Ando para aqui a decidir se devia saber as coisas da vida ou se, pelo contrário, o truque é enveredar em consciência pela sábia ignorância das coisas. Entre um prudente enrugado e um pateta alegre, inclino-me fortemente a decidir de vez a minha existência pela segunda hipótese.
Não será em vão que a expressão existe. Andava eu aqui tão entretida com o sentido da vida em geral e o da minha, em particular, quando me vi obrigada a interromper as minhas dúvidas existenciais para tratar de temas um tanto ou quanto mais pragmáticos. Mais urgentes, vá.
Como é que o dilema me acontece? Passo a explicar: Carro na oficina. Obras em casa. E diz o mecânico: “Ainda bem que aqui veio. Arriscava-se a ficar sem motor aí no meio da estrada.” E diz o electricista: “Ainda bem que aqui vim. Estava sujeita a ficar aqui agarrada ou a um curto-circuito que lhe queimava a casa toda.”
Poupo-vos aos pormenores. Mas estive para ficar sem tecto e foi por um triz que o canalizador evitou uma inundação capaz de aniquilar a cidade inteira, qual Atlântida da província. Como a Mark Twain, também a mim me pareceram manifestamente exageradas as notícias sobre a minha morte anunciada. [LER_MAIS] Ainda assim, não consegui deixar de pensar na pergunta inquisitória que ficava sempre no ar. “Como é que andava com isto assim? “
A todos eles, apeteceu-me sempre responder: Há lá pergunta mais filosófica do que essa? Na verdade, andamos todos com “isto assim”, andando.
Não há hipérbole do dia-a-dia que faça do deixar andar um gesto menor. Porque é na inconsciência do que está por vir que assenta quase tudo na vida. Por mais insinuação de controlo que possamos sugerir.
O que tiver que acontecer, não será nunca nem mais nem menos do que o que tem que ser. Tal é a desnecessidade da preocupação.
Da ansiedade. Hoje, mais do que nunca, parece-me a mim que enquanto o motor não parar, o cano não rebentar e a casa não explodir, é naquilo que mais ignoramos que é possível ser feliz. Amanhã logo se vê.
*Pessoa criadora de conteúdos