O Pedro Tochas vai regressar à televisão para animar mais uma temporada do Got Talent Portugal?
Sim, por mais uma temporada. A equipa toda foi convidada. Vamos começar a gravar em Janeiro. Há sete anos que ando a fazer isto!
Sentem que são uma espécie de ‘olheiros’ das pessoas que prometem dar um grande contributo para o mundo do espectáculo nos próximos anos? É uma responsabilidade que pesa?
Nunca pensei nisso desse modo! O que sinto é que as pessoas se esquecem de que uma carreira artística é uma maratona e não um sprint. Uma carreira artística não é ganhar a lotaria e a prova disso são aqueles artistas que, após algum sucesso, desaparecem. É preciso ter talento, trabalhar e continuar esse esforço. Este programa é um empurrãozinho. Mesmo que corra mal a passagem pelo Got Talent, nada impede que não se venha a ter uma carreira brilhante. A maior vantagem é que mostramos formas artísticas que não entravam nos horários nobres, como a dança, o circo e até o canto não-pop. Há quem diga que já há programas com cantores… mas aqui temos líricos e outros estilos musicais… temos maior diversidade do que os próprios programas de canções. Sim, é um ‘empurrãozinho’, mas é um empurrãozinho que mostra a importância da formação. Há 25 anos, quando me perguntavam o que fazia e eu respondia que era humorista, a pergunta era logo “mais isso dá?!” Agora o que perguntam é onde me podem ver. Isto mostra como o País evoluiu. Outra coisa gira era quando os pais, dantes, diziam que o filho queria ser artista, mas que também estava na universidade a tirar Matemática. “Mas ele acaba o curso e, depois, vai estudar teatro?” Se uma pessoa quer ser actor ou actriz, que vá estudar teatro! Perde-se três anos para ter “uma segurança” …, mas qual segurança? Hoje, não há segurança alguma. A única segurança é ser-se bom naquilo que se faz. Mas hoje o público, e os pais, já perceberam que ser-se artista… músico, cantor, actor é uma profissão como outra qualquer! É preciso formação e dedicação. O talento é um ponto de partida, mas ‘ter jeito’, não chega. O talento dá muito trabalho. E é precisa formação. A vantagem de a ter é que não é preciso passar pela tentativa e erro. Deixa de ser por instinto e passa a haver uma razão lógica.
E do lado do público? Houve mudança nos gostos? Recordo-me da sensação que foi o ballet do António Casalinho, quando passou pelo Got Talent.
Em Leiria, neste momento, há uma escola de ballet, que não se pode dizer que é de nível nacional. A escola da Annarella é de nível mundial. Se calhar, nem o pessoal de Leiria sabia que ela existia e nós mostrámo-la! É um exemplo de dedicação e trabalho. Há dias, na apresentação do Guia do Preguiçoso Produtivo, do Filipe Carrera, disse que sou preguiçoso naquilo que não gosto. Quando estou a escrever e a preparar comédia, trabalho horas e horas, mas quando tenho de fazer a parte logística, de pedir licenças, o trabalho burocrático, não gosto. Dá-me preguiça. É bonito de ver escolas de circo espalhadas pelo País, artistas que aparecem no horário nobre e são estrelas. A maior parte das vezes, o público não gosta de outras formas artísticas porque não as conhece bem, mas começamos a mostrá-las e a diversidade começa a agradar. Houve também uma evolução. Há mais teatros. Recordo-me de os vereadores da Cultura serem o que eram. Agora, são pessoas com mais conhecimentos. O programador é uma pessoa que sabe como programar para a população, não pode escolher apenas aquilo de que gosta. É como um país. Quando ouço que se deveria gerir um país como se [LER_MAIS]fosse uma empresa… “meu amigo, o objectivo da empresa é dar lucro! O objectivo da gestão de um país é o bem-estar da população!” Conforto, saúde, educação, ambiente, cultura. Em Leiria, têm o José Lúcio da Silva, um teatro fabuloso, e vejam a variedade de programação que por lá passa. E há o Teatro-Cine de Pombal e o CCC, nas Caldas…. Há variedade e as salas não estão sempre cheias?
Continua a dar palestras em empresas? Ajuda os colaboradores com a felicidade no local de trabalho?
A minha intervenção chama-se “Ser sisudo não é sinal de competência é só sinal de que se é sisudo”. Parece óbvio, mas não é. Pego na minha experiência como artista de rua e na formação que tenho feito nesta área e equaciono como posso ter um conteúdo relevante para as empresas. Como encarar os problemas? Como comunicar? Como criar engagement [compromisso e empenho] com o público? Há muitas empresas com oferta semelhante e a diferença é a relação que se cria com o cliente. Normalmente, informam-me dos temas que pretendem que aborde e junto-os aos meus. Tenho uma visão de fora. Sou aquele que diz o que o CEO disse, mas, de outra maneira e eles escutam. É como num casal. Chegam a casa e um diz: “o Tochas diz que esta camisola é muito gira”. E a outra pessoa responde: “eu não acredito! Ando, há dois anos, a dizer que ela é gira e é preciso vir o Tochas para ouvires!” As palestras fazem mais diferença, têm mais impacto e mostram uma visão diferente. Quando quero fazer espectáculos, vou para os teatros, onde posso ir mais longe na loucura. Tenho uma companhia nova além das apresentações a solo, que é a Tochas e Telmo, que sou eu, o Telmo Ramalho e a Raquel Viegas. A Raquel prepara tudo e eu e o Telmo damos a cara no palco.
