Os designers ainda são aquelas pessoas que os empresários das PME tentam descartar sempre que possível?
Ana Prates – Acho que cada vez mais os empresários começam a ter a noção que os designers são uma mais-valia na empresa e no desenvolvimento de produto.
Pedro Mendes – Este é um evento de design e engenharia de produto, duas áreas complementares. E o que pretendemos mostrar é que vale a pena as empresas apostarem, porque estão a criar produto de valor acrescentado e é bom para a sustentabilidade de uma série de factores: do know-how, do saber tradicional, do saber tecnológico.
A indústria da região tem sabido incorporar o design para se afirmar junto dos clientes e dos mercados internacionais?
Pedro Mendes – Sim. Muitas vezes as empresas são meramente produtoras, mas precisam de pessoal especializado, ao nível da engenharia e do design, para compreender o projecto e conseguir materializá-lo. É o mais vulgar. Depois há outras empresas com produto próprio, com design próprio, engenharia, processos, tecnologia, que começam a afirmar-se no mercado.
Ana Prates – E percebem que o design acaba por ser uma peça importante.
Pedro Mendes – E mais do que isso, começam a aparecer novos criativos que se lançam no mercado com produto exclusivo deles. É um registo mais independente, de que temos cá também alguns exemplos.
Ana Prates – Queremos também levar o público a perceber que muitas vezes tem já uma peça de design em casa sem o saber. Não tem que ser uma coisa conceptual, uma coisa estranha, para ter design.
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No design, qual é o teste do algodão que mostra que o projecto atingiu os objectivos?
Ana Prates – Responder a uma necessidade.
Pedro Mendes – Resolver um problema, da melhor forma possível. E aí tem as componentes estética, funcional, económica, seja o que for. Nós, por exemplo, temos cá [no Leiria Design] máquinas de cáfe, uma máquina de cortar relva, ou seja, produtos do dia a dia. Acreditamos que a pluralidade e a diversidade é que enriquecem o todo, em vez de estarmos agarrados a um determinado registo estético.
O que é que justifica organizar um evento como o Leiria Design?
Ana Prates – A promoção e afirmação do design junto da população.
Pedro Mendes – Faz todo o sentido. As coisas são desenvolvidas cá, são produzidas cá e depois é preciso apresentar – e em Portugal tem que se ir para Lisboa ou Porto. E não é necessário fazer sempre isso. Podemos criar cá e apresentar cá, é mais fácil.
Ana Prates – Tentámos tocar em várias áreas: vidro, moldes, plásticos, cerâmica.
Pedro Mendes – Temos um conjunto de factores que são únicos no contexto nacional e é preciso valorizá-los.
Como é que vai ser o corpo e o conceito do evento?
Ana Prates – Focámo-nos no produto e tentámos perceber como é que ele nasceu: quem é que o desenhou? Quem é que o produziu? E fizemos a selecção a partir dessa premissa, de aproximadamente 50 a 60 peças. Depois há actividades paralelas, que serão os diálogos sobre produto, com 14 oradores, sábado e domingo, e a oficina 3D, que vai ter workshops pré-programados e com horário definido, que necessitam de inscrição, e outros abertos à comunidade. Também vamos ter um mini-bus que vai sair daqui e visitar duas a três empresas da região. E as oficinas criativas para a família, no domingo.
Também existem exemplos na região que pegam nas artes tradicionais e contribuem com o design para as preservar e valorizar?
Ana Prates – Tem acontecido, também aqui na região de Leiria, começa-se a valorizar mais os ofícios tradicionais, cada vez mais há a necessidade de perceber como é que se consegue chegar a um determinado resultado.
Pedro Mendes – Os projectos novos são todos basicamente dentro desse registo. São designers, são criativos, que pegaram na matéria e a transformaram com uma visão diferente da normal. Mas as técnicas são as tradicionais.
Leiria tem aproveitado o facto de estar tão perto de uma escola como a Escola Superior de Artes e Design (ESAD) de Caldas da Rainha?
Pedro Mendes – Acho que ainda não aproveitou, daí a necessidade deste tipo de mostra, para promover e incentivar a comunicação entre as várias entidades. É esse o nosso objectivo. Faltam pontes entre as empresas e o ensino, mas esse é o registo nacional em tudo. A parte académica está muito distante da parte empresarial e do próprio Estado, que acaba por muitas vezes não aproveitar o conhecimento que tem nas suas instituições de ensino. É uma realidade nacional, não é uma realidade [exclusiva] de Leiria. No IPL, a engenharia já tem desenvolvido muitos projectos com a indústria, já começa a funcionar, nós estamos a dar mais um empurrão, mas ainda estamos muito longe de um registo em que todas as entidades comuniquem bem e se aproveite o conhecimento que cada uma tem, seja o potencial privado ou do Estado. Foi uma das necessidades que identificámos e fizemos a mostra também por causa disso.
Já podemos falar em Leiria Design, já existe o evento, também podemos falar em design de Leiria, como identidade?
Pedro Mendes – Já começam a aparecer casos pontuais, de alguns eventos nas Caldas da Rainha, mais concentrados na área da cerâmica. E nós estamos a tentar relacionar tudo.
Ana Prates – Para que seja fortalecida essa identidade.
Pedro Mendes – É uma coisa que se constrói ao longo dos anos. Em conjunto. Não individualmente.
Leiria Design começa a 14 de Setembro
Ana Prates e Pedro Mendes, ambos designers, integram a equipa que organiza a primeira edição do Leiria Design, um evento de quatro dias, com foco no design e na engenharia de produto, que decorre entre 14 e 17 de Setembro no antigo edifício da EDP, na esquina da Rua de Tomar com a ponte Hintze Ribeiro, em Leiria.
Afirmar o design junto da população é o objectivo principal do Leiria Design, que está a aceitar inscrições para oficinas e workshosps abertos à comunidade. A mostra reúne 50 objectos de vários autores e empresas, todos com raízes na região. Pretende constituir uma selecção de projectos considerados representativos do design contemporâneo e emergentes, através de produtos criados, desenvolvidos ou produzidos no distrito de Leiria.
A inauguração acontece quinta-feira, 14, pelas 20 horas. Na sexta-feira, há visitas a empresas com partida em autocarro desde a Rua de Tomar. Depois, os diálogos sobre produto trazem 14 oradores a Leiria, sábado e domingo, para uma série de conversas com criadores, arquitectos e outros especialistas ligados à incorporação do design no processo produtivo.
Destaque também para a oficina 3D, um laboratório de fabricação digital a três dimensões, que se desdobra em workshops técnicos, com programas pré-definidos e sujeitos a inscrição prévia, mas também sessões de acesso livre. É neste espírito que se enquadram as oficinas criativas para a família, a realizar no domingo.