É uma pena.
Uma das características que sempre mantiveram os leirienses numa espécie de vanguarda – não gosto por aí além do termo, mas siga – é (ou foi) o gosto pelo que ainda não se conhece.
Ouvir, ler, ver aquelas coisas que mais ninguém sabe o que são. Ouvir, ler, ver antes de todos e partilhá-lo com os outros.
É assim, aliás, que ainda funciona a cabeça dos mais valorosos promotores da cidade – que me escuso de voltar aqui a mencionar, porque não só já o fiz antes, como vocês sabem muito bem quem são.
O problema é que vocês sabem bem quem são, porque, numa espécie de movimento generalizado de estupidez colectiva, são precisamente aqueles a cujos eventos e iniciativas vocês não vão, a não ser que socialmente pareça mal não irem, ou que alguém ou algo do passado ou do mainstream faça parte do mesmo.
Os leirienses renderam-se ao conforto da nostalgia e do valor seguro.
A descoberta ficou-se na juventude de outrora e a juventude de agora parece ter coisas mais importantes para fazer num qualquer mundo virtual, do que propriamente participar em festivais de cinema do mundo real, ou ver ao vivo bandas de [LER_MAIS] que nunca ouviu falar e que não são as bandas dos seus vizinhos ou dos colegas do liceu.
É pena. Mais. É um desperdício. Dizia o David Fonseca em entrevista ao JL a propósito da candidatura a capital Europeia da Cultura: “Qualquer pessoa que esteja ligada aos aspectos culturais da cidade acha isso um pouco estranho. É óptimo que se candidate, só não percebo como pode considerar tal coisa uma cidade cuja movimentação cultural está, praticamente, toda assente em gente amadora de boa vontade, que não está ligada a objectivos políticos, mas que tem gosto de organizar eventos na sua terra”.
É isto, com uma agravante: agora, até para isso o público se está nas tintas. “Encarneirou”. Perdeu aquela visão única.
Ainda vão a tempo de descerem do pedestal em que se colocaram a vocês próprios às custas dessa tal “gente amadora de boa vontade” e perceberem que se começou uma coisa que precisa de vocês para vir de facto a ser alguma coisa.
Para já, ainda não é e corre o risco de nunca vir a ser.
*Editor-in-chief Vice Portugal