A marca Matinados, da Companhia Avícola do Centro (CAC), patrocina pela terceira vez consecutiva as 7 Maravilhas de Portugal. O que vos levou a juntarem-se à iniciativa?
A Matinados tem 25 anos e durante muitos funcionou como nicho de mercado. Quando em 2012 redefinimos a estratégia global da empresa, uma das decisões foi acompanhar a tendência que se verificava no Norte da Europa em termos de bem-estar animal e de produções alternativas e apostar no ar livre e na marca Matinados, que decidimos potenciar, com divulgação, começando a patrocinar algumas iniciativas. Entretanto surgiram as 7 Maravilhas, na primeira edição com o tema da doçaria, pelo que fazia sentido a associação; na segunda continuámos a ser parceiros e agora nesta terceira edição, de novo com o tema da gastronomia, voltamos a patrocinar. É um evento que nos dá visibilidade, embora tenha sido ainda mais importante no passado. Foi onde começámos a comunicar mais em televisão. Este ano, por força da redefinição estratégica em termos de comunicação, passámos a apostar noutras áreas, como o product placement. As 7 Maravilhas já não são, por isso, a iniciativa que mais notoriedade nos dá.
Esta marca regista há vários anos crescimentos anuais superiores a 30%…
Desde que a relançámos tem crescido sempre a dois dígitos, nessa ordem, mas no ano passado até foi muito perto dos 50%. Cresce a marca e cresce o conceito de ar livre. Não o fazemos sozinhos, os concorrentes também o fazem. O que fizemos foi antecipar tendências, apostando mais na produção ao ar livre e na biológica. Tínhamos uma marca para ovos biológicos, a Campestre, que mantemos, e passámos a ter também a Matinados Bio, felizmente com sucesso. A grande diferença entre ovos de ar livre e ovos bio tem a ver com a alimentação das galinhas, embora haja também regras diferentes nas áreas das explorações e no tamanho dos bandos.
Os ovos de galinhas de ar livre já representam a maior fatia da produção da CAC?
Temos quatro sistemas de produção. Por ordem de valor: gaiola, solo, ar livre e biológico. Regista-se um crescimento natural da produção ao ar livre e também no biológico há crescimentos. Claro que os biológicos custam o dobro do preço dos de ar livre, porque o custo da alimentação das galinhas é muito alto. Mesmo assim, é um produto que cresce a um ritmo significativo. Mas à medida que aumenta o consumo destes produtos há alguma tendência de aproximação dos preços aos dos outros ovos. No futuro, o preço, nomeadamente dos ovos de ar livre, será muito mais equilibrado. Há uma questão muito importante de que o consumidor normalmente não tem percepção: o ovo é um produto muito barato. Sentimos necessidade de promover o ovo para dar a conhecer ao consumidor as suas potencialidades e para que as marcas possam crescer. A nossa comunicação tem-se dirigido muito aos benefícios do ovo. Não é perceptível ao consumidor o valor proteico e vitamínico que o ovo tem, comparado com a maior parte dos alimentos. Somos dos países da Europa que menos ovos consomem per capita. E este é, diria, o alimento mais completo depois do leite materno.
Mas o consumo de ovos em Portugal tem crescido…
Não temos muitos dados estatísticos, mas há uns anos eram 180 ovos per capita. Agora devemos andar muito perto dos 200 ovos. Na Europa a média é de 240.
[LER_MAIS] Fundada em 1986, a CAC resultou da vontade de 13 produtores que se uniram para escoar a sua produção e “poder sonhar com um futuro maior”. Na altura imaginava poder atingir o patamar em que estão agora?
Estou na CAC desde o início, não esperava na altura estar à frente da organização, cargo que assumi ao fim de cinco anos, por me terem convidado. Deixei outros projectos pessoais e dediquei-me completamente à empresa. É um facto que se formou com alguma ambição, mas nestes 35 anos, e sobretudo nos últimos oito, houve uma grande reestruturação interna e algumas decisões importantes. Os 13 accionistas iniciais são hoje menos, mas continuamos a ser uma organização de produtores e a ter a mesma filosofia. Hoje movimentamos 600 milhões de ovos por ano. Este crescimento foi feito com ligação à produção e com contratos com produtores, muitos deles também accionistas, mas outros que não o são.
