Embarcar num avião e viajar nunca foi novidade para Yelyzaveta Nadzhim que, enquanto futebolista internacional pela Ucrânia nos escalões de formação, chegou a aterrar em diferentes países para defrontar as selecções adversárias.
O que a jovem de 27 anos não esperava era, um dia, ser obrigada a entrar num avião para, sozinha, deixar para trás o país que a viu nascer e crescer. Na Ucrânia deixou três irmãos, uma irmã, sobrinhos e amigos. Volvido um ano da chegada a Portugal, confessa não ser fácil falar sobre tudo pelo que tem passado.
“Foi um grande choque para todos e foi muito difícil. Quando os meus familiares e amigos começaram a dizer-me para sair da Ucrânia e procurar melhores condições noutro país, não queria fazê-lo”, começa por contar Yelyzaveta, que acabou depois por tomar a decisão de sair de Kiev, a sua cidade natal.
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O primeiro destino foi Santarém, onde a jovem ucraniana conhecia uma família, que a ajudou numa fase inicial. Quatro meses depois da chegada a Santarém, começou a pedir ajuda junto dos municípios, tendo sido acolhida no Estádio Municipal de Leiria, onde esteve durante dois meses.
Hoje reside numa casa partilhada, em Leiria. Confessando ter saudades de casa, dos irmãos, do país e de Kiev, afirma que gostaria de ter os seus familiares próximos, apesar de reconhecer que será “difícil isso acontecer”.
“Digo-lhes várias vezes que, se quiserem, podem vir ter comigo. Mas é complicado para eles virem. Primeiro, porque os meus irmãos têm lá mais familiares. Têm os filhos, os sogros. Além disso, acabam por ter uma mentalidade mais antiga. Eu sempre estive habituada a viajar, mas para eles é mais difícil a ideia de mudarem de país”, explica.
Futebol: uma paixão de criança
Se para trás foi obrigada a deixar a terra natal, os familiares e os amigos, o mesmo não aconteceu com o futebol, um sonho que começou ainda muito cedo.
Os primeiros toques na bola começaram quando era pequena, com os irmãos e amigos, mas foi quando tinha sete anos que começou a jogar “mais a sério”. Desde então, nunca mais parou. Não só no futebol, como no futsal e futebol de praia.
Representou a selecção da Ucrânia durante os escalões de formação e, mesmo após concluir os estudos e a universidade, e ter começado a trabalhar na área da restauração, não quis deixar o futebol de lado, ainda que, em alguns momentos, tenha sido “um desafio conciliar”.
Apesar de a guerra a ter feito mudar de país, Yelyzaveta não quis deixar esmorecer o sonho do futebol e, no início deste ano, começou a jogar no Grupo Desportivo Os Vidreiros, da Marinha Grande, onde defende com garra as redes da baliza.
“Fiquei muito feliz com a oportunidade. Existem algumas diferenças entre o futebol ucraniano e o português, nomeadamente na forma de jogar, mas tem sido uma experiência muito boa”, refere a guarda-redes.
Disputa actualmente a III Divisão Feminina, mas afirma que a sua grande ambição é “chegar ao patamar profissional”. “O futebol é a minha vida e quero focar-me a 100% nesta modalidade. Futuramente gostava também de ter a oportunidade de ser treinadora”, revela.
Um ano após a chegada a Portugal afirma ter sido “muito bem acolhida” e que as pessoas “são muito simpáticas”. Apenas a aprendizagem do idioma tem sido, até agora, o maior desafio. “Já entendo e consigo dizer algumas palavras, mas ainda é difícil. No entanto, quero melhorar cada vez mais.”
Sobre se o seu futuro continuará em Portugal ou se passará por um regresso à Ucrânia, afirma não ter ainda “pensado muito nisso” e que “será o que tiver de ser”. “É um dia de cada vez, para ver como vão correndo as coisas em Portugal. Regressar à Ucrânia é complicado. Se tudo for correndo bem e como idealizo em Portugal, ficarei por cá. Mas, por enquanto, estou focada no dia-a-dia, nos treinos e no futebol”, conclui.