Há um episódio muito curioso, passado nas garagens da AR, entre o deputado Paulo Rios de Oliveira (PSD) e a porta-voz do PS, Maria Antónia Almeida Santos, que a rubrica Gente do Expresso relata na edição da semana passada.
“Alguém” amolgou a viatura do deputado do PSD. Ninguém se acusou, até este enviar um email/ ultimato a todo o hemiciclo, ameaçando recorrer às imagens de vigilância para descobrir o culpado.
Na sequência deste aviso, a deputada do PS, depois de chegar a casa e ler o e-mail, lá se lembrou que tinha uns “ténues riscos” na sua própria viatura e lá os relacionou com o sucedido, afirmando a sua total responsabilidade e vontade de resolver este “incidente” o mais rapidamente possível.
A grande maioria dos cidadãos optaria por deixar um bilhetinho no para-brisas ou esperar para preencher uma declaração ou combinar algo com o dono do carro em que batemos.
Normalmente, não precisamos de mais nenhum lembrete do que a nossa própria consciência cívica, para fazer o que está certo.
Quando elegemos um deputado, fazemo-lo na confiança de uma consciência e atitude cívica melhor que a nossa.
Em todo o caso, a julgar por estes casos, quase anedóticos, os deputados não se acham no dever de ser “mais cívicos” que o cidadão comum, actuando apenas, como neste caso, à força de “incentivos” [LER_MAIS] que os colocam entre a espada e a parede. Vai sendo este o exemplo que temos.
Lamentavelmente não é caso isolado.
A abstenção em Portugal muito mais que a praia, futebol, ou netflix, emboca principalmente neste comportamento, na leveza com que os parlamentares tratam as suas obrigações enquanto cidadãos.
Resta-nos esperar que nunca tenhamos o azar de um deputado nos bater no carro.
Para além da conta do bate-chapas, ainda teríamos de engolir a treta da memória curta, que, enquanto argumento, daria pena de prisão a qualquer Português.
Menos aqueles que sentados no Parlamento, com ordenados acima da média e regalias extraordinárias, ainda se acham no direito de tentar a sua sorte e dobrar as leis que eles próprios criam.
Nada fazendo, a título pessoal, para que estas sejam respeitadas e normalizadas numa sociedade que cada vez mais se organiza em castas e regiões demarcadas de impunidade e corrupção.
*Músico