.
Percebeu que os que transitam do privado são focados, têm objectivos e são trabalhadores, porém, os que chegam da escola pública brasileira, ficam admirados por “haver alunos sentados e em silêncio”.
“Dou Geometria Descritiva e, no ano passado, recebi uma aluna paquistanesa que só falava mau inglês. Fui obrigada a dar aulas bilingues!”
A conclusão que a professora tira é que, da parte da tutela, há pouca noção das necessidades destes alunos e das escolas que, neste momento, pouco mais podem fazer.
Número de estrangeiros explodiu desde 2020
No ano lectivo 2020/21, o Agrupamento Escolar D. Dinis, em Leiria, contava 145 alunos estrangeiros nas suas turmas e as nacionalidades eram menos de dez.
Em 2022/23, o número de estudantes originários de outros países chegava aos 253 jovens de quase duas dezenas de nacionalidades.
A mais predominante nos 1.º, 2.º e 3.º ciclos, tal como acontece de modo generalizado no País, é a brasileira.
Embora o número de turmas do 1.º ciclo se tenha mantido, no ano lectivo passado, houve a necessidade de criar mais uma turma do 2.º ciclo.
O crescimento de alunos estrangeiros foi de 174,48%, nos três últimos anos.
No Agrupamento de Escolas Henrique Sommer, da Maceira, Leiria, todas as unidades registaram aumentos de estudantes de outras nacionalidades.
No ano lectivo de 2020/21, os 64 estrangeiros ali a estudar representavam 5,6% do total de estudantes do agrupamento (1152).
Em 2022/23, eram já 133, ou 10,8% dos 1235 alunos.
A nacionalidade mais comum é a brasileira, seguindo-se os ucranianos, os franceses, os angolanos e os romenos.
O crescimento foi de 207,81%.
Na cidade de Leiria, no Agrupamento de Escolas Domingos Sequeira, há três anos, havia 19 nacionalidades, sendo a brasileira a mais comum.
No pré-escolar, nos três ciclos do ensino básico e no secundário, havia um total de 140 alunos.
No ano lectivo passado, havia já 28 nacionalidades, com a brasileira no topo da tabela, e 289 estudantes.
O crescimento foi de 206,43%.
Já no Agrupamento de Escolas Afonso Lopes Vieira, na mesma cidade, apenas no ano lectivo 2022/2023 houve aumento de turmas para responder à elevada procura.
Os números relativos ao 3.º ciclo, ensino secundário regular e ensino profissional, mostram que, em 2020/21, havia um total de 165 alunos de outras nacionalidades.
Em 2022/23, matricularam-se 285 jovens, vindos de 27 países, o que representa um aumento de 172,73%.
A maior parte destes estudantes são oriundos do Brasil, seguindo-se a Itália e a Ucrânia.