1. Quem nos contou foi alguém muito próximo de Marcelo Caetano. Poucos minutos antes da cerimónia da sua tomada de posse como novo Presidente do Conselho, a 27 de Setembro de 1968, o Presidente da República Américo Tomaz e o Gen. Kaúlza de Arriaga chamaram-no de lado e avisaram: “O sr. nas colónias não mexe, ouviu? Nas colónias não mexe!”.
E, deste modo, o Prof. Marcelo Caetano ficou preso nesse limbo terrível em que a História coloca algumas personalidades, por vezes injustamente. Para uns (os que desejavam mudança), Marcelo Caetano foi incapaz de se impor aos ultras do regime; para outros (os ultra do regime), terá sido brando de mais com a oposição.
Marcelo Caetano governou num tempo em que a mudança do País não acompanhou a mudança do mundo, tendo sido por ela arrastado.
2. No dia 22 de Julho de 1946, a revista Time apresentava na sua capa a imagem de Salazar, acompanhada de uma maçã, com muito bom aspecto por fora, mas podre no seu interior. Na legenda: Portugal’s Salazar: Dean of Dictators (Salazar, de Portugal: O decano dos Ditadores).
A reportagem, escrita por Piero Saporiti, correspondente da Time em Lisboa, dizia entre outras coisas:
“Passados que são 20 anos de ditadura de Salazar, o decano dos ditadores na Europa, Portugal é uma terra melancólica, de pessoas empobrecidas, confusas e amedrontadas.”
O correspondente foi expulso, as edições confiscadas e a revista proibida em Portugal durante 6 anos.
E outros quase 30 anos se passariam em ditadura, antes da Democracia.
O tempo que se perdeu!
3 . E as inevitáveis questões, que um historiador nunca colocará:
– e se Salazar se tivesse rendido, logo depois da 2ª Guerra Mundial, aos benefícios da Democracia?
– e se, por desígnio dos deuses, Salazar tivesse aceitado a vitória de Humberto Delgado em 1958?
– e o que seria de Portugal se Salazar tivesse sido sensível à autonomia progressiva das colónias?
– Ou ainda: e se Salazar tivesse acompanhado os ventos de mudança, logo após a 2ª Guerra Mundial?
4. A verdade é que se chega ao início da década de 70, com uma guerra em 3 frentes, e Portugal é dos países do mundo que per capita mais gasta em defesa, acima dos Estados Unidos e da União Soviética: despesas militares na ordem dos 10 % do PNB, correspondendo a 66 % das despesas totais do Estado!
O mais pobre da Europa ocidental, só a Turquia abaixo de nós! A excepção eram as províncias ultramarinas, onde se vivia muito bem. De tal modo que quase todos os portugueses que aí viveram e tiveram que retornar após 1974, se confrontarão com esta triste realidade de um país melancólico, cinzento e triste.