Há uma década que, todos os Verões, equipas de investigadores de vários estabelecimentos de ensino superior escavam o abrigo e gruta da Buraca da Moira, na Boa Vista, Leiria, e no vale das Chitas, no Arrabal, revelando vestígios arqueológicos de caçadores-recolectores da última Idade do Gelo.
As descobertas deste ano, focados na Boa Vista, incluem pontas de flecha, raspadores em sílex, ossos de um extinto bisonte europeu e de cavalo selvagem.
O trabalho, concretizado, nesta temporada, por 20 investigadores, insere-se na iniciativa EcoPLis, que estuda a ocupação humana nos vales calcários da bacia hidrográfica do rio Lis, durante o Pleistoceno.
Telmo Pereira, investigador que lidera a equipa, explica a importância do local.
“Leiria é um dos melhores sítios para este trabalho, com os vales estreitos da bacia do Lis que ligam as serras de Aire e de Candeeiros ao mar.”
As descobertas demonstram ocupação demorada destes sítios, com foco em dois momentos principais. O mais recuado, corresponde à última glaciação, quando o gelo cortou a meio a Europa e isolou duas grandes populações.
“Sabemos que, quando o gelo retrocedeu, áreas como esta foram fundamentais para repovoar o continente.”
Os achados incluem utensílios de rocha (lâminas e raspadores) e ossos de animais como cavalos, javalis, veados, gamos e auroques, um grande bisonte europeu, que serviam de alimento.
As escavações dentro do abrigo atingiram mais de dois metros de profundidade e revelaram duas fases principais de ocupação.
A mais antiga, datada entre 20 e 27 mil anos (Paleolítico), corresponde a caçadores-recolectores, que deixaram ferramentas de sílex, quartzo e quartzito. Com o fim da Idade do Gelo, o local foi abandonado.
A gruta foi reocupada num período há cinco mil e 3.500 anos, após o desenvolvimento da agricultura e pecuária, sendo transformada em necrópole.
A população local baptizou a “Buraca da Moira”, porque encontrou ossos da necrópole, que julgou ser vestígios do “tempo dos mouros”.
O investigador não descarta a possibilidade de descobertas ainda mais significativas, especialmente na parte do abrigo que permanece bloqueada por sedimentos.
Questionado sobre eventuais pinturas rupestres, Telmo Pereira é optimista.
“Pinturas rupestres? Quem sabe? […] seria estranho que apenas em Espanha se encontrasse arte.”
Na escola dos Apariços que serve como laboratório de campo, Pedro Peça, doutorando da Universidade Autónoma, revela que, no seu estudo focado no período Solutrense, se tem encontrado itens de grande beleza.
“Os foliáceos em pedra talhada dos dois lados, com forma de folha de loureiro, que, em princípio, era usada para pontas de lança comprida.”