O Grupo Recreativo dos Milagres disputou, sem grande sucesso, as competições distritais de futebol durante quase duas décadas. Entre 1979 e 1996, as derrotas foram mais do que as vitórias. Mais tarde, em 2009, a secção foi reactivada, mas perder continuou a ser corriqueiro e a experiência não durou mais do que duas temporadas.
E tudo parou. O pelado do Campo da Colónia tornou-se num verdadeiro matagal e perdeu qualquer utilidade. Até que, “há coisa de ano e meio”, um grupo de nove amigos resolveu tentar fazer algo daquele espaço onde em tempos eram dados uns pontapés na bola. Só que o André, o David, o Gerson, o Rodrigo, o Paulo, o Tiago, o Amílcar e os Diogos não pensam em futebol.
Eles são o colectivo MX456 e todos os fins-de-semana, pegam nas motos e vão lavrar. Desde pequenos que são “completamente loucos” por motocrosse, alguns entraram em provas pirata. À falta de grandes alternativas na região e porque nos pinhais “há sempre árvores em contramão”, decidiram avançar para a construção de um espaço dedicado à modalidade que os vicia.
“Tínhamos uma pista no meio do pinhal, mas fecharam o espaço e não nos deixaram andar mais”, explica André Calhelhas. “Começámos a ver onde conseguiríamos fazer uma pista. Falámos, falámos, até que alguém teve a ideia de fazermos no campo de futebol. Está abandonado há anos e resolvemos tentar.”
Contactaram o clube e a Junta de Freguesia, que os incentivaram. Trataram das burocracias e resolveram meter, literalmente, mãos à obra naquele espaço a outro onde os roncos dos motores também se fazem ouvir, o Kartódromo Internacional de Leiria. “Durante os fins-de-semana era este o nosso destino. Está ali muito trabalho nosso”, diz Rodrigo Jorge.
Enquanto ganhavam calos nas mãos e aguardavam a chegada das primeiras remessas de terra, resolveram desenhar a pista no computador. Pediram opinião ao campeão nacional, o leiriense Paulo Alberto, que apoiou a ideia e concordou com o trajecto.
[LER_MAIS] Já não falta tudo para estar a pista estar pronta. “Só estamos à espera que venha o homem da máquina para podermos terminar a obra”, explica David Santos. Depois é recuperar o bar, o balneário e a iluminação, concluir as casas-de-banho, colocar o sistema de rega…
Não falta vontade de ver obra feita. “Queremos começar devagarinho e perceber a afluência. Estamos a fazer diferente, uma pista preparada todas as idades e a puxar pela qualidade”, completa André Calhelhas. Os amigos estão fartos de perguntar quando é que a pista abre. O objectivo é ser já este Verão.
Novas utilidades
Após o 25 de Abril de 1974, o movimento associativo teve um crescimento exponencial no distrito de Leiria. Surgiram dezenas e dezenas de clubes dedicados ao futebol em muitas aldeias que depois, ao longo do tempo, foram perdendo adesão. Nalguns casos, esses pelados permanecem ao abandono.
Noutros, como nos Milagres, surgiram interessados em dar utilidade ao que era inútil. À semelhança, de resto, do que aconteceu em Riba de Aves e na Usseira, onde pelados foram transformados em recintos dedicados à prática de paintball.
Ou até em São Bento, terra em que o hectare foi metamorfoseado numa pista onde carros à vela atingem 80 quilómetros por hora.