Têm um efectivo de 2,25 milhões de galinhas poedeiras, distribuídas por 44 explorações. Isto exige um acompanhamento muito próximo aos produtores…
Os nossos produtores são totalmente integrados, ou seja, fornecemos os factores de produção, as rações, as galinhas e recolhemos os ovos. Os produtores têm garantido o escoamento do produto e a rentabilidade. Eu próprio sou um dos produtores integrados da CAC. Mas a função de accionistas está bem separada da de produtores. Houve uma evolução das produções alternativas (solo, ar livre e biológica) que em 2020 já representaram mais de 50% das nossas vendas, e com tendência a crescer. Já notamos com a Matinados que os consumidores pedem ovos pela marca. Num produto commodity como o ovo, em que há marcas próprias da distribuição, criar uma marca não é fácil. Mas foi um sucesso e dá-nos alguma garantia de crescimento. A responsabilidade de ter uma marca exige que, além de darmos assistência técnica, tenhamos de fazer auditorias aos nossos produtores. Também alguns dos nossos clientes o podem fazer directamente, e até sem o anunciar.
Além de vender ovos com as suas marcas, a CAC também fornece a grande distribuição…
Temos várias marcas nos diversos segmentos, que facturam bastante, mas o grosso do negócio continua a ser a venda à grande distribuição. Embalamos para praticamente todas as cadeias ovos de ar livre, como embalamos os biológicos. Trabalhamos com todas.
São cadeias muito exigentes?
As cadeias de distribuição sempre foram um parceiro difícil. Mas o facto de haver neste momento em Portugal duas empresas [produtoras de ovos] com uma dimensão muito acentuada – a CAC e a Zêzerovo – permite-nos ter algum poder negocial. Têm de trabalhar com uma ou com outra, não podem dispensar as duas ao mesmo tempo. Mas as cadeias de distribuição impõem muitas regras. O crescimento que fomos tendo permitiu-nos aumentar o nosso poder negocial. Veja-se um exemplo: o Lidl só trabalha com as suas marcas, mas esta semana [segunda de Agosto], pela primeira vez, colocou a Matinados à venda. Não é definitivo, mas negociou connosco fazer três ou quatro acções. Porquê? Porque sente essa necessidade, visto que é o consumidor que muitas vezes pede a marca. Mas não vendemos apenas para a grande distribuição. Também vendemos ao canal Horeca, à restauração e às pastelarias. E às mercearias. Quando a CAC começou não havia hipermercados. Mantemos a componente do pequeno retalho, e com muito significado. O grosso do volume de facturação da CAC provém de 10 clientes, mas a empresa tem 1.200.
Hoje, o universo CAC reúne 12 sociedades e uma holding, emprega 210 trabalhadores e factura anualmente mais de 80 milhões de euros, controlando todas as fases do circuito produtivo, desde a produção de ração até à distribuição dos ovos. Quais os principais desafios que se colocam à gestão de um grupo desta dimensão?
São sempre muitos. Neste momento é o investimento de seis milhões de euros que está em curso. Em Outubro deverá já ser possível classificar ovos no novo espaço [na Bidoeira]. Temos alguns meses com picos de processamento, entre Outubro/Dezembro, na Páscoa e no Verão, o que obriga a exigir algum esforço adicional às equipas. Com este investimento coloca-se mais uma máquina, com maior automação, porque uma das dificuldades que temos é a mão-de-obra. Neste centro não havia ainda tanta automação, porque não tínhamos espaço. Pelo contrário, no centro de classificação do Cercal (Fátima), já havia alguma robotização. Com este investimento na Bidoeira, duplica-se a capacidade de classificação e triplica-se a área que tínhamos, porque toda a logística passará a ser feita aqui. Tudo isto é para dar sustentabilidade ao nosso plano de crescimento nos próximos anos. Crescimento este que estará assente na mudança de produção de ovos de galinhas em gaiolas para galinhas de ar livre, que acontecerá em 2027.
