Leia aqui a primeira parte da entrevista
Os colégios têm vindo a perder financiamento através dos contratos de associação. Entende que a posição do Governo é uma guerra contra os particulares ou foi da ex-secretária de Estado, Alexandra Leitão?
Agora à distância, concordo que haveria medidas a tomar. Tivemos uma secretária de Estado inexperiente no sector, que não conhecia a realidade e meteu os pés pelas mãos. Não é por ser inteligente e trabalhadora, como ela é, que se percebe de Educação. Ela não percebia a realidade das escolas, inclusive conseguia dizer os maiores disparates possíveis. Quando se chegou a dizer que recebíamos 86 mil euros e que a Câmara de Ourém recebia 20 mil euros para as escolas públicas… Esse valor é para despesas de manutenção. Com os 86 mil euros, eu pagava vencimentos e fazia manutenção. Temos os estudos todos. A escola pública custa mais de 130 mil euros por turma. Com o descongelamento de carreiras há um conjunto de escolas que custam 140 mil euros por turma. Nunca tivemos as carreiras descongeladas e temos de viver com 80.500 euros. Para isso, temos de arranjar receitas próprias. Admito que se pudessem ter feito ajustes. O CEF foi das escolas que mais sofreram. Tínhamos uma dimensão enorme. Toda a gente nos procurava. Fizemos um trabalho cívico brutal. Chegámos a ter uma rede de autocarros para ir buscar os miúdos a locais de onde só viriam à escola se os fôssemos buscar. Fazíamos isso porque o Estado sempre nos pediu para o fazer. Mas não pode de um dia para o outro dizer: já não vos queremos. Isso é imoral. O nosso sonho não era ter uma escola com 1500 alunos, mas não podia, em dois ou três anos, transformar uma escola de 1500 alunos em 1000. O CEF despediu mais de metade dos seus professores. Pagou e negociou indemnizações a todos. Ainda hoje estou a pagar milhões de euros em indemnizações, com recursos a empréstimos bancários, sem conflitos dentro da instituição. Mas isto foi uma dor de alma. Imagine-se o que é os professores saberem que iam ser despedidos, porque a direcção sempre foi transparente, e mesmo assim continuarem a esforçar-se e a trabalhar com os seus alunos. Foram anos terríveis. Imagine-se o que é em três anos despedir metade da escola. Isto é brutal do ponto de vista financeiro e humano.
Os pais não deveriam ter o direito de poder escolher a escola dos filhos?
Essa era a nossa batalha: à família compete o direito de escolha. Vimos pessoas com relevo dizer: se querem escolher a escola, paguem. É assim que se perpetuam as elites. Mas podese dizer que a escola pública não é igual à escola privada? A escola pública é boa, mas há questões de organização e gestão que são diferentes, até pela experiência. Modéstia à parte, fui “formado” durante dezenas de anos para ser director, conhecendo todos os aspectos de uma organização. Não sou uma pessoa que ontem estava a dar Geologia e agora está na direcção. Uma escola é uma empresa e tem de se perceber o que é um balancete e um orçamento. Houve um ataque ideológico. Fomos moeda de troca do Bloco de Esquerda. Poderiam ter sido feitos ajustes, e sempre estivemos dispostos a aceitá-los, mas não podia ser com aquela violência. Houve muitos alunos que sofreram na pele o facto de não poderem continuar a frequentar aquela escola. Foram para condições más, porque a escola pública também não estava preparada para os receber. Aumentaram- se os custos no erário público, que [LER_MAIS]passou a ter turmas mais caras e a pagar subsídios de desemprego. Tudo poderia ter sido feito ao longo de uma década. Fomos maltratados e não merecíamos, porque sempre estivemos dispostos a conversar. Saiu a Dra Alexandra Leitão, temos um ministério mais simpático, mas que continua algo indiferente. Considera- se que o problema está sanado e ainda não houve tempo para olhar que há ajustes que têm de se fazer. O Estado necessita de nós. Somos rede pública. Já que não há liberdade de escolha, que é o que defendemos, então queremos exactamente o mesmo: os mesmos valores e o mesmo tratamento da rede pública, porque sabemos que se não formos necessários também nos descartam. Continuar a dizer-se que o Tribunal de Contas não consegue encontrar o valor por turma é quase ridículo e um ataque à inteligência. Basta multiplicar o número de turmas existentes pelo número de professores. Sabe-se o valor do vencimento dos professores, dos funcionários e das despesas de água e luz.
É por serem mais autónomos que os colégios conseguem resolver as adversidades mais rapidamente, como sucedeu com o ensino à distância, no qual a maioria das escolas particulares arrancou mais rápido do que as públicas?
A escola pública, como toda a organização pública, tem de ser mais ágil. Não é transformar o director num ditador. O director já nem é um líder, é um mentor, é quase um ajudante. Os canais de decisão têm de ser encurtados. Para decidir algo que tem a ver com o funcionamento da escola, apesar de ter uma componente pedagógica, não é preciso estar à espera uma semana para reunir o Conselho Pedagógico para este construir um documento. O director tem de rapidamente pegar numa equipa e delegar com linhas orientadoras e em poucas horas temos um modelo. Se tem de ir a um Pedagógico, o Pedagógico tem de pensar se o Conselho Geral vai aceitar, se se vivem climas quase de medo de não decidir, a coisa acaba por correr mal. Têm de se agilizar as decisões. E as pessoas devem ter abertura para conversar com os seus pares. A partilha de informação é muito importante.