O desejo de autonomia para os museus e monumentos da Direção-Geral do Património Cultural é consensual, embora o modelo a seguir ofereça discussão. É um debate onde, curiosamente, tudo se tem centrado nos museus, enfraquecendo o que poderia ser uma análise mais profunda. Porque na realidade se há serviços onde com bom cabimento e assertivamente se pode falar de autonomia, são os monumentos. E, logo por isso, deveriam ter sido inicialmente mais ouvidos e considerados.
Em primeiro lugar porque, com raras exceções, são os únicos serviços tutelados pelo Ministério da Cultura que apresentam resultados operacionais positivos. Os monumentos, há que colocar a análise nos território certo, são os que têm contribuído positivamente para o orçamento do Estado, onde as receitas pagam as despesas e onde os excedentes são mais amplos que os recursos colocados ao seu dispor por quem os tutela.
Mas como me desagrada falar de pormenores tão comezinhos como a rentabilidade dos monumentos e a comparação talvez injusta que se possa fazer com a dos museus, ainda assim há outros argumentos.
Se há serviços que têm tido capacidade de captação de novos públicos, que se têm integrado em redes internacionais de conhecimento e saber, que têm projetos de investigação de topo, que têm tido divulgação internacional, que têm tido uma ação culturalmente muito dinâmica e que têm estruturado uma relação dinâmica com as comunidades onde se integram (de acordo com os grandes paradigmas de gestão que a UNESCO reclama há mais de 20 anos), esses têm sido os monumentos, entre os quais os que, [LER_MAIS] desde os anos 80, têm estatuto de Património da Humanidade.
Ter esquecido ou não reparado nestas dinâmicas – aquando da discussão inicial para a autonomia – parece injusto. É o mesmo que se tentar reorganizar uma instituição universitária sem avaliar as sua experiências anteriores mais inovadoras e autossustentáveis, ou tentar a reorganização de um grande grupo empresarial sem ter em conta os bons resultados e as boas práticas de gestão de algumas empresas dentro do grupo.
Não me admira essa subvalorização. É subtil, mas sintomática. Sempre tenho observado como subliminarmente, em certos meios, se deteta uma certa visão elitista, nostálgica e – porque não dizê-lo? – anacrónica, no que diz respeito ao papel dos monumentos e museus, e à sua gestão. Para alguns, parece sobressair uma certa visão estereotipada do papel reservado aos monumentos, quase vistos como meretrizes do sistema patrimonial: bons angariadores de receitas pelas belezas que mostram, mas pouco considerados pelo trabalho que realizam.
O que se pretende, afinal de contas, é um modelo de gestão eficaz, desde logo na capacidade de reconhecer o valor do património, de o proteger e de o valorizar, junto e com as comunidades envolventes.
Um modelo que não faça perdurar mecanismos administrativos e tutelares obsoletos e que incorpore, no quadro geral das responsabilidades do Estado central, as mais recentes dinâmicas de gestão patrimonial.
*Professor
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990