Apesar de haver um intervalo de quase 50 anos, há um inquietante paralelismo histórico entre o Chile do general Pinochet e o Brasil do capitão Bolsonaro. Em 1970, o Chile já era o país com maior estabilidade política na América Latina e, nesse ano, Salvador Allende, candidato pela Unidade Popular (comunistas e socialistas), venceu as eleições presidenciais.
Salvador Allende tinha uma agenda ideológica clara – a implementação do socialismo, mediante a nacionalização de empresas estrangeiras e de terras para a reforma agrária, um vasto programa expansionista de redistribuição de rendimentos e de transferências sociais.
O resultado, em termos económicos, foi trágico. Entre 1970 e 73, o défice público do Estado chileno saltou de 2,3% do PIB para 24,7%, o desemprego subiu de 3,8 para 4,8 e a inflação de 20% para 508% ao ano. Foi diante dessa conjuntura que se deu o golpe militar em 1973 e a ascensão do ditador militar Augusto Pinochet.
Assim como Allende, Pinochet também tinha a sua agenda ideológica – o ultraliberalismo económico. Ou seja, a minimização do [LER_MAIS] Estado a favor de uma economia de mercado. Para cumprir o seu programa económico, Pinochet cercou-se de economistas chilenos formados pela escola liberal de Chicago, conhecidos na altura por “Chicago Boys”.
O plano económico do Pinochet consistia em ajustar as contas do Estado pela via dos gastos, combater a inflação e privilegiar a propriedade privada. Foi assim que se deu o Milagre Chileno. O paralelismo entre o Chile de 70 e o Brasil de agora é claro, mas trará consequências bem distintas.
É quase certo que Jair Bolsonaro seja eleito o novo presidente do Brasil no próximo dia 28. Em termos económicos, o Brasil pósesquerdismo expansionista do PT tem alguns desequilíbrios parecidos com o do Chile em 1973.
O desemprego em alta (13%) e um elevadíssimo défice público, previsto chegar a cerca de 32 mil milhões de euros este ano (2,3% do PIB). Tal como Pinochet, o capitão Bolsonaro também tem uma agenda ideológica de cariz ultraliberal. E, tal como Pinochet, Bolsonaro também terá um economista da Escola de Chicago, chamado Paulo Guedes – provavelmente o super-ministro da economia brasileira.
As propostas económicas prevêem privatizações, redução do défice público pela via dos gastos e do investimento público e privatização parcial da previdência social. Ao contrário do Chile, o Brasil não entrará em nenhum milagre económico por duas razões. A primeira tem a ver com o desinvestimento público.
O Brasil tem problemas sociais acentuadíssimos na saúde, educação, segurança interna, justiça, coesão social e redistribuição de rendimentos. O enfraquecimento do Estado social vai debilitar, ainda mais, o desenvolvimento do país. A segunda razão relaciona-se com a conjuntura internacional.
Até 2023, a economia mundial vai abrandar o seu crescimento. Há demasiadas incertezas sobre a guerra comercial EUA/China e a situação da Itália na zona euro. As propostas económicas de Bolsonaro, gizadas pelo Chicago Boy Paulo Guedes, são pró-cíclicas a não anti-cíclicas. São demasiadamente ultraliberais para uma conjuntura que pede algum keynesianismo.
*Docente do IPLeiria