Há um novo flanco na rotina de Nuno Gonçalves, cantor, compositor, pianista e, uma vez por semana, comentador desportivo no programa Trio de Ataque, da RTP. A convite do município, exerce agora, também, o cargo de director artístico do multiusos inaugurado em Alcobaça a 28 de Março de 2025. “Para fazer do Panorama uma sala de referência a dois, três, quatro anos”, antecipa. “É a minha meta”.
O músico com residência e estúdio no concelho acredita que a missão traz uma oportunidade irrecusável. “Sempre senti, enquanto alcobacense, que tenho alguma dívida para com a cidade. Ou seja, eu inspiro-me pela cidade, há muitos anos. Faço as minhas músicas aqui, a carreira dos Gift é sediada e sempre foi sediada em Alcobaça, portanto, sempre senti essa necessidade de fazer coisas em Alcobaça”.
O primeiro teste a sério – concerto da Orquestra Sinfónica Portuguesa, em Maio – está superado e demonstra a “muito boa” acústica do novo multiusos. “Para mim, é quase um manifesto de início de intenções. Isto não é um pavilhão, é uma sala de espectáculos que dá para uma orquestra ou para o Seu Jorge [como vai acontecer já em Agosto] ou para uma rave, se quisermos”.
Com um investimento de 6 milhões de euros “pensado de raiz” para “receber grandes eventos”, o território do Cistermúsica, dos doces medievais e do mosteiro património da Humanidade parece posicionar-se à frente de outros, na região, sobretudo pela versatilidade e lotação do Panorama, onde Tim, dos Xutos & Pontapés, tocou no último mês. “É uma sala que não há no distrito”, comenta Nuno Gonçalves. “E consegue concorrer com as melhores de Portugal”. Perto, actualmente, não existe semelhante. “Ganhámos essa corrida. Mesmo que haja um multiusos, do mesmo estilo ou maior, em Leiria, o nosso chegou primeiro”.
Os planos em Alcobaça incluem “dois, três eventos internacionais” por ano e, além da programação de iniciativa própria, esforços para atrair outros protagonistas da indústria da cultura e do entretenimento. “Produtores de espectáculos que vêem aqui uma sala a meio do país com estas valências, ou seja, nós conseguimos pôr, sentadas, 2.300 pessoas, e conseguimos pôr, em pé, 5.200, que é mais 1.000 do que o Coliseu de Lisboa, por exemplo”. Acresce, ainda, a sala secundária (600 a 1.200 espectadores), o auditório (100 lugares), o átrio e a possibilidade de instalar zonas de apresentação no exterior, que actualmente acolhe a exposição Foto-Passe da fotojornalista Rita Carmo, do Blitz. “Se consegues levar os Smile ao Coliseu com 4.000 bilhetes vendidos, não seria de todo mal pensado trazê-los a Alcobaça com 5.000”, aponta Nuno Gomçalves. “Agora, claro, tudo demora o seu tempo”.
O presidente da câmara, Hermínio Rodrigues, partilha a ambição: o Panorama “quer afirmar-se como uma alternativa descentralizada (a apenas uma hora de Lisboa), impulsionando o turismo cultural e fortalecendo o tecido económico ”, diz ao JORNAL DE LEIRIA. “Ambiciona captar visitantes além do concelho e servir de motor para o desenvolvimento sustentável de toda região”.
Com 20 metros de palco e 12 metros de altura, cais de acesso que permitem cargas e descargas rápidas, bancadas amovíveis e seis salas de criação onde podem instalar-se associações, bandas, artistas ou profissionais de co-working, o multiusos ocupa três hectares e disponibiliza 5.000 metros quadrados de área coberta. Segundo Hermínio Rodrigues, “vem suprimir uma necessidade estratégica” com o propósito de captar “grandes artistas nacionais e internacionais”, mas, por outro lado, surge para apoiar “iniciativas locais”, a partir da requalificação do edifício MercoAlcobaça.
“Casa com tudo, casa com todos”, frase utilizada na comunicação do Panorama, significa uma oferta “variada” e para “diversos tipos de público”, que procura, no ano de arranque, “apresentar o espaço às pessoas”, comenta Nuno Gonçalves. “Quis fazer um evento por mês que mostrasse as valências do Panorama e uma programação que vá a toda a gente”. E conclui: “Não me interessa fazer uma programação muito de nichos. Se calhar, se fosse pegar nas minhas listas de Spotify, ia por aí, mas não posso, neste cargo, pensar nos meus gostos, tenho de ir pensando numa programação que seja eclética”, mas “que traga qualidade” e com “fio condutor”.
“Muito entusiasmado”, o director artístico reconhece, no entanto, que “há montanhas para subir”, nos próximos meses. “A criação de público, por exemplo, é uma coisa difícil de fazer numa sala destas”. A mais-valia “é precisamente” tratar-se de “uma sala nova, bem feita, arejada”.
Nesta fase, “há um ou outro evento que é pago pelo município” e Nuno Gonçalves, que admite envolver privados no financiamento do projecto, considera que “as bilheteiras podem ser a grande [fonte de] receita” do Panorama e permitir alimentar “outros eventos”, numa perspectiva de sustentabilidade, sem dependência de apoios estatais. “Quero ter acima dos 80% de ocupação em cada espectáculo. Neste momentos estamos nos 86%”.