Nos últimos três anos, o número de alunos estrangeiros a frequentar a escolaridade obrigatória no concelho de Leiria mais do que duplicou. No ano lectivo de 2018/2019 havia 530 crianças e jovens oriundos de outros países nas escolas da área do município. Em Setembro último eram já 1.318, número que, entretanto, aumentou, com a entrada de mais algumas dezenas de alunos, sobretudo, provenientes do Brasil, onde o calendário escolar termina em Dezembro.
“Todas as semanas entram alunos novos nas nossas escolas vindos de fora. E há alturas em que isso acontece quase todos os dias”. A constatação é de Jorge Brites, director do Agrupamento de Escolas (AE) de Marrazes, que é o território educativo do concelho com maior número de estudantes estrangeiros dentro da escolaridade obrigatória. Só neste agrupamento, havia, no início do lectivo em curso, 300 alunos provenientes de outros países, o que representa 23% do total de imigrantes que frequentam as escolas do concelho, do pré-escolar ao ensino secundário, inclusive.
Este aumento de alunos, que se faz sentir sobretudo nas escolas da cidade, que estão “sobrelotadas”, vai obrigar a mexer na rede escolar, assume a vereadora da Educação, Anabela Graça. Já no próximo ano lectivo, serão criadas duas novas salas para o pré-escolar, que é “uma prioridade”. Em paralelo, o município irá propor ao Ministério Educação a construção de uma nova escola, em São Romão.
“Muitas das crianças que chegaram ultimamente têm ido para escolas nos arredores da cidade e algumas para mais longe”, salienta a vereadora, que não se compromete com um prazo para a execução do novo edifício escolar, a construir num terreno municipal em frente ao complexo do Clube Escola de Ténis de Leiria.
A sobrelotação das escolas da cidade faz-se sentir também ao nível do 2.º e 3.º ciclos, reconhece a vereadora, que realça o “enorme esforço” que está a ser feito para dar resposta às solicitações. “Apesar de haver turmas que não estão em conformidade, porque já têm um número elevado de alunos, os professores compreendem as dificuldades que estamos a sentir e têm feito esse acolhimento”, sublinha Anabela Graça.
“Temos de ser sensíveis e olhar para outros critérios além das vagas disponíveis. Por exemplo, muitas das famílias que chegam não têm transporte. Colocar os alunos longe da sua residência, numa escola com vaga, significa sujeitá-los a um esforço adicional”, refere o director do agrupamento dos Marrazes, que olha para a integração dos alunos imigrantes como “um desafio”.
Até porque, “temos de o fazer com os recursos disponíveis”, nota Jorge Camponês, que dirige o AE D. Dinis. “Não se trata apenas de ter turmas com mais alunos, mas também gerir os recreios, com falta de funcionários, os cerca de 400 almoços diários e o atendimento a estes encarregados de educação”, reforça Jorge Dias, director do AE Dr. Correia Mateus.
Apoio além das questões pedagógicas
Além da questão da língua, que, “também se coloca com os brasileiros que às vezes não entendem o que os professores dizem”, os currículos são “muito diferentes” e “há um conjunto de disciplinas” para as quais os alunos estrangeiros “não trazem bases”, nota Jorge Brites.
É também aqui que entra o trabalho de integração e de acompanhamento dos alunos. “Ao chegar, fazemos uma avaliação das suas competência. Há disciplinas em que não faz sentido que participem na aula, sendo esse tempo usado para a recuperação de aprendizagens com apoio individualizado”, explica o director do AE D. Dinis, que iniciou este ano lectivo com 189 alunos estrangeiros, sendo o segundo do concelho com mais imigrantes.
O terceiro é o AE Dr. Correia Mateus que, em Setembro, tinha 147, sendo que no segundo período já chegaram mais de 60 alunos estrangeiros, estima o director Jorge Dias. De acordo com o professor, a maioria das inscrições é de jovens brasileiros, que terminam o ano escolar em Dezembro.
Mas, iniciar um novo ano lectivo quando em Portugal se está no segundo período de aulas não é aconselhável, admite o director do AE Correia Mateus. Por isso, o agrupamento tem a preocupação de explicar a situação aos encarregados de educação e sugere-lhes que mantenham os filhos no mesmo ano que terminaram no Brasil até ao fim do ano lectivo.
“Temos alunos que chegaram nos últimos 15 dias. Basicamente faltam três meses de aulas. É difícil a aprendizagem de todos os conteúdos”, constata Jorge Dias, ao afirmar que a estratégia do agrupamento passa também por reforçar os apoios no Português, mesmo para os alunos brasileiros.
Além da vertente pedagógica, as escolas procuram ajudar na questão social. “Muitos vêm com uma situação financeira difícil. Atribuímos de imediato o subsídio de acesso ao refeitório, podendo fazer refeições de forma gratuita. Temos o Gabinete de Apoio à Família que faz o encaminhamento das situações”, adianta Jorge Dias.
No AE Correia Mateus os alunos que não falam português não chegam a uma dezena. Nestes casos, frequentam duas horas por semana de Português Língua não Materna e acompanham as restantes disciplinas integrados na turma. “Também procuramos integrá-los em turmas onde já estejam alunos que dominam a língua deles, que assumem um papel de mentores. A preocupação não é só nas aulas, mas também fora da escola”, garante Jorge Dias.
Mais longe do centro de Leiria, o AE Henrique Sommer, na Maceira, não tem tantos alunos estrangeiros, mas os que frequentam aquele estabelecimento recebem um apoio extra para a melhor integração possível, que “não se cinge só ao Português Língua não Materna”.
Na Maceira, há também aulas para adultos estrangeiros em regime pós-laboral, que frequentam o Curso de Português Língua de Acolhimento. É o terceiro ano que a escola disponibiliza esta formação e o número de interessados tem vindo a aumentar.
Preparado acolhimento de refugiados
Com a chegada dos refugiados da Ucrânia, é mais do que certo que o número de alunos estrangeiros nas escolas irá subir, o que levou já o ministro da Educação a admitir aumentar o número de turmas e a contratação de professores, se necessário.
O director da Correia Mateus assegura que a escola já está preparada para receber alguns desses alunos. “Elaborámos um plano que contempla duas horas por dia de Português e Inglês para ajudar na integração e terão as restantes disciplinas com as turmas”, avança.
No AE de Marrazes estão a ser identificadas as escolas que poderão dar essa resposta, em articulação com o município, com a preocupação de evitar a “dispersão” desses alunos.
Na Maceira, há já duas famílias refugiadas da Ucrânia instaladas, com jovens dos 10 aos 15 anos, que foram alojadas no bairro da cimenteira. “Ainda não estão na escola, mas estamos prontos a recebê-los”, assegura o director do agrupamento, frisando que a integração escolar das crianças e jovens refugiados da Ucrânia será avaliada “caso a caso”. “Vamos fazer o diagnóstico e tentar perceber como os vamos incluir num estudo mais direccionado para a sua língua e continuidade das aprendizagens dentro do seu grupo”, conclui.