Apanhei um dos muitos cozinheiros de “opinião-política-pronta-a-servir” a fazer considerações sobre a necessidade do primeiro ministro substituir a ministra Constança Urbano de Sousa.
Segundo ele, o facto da ministra se emocionar até às lágrimas em frente das câmaras provou, definitivamente, a sua incapacidade para liderar um ministério. Isto é, para o comentador, Constança como pessoa pode mostrar as reações do seu sistema límbico num contexto de emoção extrema, mas essa Constança como política, apesar de continuar pessoa, a mesma pessoa, não pode revelar o sentimento de tristeza e mostrar-se comovida!
Ora, eu não penso assim e vou mesmo ao extremo de dizer que querer politizar as emoções é um perfeito disparate uma vez que elas são inatas e apesar de produzidas na mente nada têm a ver com ela. Um disparate também, mas bem mais perigoso é querer politizar o sentimento de tristeza revelado pela ministra.
De facto, não sendo os sentimentos pessoais visíveis (diz António Damásio: “Se você tiver um sentimento de profunda tristeza, mas se me quiser enganar, e quiser comportar-se como se estivesse alegre, vai-me enganar mesmo, porque eu não posso saber o que está dentro da sua cabeça”) querer politiza-los, é quase militariza-los e por isso um incentivo aos políticos para nos mostrarem falsos sentimentos.
[LER_MAIS] E afinal não é dessa falsidade que todos nos queixamos? Confesso que me irrita esta mania de se achar que a politização de tudo é uma condição necessária e suficiente para que haja democracia.
Aliás, vejo nesta pandemia politiqueira não só a justificação para a concentração excessiva da nossa atenção nos aspetos mais superficiais da própria política como também um incentivo para que os melhores de nós tantas vezes se afastem de cargos políticos.
Tal é compreensível quando a politica espetáculo que aceitamos ser a privilegiada, se assume como a política! Não fosse ela e talvez hoje, deixando à justiça o que é da justiça, já tivéssemos um novo aeroporto e linhas férreas iguais às do resto dos nossos vizinhos Europeus.
Dito isto, até parece que defendo a política apenas nas mãos dos políticos, mas não! O que desejo é não ver o lado animal/ emocional do comportamento humano ser elevado ao patamar de ato político.
A ministra chorou porque os animais humanos choram quando estão tristes e tal jamais poderá ser considerado um ato político! Decisão política e ainda por cima errada foi, por exemplo, a de Assunção Cristas que enquanto ministra decidiu autorizar a progressão da cultura do eucalipto em zonas de regadio público sendo na altura aprovada uma lei que desbloqueou a possibilidade de expansão do eucaliptal em Portugal.
A ministra Constança emocionou-se e daí? Eu também me emociono e sinto uma profunda raiva quando ouço Assunção Cristas falar dos incêndios. Nessas alturas, garanto-vos, nem um bocadinho de política invade os meus sentimentos!
*Professora