Mas para ter explorações de galinhas ao ar livre é preciso mais espaço…
A filosofia da CAC sempre foi a parceria com produtores. Reconhecemos que não é fácil crescer na produção ao ar livre. Há sete ou oito anos dizia que não conseguiríamos arranjar áreas de terreno para isso. Mas quando passámos a calcorrear o território percebemos que há condições. Não em Leiria, daí a nossa deslocação para o Centro Norte. Tanto temos explorações no Minho como na Serra da Estrela, onde está muito concentrada a nossa produção de ovos biológicos. Encontrámos áreas maiores e arborização, muito importantes neste tipo de produção. Devido ao seu clima, Portugal e Espanha têm condições de dar cartas neste tipo de produções. Em suma, um dos desafios passa por uma forte aposta nestes segmentos, uma vez que chegámos à conclusão que não é tão difícil assim arranjar espaço. Não menos importante, outro aspecto relacionado com este tipo de produções é a redução da pegada ambiental.
A CAC vai continuar a tentar diferenciar-se…
Sim, os objectivos vão além do que disse, passando pelo desenvolvimento de produtos diferenciadores, consoante as regiões. Ou seja, o Minho tem características de solo diferentes das da Serra da Estrela, aspectos que podem ser explorados e potenciados. Podemos valorizar as produções em função daquilo que o território permite. Ou seja, segmentar ainda mais o produto. Outro projecto com interesse tem a ver com o aproveitamento dos resíduos. Os excrementos das galinhas são aplicados na agricultura, mas não são convenientemente tratados. Temos há algum tempo um projecto pensado para esta área, para produzir adubo orgânico a partir dos excrementos das galinhas. Na sequência de uma visita que fizemos ao Japão, adquirimos uma unidade experimental e durante o próximo ano ou no seguinte poderemos aproveitar alguns apoios comunitários para lançar o projecto e fecharmos a circularidade no nosso negócio.
A subida dos custos das matérias-primas é um problema…
Sim, um dos constrangimentos que estamos a ter é a subida exponencial do preço das matérias-primas. Afecta o nosso e muitos outros sectores. Já levou, e vai voltar a levar, a subidas de preços dos produtos. Estamos a falar de 10% a mais nos custos de produção, que não se reflectiu ainda nos preços, por uma razão simples: a pandemia provocou um excesso de oferta de ovos, porque o canal Horeca deixou de comprar. O que absorvia foi para exportação ou para a indústria de ovoprodutos. Se a oferta é maior, há dificuldade de repercutir aumentos de custos nos preços.
A exportação é um objectivo da CAC?
Será. Sempre exportámos bastante. Mas o crescimento do mercado interno levou a que reduzíssemos a exportação. Porque exportávamos o excedente. Nunca tivemos na exportação uma aposta de valorização do produto. Isso só acontece em mercados onde temos estado sempre, como o suíço. Também vendemos para Espanha, por via da relação que temos com a Derovo. E mantemos uma relação continuada e regular com Guiné e Cabo Verde. Mas para já o foco é o mercado interno. Portugal exporta ovos, mas também importa. Embora sejamos autossuficientes.
Perfil
Trinta anos à frente da CAC
Manuel Sobreiro é um dos produtores de ovos que há 35 anos fundaram a cooperativa Companhia Avícola do Centro. Desde o início que faz parte da direcção e há 30 anos que assume a presidência. É sócio de várias empresas produtoras de ovos que têm explorações em vários pontos do País. Há largos anos que está ligado ao movimento associativo. Faz parte da direcção da Federação Portuguesa das Associações Avícolas e é presidente da Assembleia Geral da Associação Nacional de Produtores de Ovos. Vive em Vermoil (Pombal) e é presidente da Assembleia Geral da Sociedade Filarmónica Vermoilense. É também deputado municipal em Pombal.