Sentir. Pensar. Exprimir. Criar. Desde que o preâmbulo assente totalmente na certeza de que cada um pode e deve fazer diferente porque assim o dita a sua individualidade, são estes os ingredientes necessários para que a Dança Criativa aconteça.
Acrescente-se depois uma intenção de verdadeiro mergulho em si, uma vontade de descoberta e exploração de sensações e percepções, e uma necessidade de construção de movimento com significado que as traduza.
Importando apenas que esse movimento seja o que cada corpo produz na sua muito particular e livre relação com o espaço e com a gravidade, e em total respeito pelo tempo e pelo modo como lhe apraz mover-se.
Sem regras, e sem mais aprendizagens técnicas do que as eventualmente julgadas necessárias por cada indivíduo para uma mais livre e profícua condução do corpo, valoriza-se a diferença física, a envolvência emocional, a experiência de vida, e a visão do mundo que tornarão o movimento/dança numa secreta narrativa pessoal.
Desse modo, a apreciação estética da criação que aí nasça irá estabelecer-se na naturalidade e por isso na beleza particular de cada corpo “impreparado” e “vulgar”, reaproximando a necessidade de criação de movimento, da sua efectiva possibilidade, tantas vezes considerada inalcançável pelo comum dos mortais.
Em Dança Criativa cada movimento é feito sem modelo técnico, cada gesto é produzido de forma única, e cada intenção é pessoal e intransmissível, mesmo quando incluída num trabalho colectivo, e pese embora a necessidade de [LER_MAIS] uma organização que transforme todas as partes num todo com sentido.
Será esse um todo construído com absoluto respeito pela individualidade e onde cada um mantém intacta a declaração de si, a intensidade, o modo de sentir, e a capacidade de ser reflexo em que outros se possam ver. Sendo o movimento uma forma de comunicação primordial, facilmente se entende a afirmação de Isadora Duncan de que a mesma dança não possa pertencer a duas pessoas.
Mas ela pode, por isso mesmo, ser um silencioso lugar de partilha, confissão, comunhão e descoberta, um secreto espaço de liberdade e uma possibilidade de exorcizar o que se não entende, o que faz medo e o que se não sabe. E o que faz sonhar e sentir esperança.
Sejam crianças, adolescentes, ou adultos de todas as idades, e para lá de todas as grandes diferenças no modo de fazer que essa diversidade de vivências e maturidade implicam, o resultado é sempre uma leitura da vida, um olhar do mundo, e uma muito importante produção de sentido próprio.
Dentro de poucos dias acontecerá na Prisão/Escola uma peça de Dança Criativa, resultado de uma residência artística.
Serão 12 alunas e 12 reclusos, adolescentes e jovens adultos. Todos com muito para dizer. E ouvir. E ser ouvidos por todos quantos possam ir assistir.
*Professora de dança