Paga actualmente uma factura de gás natural na ordem dos 100 mil euros, corre o risco de ver esse valor subir para 300 mil.
A Vasicol, empresa de Porto de Mós que produz artigos utilitários, de decoração e para jardim, é uma das muitas empresas cerâmicas que temem sofrer aumentos “significativos” deste combustível.
“Agora pagamos o gás natural a 14 euros o kw/hora. Pedi uma proposta e o valor é de 55 euros o kh/hora”, conta ao JORNAL DE LEIRIA Márcio Cardoso, adiantando que o contrato com o actual fornecedor termina em Dezembro e manifestando esperança de conseguir negociar melhores preços.
Caso venha a ter de pagar o gás àquele valor, será bastante preocupante, frisa o empresário. “Estamos a falar de quadriplicar os preços”. Para as empresas de cerâmica, muito dependentes do gás natural para o funcionamento dos fornos, “é um rombo muito grande”, que causa asfixia.
Se os aumentos previstos se concretizarem, a Vasicol terá de comunicar aos clientes aumentos de 20 a 30% nos preços das encomendas. O que é um risco. “Se subirmos os preços, a médio/longo prazo os clientes voltarão para a China”.
A perda de competitividade face aos concorrentes de outros países é um receio partilhado por outros empresários.
“Apoiar as exportações deste País é mesmo isto! Aumentar o gás natural de tal forma que se torne insustentável exportar um dia destes”, ironizou Carla Moreira numa publicação no Facebook.
No caso da Arfai, de Alcobaça, o factor energético (uma das componentes do preço do gás natural) aumentou de 0,16 para 0,32. “O dobro, portanto”, destaca a empresária, que dizia ainda que “o problema é que as companhias fornecedoras não aguentam os aumentos sucessivos e, unilateralmente, alteraram os preços antes do contrato terminar. E podem fazê-lo por contrato”.
[LER_MAIS] A empresa paga uma factura entre 15 e 20 mil euros mensais e Carla Moreira admite que o valor não duplique, como aconteceu com o factor energético. Mas sabe que o aumento que vier “terá um impacto brutal e assustador”.
“Temos muita procura agora, é certo, muitas empresas saíram da China e estão a comprar na Europa e em Portugal. Mas se nos tornamos demasiado caros arriscamos perder clientes.
A perda de competitividade é um risco”, sublinha ao JORNAL DE LEIRIA a administradora da Arfai, que exporta 98% da sua produção.
“Devia haver algum controlo do Governo no que respeita às energias”, defende Carla Moreira, lembrando que a electricidade também tem subido muito.
“Temos uma estação fotovoltaica com 240 painéis que no primeiro ano se pagava a si própria. Agora nem se sente vantagem, foi absorvida pelo aumento da electricidade”.
Marcelo Sousa, administador da Matcerâmica, no concelho da Batalha, lembra que a energia é um dos principais custos de produção e o gás o maior custo energético.
Os impactos da escalada de preços “são inevitáveis e vão directos à nossa margem, ou seja, fragilizam sempre a nossa competitividade”.
“O desfasamento temporal que existe entre estes aumentos e os preços acordados com os nossos clientes não permite reflectir a totalidade destes aumentos”, explica.
Para este gestor, “o governo devia intervir ao nível da legislação sobre as taxas e tarifas de forma a minimizar estes aumentos”.
“Também devia incentivar e compensar ao nível fiscal, nomeadamente todas as empresas que maximizam as melhores práticas de eficiência energética”.
Gás: governo a trabalhar para reduzir preços
Apicer defende intervenção a nível europeu
José Sequeira, presidente da Apicer, associação da indústria cerâmica, admite que a preocupação com os aumentos do preço do gás natural “é muito grande”. É que há subidas de 50 e de 100%, o que tem “reflexo imediato e muito forte na actividade das empresas”. “Parece-nos que a única solução é que a questão seja dirimida na Europa e que a Comissão Europeia tenha uma posição normalizadora da situação. O que se passa é grave de mais para ser resolvido/tratado apenas pelo nosso país”, diz ao JORNAL DE LEIRIA. O dirigente lembra que as empresas estão a lidar também com as questões da descarbonização, objectivo que implica “investimentos muito significativos”. Lamentando que haja “alguns exageros nas metas definidas”, o presidente da Apicer garante que o sector compreende as necessidades climáticas subjacentes à descarbonização, mas diz que é preciso compatibilizá-las com as necessidades da indústria. Esta segunda-feira, o ministro da Economia, Siza Vieira, garantiu que o Governo está a trabalhar para reduzir os preços do gás para as empresas industriais, embora seja uma tarefa “mais difícil” do que limitar os de acesso às redes eléctricas.