Daquilo que vê, qual é a sua leitura do estado de humor dos portugueses neste momento, com a pandemia, com a crise política, com as eleições…
Não sou político, não sou economista, não sou cientista, posso dizer o que sinto, mas há pessoas com muito mais conhecimentos do que eu para dar conselhos… se quiserem uma piada, posso ajudar. Só sei que estamos numa fase estranha, porque o Mundo inteiro esteve a jogar um jogo onde as regras eram escritas durante as jogadas. Estamos todos baralhados. Íamos jogando e as coisas mudavam a meio. Ninguém sabia como lidar com isto. Ninguém. Do fundo do coração, acredito que todas as pessoas tentaram fazer o melhor possível, no entanto, numa situação que envolve o Mundo todo, há quem fique prejudicado. Há sempre situações onde isso acontece. Por exemplo, quando se constrói uma estrada, haverá pessoas que ficam com os terrenos cortados, mas é para o bem do resto da comunidade. Na minha área, muita gente ficou prejudicada. “Ah! Mas os artistas não têm um pé-de-meia?” Ninguém tem um pé-de-meia, para estar ano e meio sem entrar um cêntimo. O pé-de-meia serve para substituir um pneu do carro, para fazer frente a algumas surpresas, mas nunca para estar 18 meses sem ganhar um tostão. Ainda por cima somos freelancers. Neste momento, estamos numa fase de recuperação, mas continuamos na expectativa. Temos tido momentos onde vemos o que há de melhor na Humanidade e temos outros onde só pensamos “fogo! Há pessoas mesmo más neste Mundo!” Ainda por cima o clima não está a ajudar, há vulcões, há cheias! Parece uma coisa do fim do Mundo. Por outro lado, quando as coisas não correm bem, isso só nos ajuda a perceber o que é importante e o que queremos da vida. Como as coisas são, daqui a dois ou três anos, ninguém se vai lembrar da pandemia. Os seres humanos esquecem rapidamente e repetem os erros. Querem um conselho? Tentem estar com as pessoas de quem gostam e reavaliem o que é importante, porque isto passa tudo muito rápido. Temos de parar e cheirar as flores.
Continua a ir regularmente a Avelar?
Sim. Ainda ontem lá estive. Após a abertura da fábrica de magia de Luís de Matos, que outros investimentos poderiam desenvolver o concelho de Ansião?
Uma fábrica de vassouras para artistas de rua (buskers)?
Uma fábrica dessas já não é ecológica. Já nem podemos usar vassouras. Eu ainda as uso para o meu número de espectáculo de rua, porque comprei uma carrada delas! Já fui ao estúdio do Luís de Matos e está muito interessante. Para mim, enquanto artista, Lisboa é melhor para o tipo de espectáculos que faço. Avelar até tem muita gente jovem, porque é uma vila com infra-estruturas. Tudo depende daquilo que se quer fazer, pois com a internet consegue-se viver e trabalhar em locais longe dos grandes centros. Em vez de se estar em Lisboa, numa casa minúscula, que custa balúrdios, pode-se optar por uma vivenda no interior e estar perto de todos os serviços e ir a pé.
Embora já fosse conhecido e tivesse muitos fãs, para o resto do público português, o seu Got Talent foi o anúncio da Frize?
Esse anúncio mostrou-me a uma geração. A Frize foi uma projecção nacional. Muitos perguntaram-me qual era sensação de viver o sucesso do dia para a noite e eu respondia que era espectacular e que só tinha demorado 13 anos. Já fazia uma série de coisas, mas a Frize foi o boom. Só que, entretanto, aquilo já foi há 15 anos e há uma nova geração que nem sabe que eu fiz o anúncio. Agora, sou o Tochas do Got Talent. A carreira artística tem altos e baixos e momentos onde somos menos e mais reconhecidos. Ainda há tempos, enchi os 700 lugares da sala do Casino de Lisboa, 15 dias depois, estava na Austrália, à chuva, a fazer um espectáculo para dez pessoas. Ou se gosta ou não se gosta e eu adoro fazer espectáculos. Gosto de perceber como reforçar a mensagem de uma empresa que me contrata, de perceber como melhorar uma coisa no Tochas e Telmo, ou de, com um comentário no Got Talent, poder ajudar alguém a seguir uma carreira e a não desistir. No final, tudo se resume a nós. Ou queremos ou não queremos. Tenho a minha profissão de sonho e faço aquilo que gosto e mais de metade do que faço é seca! A vida não é uma conta de Instagram onde só se mete os momentos altos! A vida tem todos os outros momentos. Para uma hora e meia de espectáculo, há seis meses de trabalho de preparação, com dias bons e maus. Tenho quase 50 anos e a vida é o que é. Não nos podemos levar demasiado a sério. Mais tarde ou mais cedo, já cá não estamos e ninguém se lembrará de nós.
“A minha mãe ainda pensa que ando na universidade!”
Pedro Tochas, 49 anos, é natural de Avelar, no concelho de Ansião. Aos 15 anos deixou a vila para ir fazer o ensino secundário em Coimbra.
Há década e meia, um anúncio à água Frize tornou-o conhecido da maior parte do público e, hoje, a sua participação no programa de televisão Got Talent continua a mantê-lo no lar dos portugueses.