Um estudo realizado pela instituição financeira Unión de Créditos Inmobiliarios (UCI) concluiu que 87% dos condomínios não fizeram obras nos últimos 18 meses. Embora muitos prédios careçam de intervenção, a reparação não é feita por falta de dinheiro.
As conclusões não surpreendem nem as empresas de gestão de condomínios ouvidas pelo nosso jornal, nem António Frias Marques, presidente da Associação Nacional de Proprietários (ANP), que justificam a falta de obras com a descapitalização das famílias e com a mentalidade de muitos portugueses, que agem como se as áreas comuns dos prédios não lhes dissessem respeito.
A actual carência de recursos humanos para executar os trabalhos é igualmente referida. A situação é grave e tem levado à degradação [LER_MAIS]do parque imobiliário, concordam os especialistas.
De acordo com a pesquisa Condomínios e obras: A experiência das empresas de gestão de condomínios, que inquiriu 200 empresas de gestão de condomínios, no último ano e meio apenas 13% dos condomínios foram intervencionados, sendo que a maioria das obras feitas (88%) não custou mais de 30 mil euros (pinturas, reparações de coberturas e pavimento ou de infiltrações).
Ainda segundo a experiência de mais de metade das empresas inquiridas, o fundo comum de reserva não cobriu o valor da obra, exigindo pagamento adicional por parte dos condóminos.
E porque há condomínios que precisam de obras e não as fazem por falta de capacidade financeira, algumas empresas inquiridas mostraram-se favoráveis a uma alteração na lei para que possam contratar directamente empréstimos e facilitar a realização dos trabalhos. “Temos um problema gravíssimo de conservação e manutenção de condomínios”, constata António Frias Marques.
“Se as pessoas já pagam com dificuldade a prestação da casa ao banco, também têm dificuldade em pagar a quota mensal, que se destina à limpeza das escadas, pequenas reparações de iluminação ou manutenção de jardins”, exemplifica o presidente da ANP.
Além disso, “há uma mentalidade de ir cuidando do que está entre as suas quatro paredes, achando que as partes comuns não são consigo”, nota o presidente.
A lei determina que 10% da quota mensal se destine ao fundo comum de reserva dos condomínios, mas muitos não respeitam a lei e não têm esse fundo, acrescenta.
Quotas muito baixas
Há pessoas que não têm condições financeiras para pagar a quota mensal – e informam disso- mas há também quem não pague por “desgoverno e má-vontade”, refere Alexandra Roque, gerente da Servoliz, empresa de gestão de condomínios de Leiria. No entanto, mesmo que todos paguem, é difícil reunir verba necessária para as obras só com recurso ao fundo comum de reserva. É quase sempre preciso dinheiro extra, constata.
O que também não tem ajudado é a falta de recursos humanos para executar os trabalhos. “Tenho obras adiadas pelo terceiro ano, porque o empreiteiro não tem quem as faça”, salienta. Quanto à sugestão de ser o condomínio a fazer directamente o empréstimo, a gerente da Servoliz não concorda.
“A lei teria de exonerar a administração de condomínio de qualquer responsabilidade em caso de falta de pagamento”, entende a gerente.
Flávio Teixeira, responsável pela ConDetalhe, marca de gestão de condomínios, de Leiria, explica que, com a deliberação do condomínio, quem não paga as quotas pode sempre ser levado a cumprir, pela via judicial. Salienta que a nova lei, que entrou em vigor a 1 de Abril de 2022 (que impõe que a venda do imóvel seja acompanhada de declaração de não dívida, por parte do condomínio) veio ajudar na regularização de valores em falta. Mas deixa críticas.
Por um lado, a maioria das pessoas quer pagar quotas mensais muito baixas e algumas empresas de condomínios “fazem artimanhas” nesse sentido, sendo que o valor não chega depois para cobrir as despesas.
O ideal seria criar um fundo de maneio que possibilitasse fazer pequenas obras extraordinárias. Além disso, a lei deveria determinar que a percentagem de quota destinada ao fundo comum de reserva fosse maior, de forma a permitir fazer intervenções de maior monta.
Também Flávio Teixeira entende que não deve ser a administração de condomínio a contrair empréstimos. Os bancos é que deveriam ter linhas de apoio, com juros compagináveis com as necessidades actuais, disponíveis para os condóminos que quisessem fazer obras em propriedade horizontal, propõe.
Na Marinha Grande, a Charib constata que muitas obras não são feitas, porque há quem “tente fugir às responsabilidades” ou queira “adiar trabalhos até ter reunido melhores condições financeiras”.
Tantas vezes os empreiteiros fazem orçamentos e o condomínio demora a amealhar o valor, que já são poucos os que aceitam trabalhar nestas condições, observa Marisa Brilhante.
A responsável pela Charib lamenta que até existam apoios comunitários de incentivo à reabilitação, como é o caso do Fundo Ambiental, mas que, por burocracia e falta de conhecimentos dos gestores de condomínio, raramente têm candidaturas aprovadas.