Portugal legalizou o uso de cannabis para fins medicinais há três anos e foram vários os investidores que desde logo se perfilaram para avançar com a produção desta planta. Fica de resto localizada na região Centro a primeira fábrica de cannabis medicinal do País, um investimento da Tilray, farmacêutica de origem canadiana, que escolheu Cantanhede para instalar uma unidade de 15 mil metros quadrados, divididos entre zonas de cultivo, laboratórios, áreas de processamento e embalamento.
Na região de Leiria, muitas empresas estão a apostar neste negócio, atraídas pelo clima e pela centralidade geográfica, que são pontos-chave nesta actividade. Nos diferentes concelhos, somam-se contactos de investidores interessados em produzir, havendo já cannabis medicinal, o novo filão já floresce por cá vários projectos em curso, alguns dos quais em fase de testagem das plantas.
Na passada sexta-feira, mais uma empresa manifestou vontade de se instalar por cá, na Marinha Grande. Investidores suíços e holandeses aferem a viabilidade de criar plantação e fábrica, numa área de 20 hectares, que pode gerar 150 empregos, conta a presidente da Autarquia.
Distrito apetecível de Norte a Sul
No Norte do distrito, em Figueiró dos Vinhos, a empresa de capitais canadianos Emeraldestiny prepara-se para investir cerca de dez milhões de euros numa propriedade com cinco hectares, na freguesia de Aguda, onde irá instalar uma estufa e uma unidade industrial para secagem das plantas, extracção de componentes e embalamento.
Neste caso, a empresa pretende avançar com uma produção mista, com parte dela a desenvolver indoor e outra parte em outdoor, revela a Câmara de Figueiró dos Vinhos. Do lado do Município o processo está pronto e a empresa já pode levantar o alvará, adianta a Autarquia, [LER_MAIS]que se congratula com o número de postos de trabalho previsto: mais de uma centena.
Já no Sul do distrito, Caldas da Rainha tem um projecto em curso, na Zona Industrial de Santa Catarina, e continua a ser contactada por mais investidores interessados em produzir cannabis medicinal no concelho. “Recebemos mais dois contactos. Estão a analisar locais possíveis para instalação”, adianta Fernando Tinta Ferreira, presidente do Município.
No caso de Santa Catarina, está a ser construída uma unidade dedicada à produção de cannabis medicinal, que inclui áreas de produção, de laboratório e transformação. “Estamos a falar de produção e de transformação de um produto medicinal, que traz mão-de-obra especializada. É um projecto muito interessante”, considera Tinta Ferreira. “Cria postos de trabalho e vem revitalizar uma vila marcada pela desertificação humana”, sublinha.
No final de 2019, Kyle Leite, CEO da Aldeia Cannabis (sediada no Canadá), esmiuçava no site Link To Leaders os pormenores do investimento que prepara para Caldas da Rainha. Num terreno de 1,4 hectares, a empresa pretende criar instalações para cultivo indoor, de 1.500 metros quadrados, “com uma abordagem de agricultura vertical, capaz de produzir entre oito a dez toneladas de cannabis medicinal anualmente”.
Numa segunda fase, prevê aumentar o espaço de cultivo e a capacidade de produção. A estratégia passa por criar um espaço de cultivo ao ar livre para a produção de cannabis e cânhamo com alto teor de canabidiol, para processamento, a fim de criar óleos e outros produtos com infusão da cannabis. E o plano inclui ainda laboratórios de pesquisa e uma clínica para testes.
O CEO prevê “empregar entre 75 a 100 pessoas no primeiro ano de actividade”, duplicando a força de trabalho nos primeiros dois a três anos. O objectivo é exportar para o mercado canadiano e europeu. E para alcançar todas estas metas, a Aldeia Cannabis espera investir três milhões de euros nos primeiros cinco anos, em infra-estruturas, expansão, pesquisa e desenvolvimento.
Porto de Mós também está na mira dos investidores. Jorge Vala, presidente da Autarquia, confirma ter recebido um contacto informal no final do ano passado. “A Câmara não tem terrenos, mas se os projectos respeitarem a legislação serão bem-vindos e nós seremos facilitadores destes negócios, assim como temos de outros”, refere o presidente.
“Há três anos fomos contactados por uma entidade interessada em produzir cannabis para fins medicinais, mas no nosso concelho não havia nenhum espaço com as condições, com a dimensão que nos pediam”, recorda Paulo Batista do Santos, presidente da autarquia da Batalha. “Mas, entretanto, já temos uma produção licenciada, localizada entre as freguesias da Batalha e da Golpilheira, que está a utilizar as instalações de uma antiga estufa de flores”, expõe o presidente.
“Ainda não produzem, mas já estão a fazer testes, afinando as condições ambientais para que a produção tenha expressão”, adianta o autarca.
Negócio atrai investidores da área financeira
Com Eduardo Esteves, do ramo farmacêutico, e Eduardo Cabrita, da engenharia, Carlos Nunes, da área económica, é responsável pela Pangolin Solutions, consultora de Coimbra constituída exclusivamente para prestar apoio a quem pretende produzir cannabis para fins medicinais. Um processo que é “complexo”, admite Carlos Nunes, uma vez que exige a junção de muitos conhecimentos relativos à técnica, mas também à legislação.
Desde o final de 2019, a consultora Pangolin Solutions já submeteu 14 projectos ao Infarmed, 11 dos quais aprovados por esta autoridade, a quem compete licenciar negócios desta natureza, depois de se terem pronunciado outras entidades, tais como as Câmaras e as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional. Um dos contactos mais recentes junto da consultora foi precisamente o de um empresário interessado em saber da viabilidade de instalar uma produção na Batalha, expõe Carlos Nunes.
À Pangolin Solutions têm chegado maioritariamente investidores nacionais, embora também haja muito interesse por parte de empresas estrangeiras. E a maior parte dos investidores são pessoas que actualmente actuam na área financeira. “Muito mais do que pessoas relacionadas com a área agrícola ou com a farmacêutica”, realça o responsável.
Isto porque o processo de licenciamento é complexo, a estrutura exige bastante capital, mas a produção de cannabis medicinal tem grande potencial e é vista com bom investimento. Um projecto deste tipo, explica o responsável pela Pangolin Solutions, exige, em termos médios, cinco a dez hectares, onde trabalham 25 a 30 pessoas. Representa um investimento médio de cerca de cinco milhões de euros.
Momento para apostar é agora
Entre os países europeus onde esta actividade está legalizada, “Portugal é o que tem melhores condições”, frisa Carlos Nunes. Não só pelo clima, mas também pela sua posição geográfica.
Portugal funciona como “porta de entrada para o mercado europeu de cannabis medicinal”, nota o consultor da Pangolin Solutions, salientando que a implementação dos negócios está a acontecer agora e tem mesmo de acontecer agora. Sob pena de a legalização da produção chegar a Espanha e, com isso, Portugal perder a oportunidade de singrar nesta actividade, ultrapassado pela concorrência vizinha.