Ser professor é uma missão para a maioria. Conseguir dar aulas perto de casa é uma tarefa quase impossível para muitos, sobretudo, para os que integram grupos disciplinares onde o número de horas tem vindo a encolher. O concurso do Ministério da Educação para integrar os quadros de uma escola só se faz de quatro em quatro anos, o que ainda torna mais difícil aos docentes conseguirem um lugar perto da sua residência oficial.
Ana Catarina Branco é docente desde 2000. Há cerca de duas décadas que saltita de escola em escola. Aos 47 anos, a professora conseguiu finalmente ficar colocada no Agrupamento de Escolas Domingos Sequeira, em Leiria, de onde é natural.
Professora de Educação Física, entrou para o Quadro de Zona Pedagógica (QZP) em Lisboa, mas no Grupo do 1.º ciclo do Ensino Básico, para o qual também tem qualificação profissional. Rapidamente percebeu que neste grupo disciplinar dificilmente conseguiria aproximar-se de casa. Passou para o 1.º ciclo e especializou-se depois em educação especial. Foi neste grupo que conseguiu, através da mobilidade estatutária, dar aulas no distrito de Leiria. “Desde pequena que o meu sonho era ser professora de educação física. Tive uma lesão grave e sujeitei-me a uma intervenção cirúrgica para seguir a profissão e o meu sonho”, conta.
Mas, no estágio, “enquanto tirava o curso de Educação Física, na disciplina de Natação, trabalhava com deficientes profundos” e percebeu a sua “vocação para trabalhar nesta área”. “Tirei depois a especialização e estou feliz na educação especial, mas para conseguir efectivar tive de [LER_MAIS]mudar o rumo da minha vida”, revela a docente.
Ficou colocada no último concurso em Quadro de Agrupamento numa escola em Lisboa em Educação Especial, nunca poderia concorrer em primeira prioridade para o Grupo de Educação Física, uma “injustiça” do concurso do Ministério da Educação. “Os contratados podem concorrer a dois grupos ou mais Grupos de Recrutamento e eu, por ser do quadro só podia concorrer a um”, lamenta.
Ao longo dos anos viu professores contratados, com menos anos de carreira, passarem-lhe à frente e foi ficando amarrada à escola onde vinculou, sendo impedida de se aproximar de casa. “Para concorrer em primeira prioridade teria que optar por concorrer ao grupo de recrutamento onde me encontrava vinculada. Esta é uma reivindicação que temos feito. Todos os docentes deveriam ser colocados por anos de serviço numa lista graduada e o concurso deveria ser feito anualmente e todos os docentes deveriam poder concorrer a todos os grupos de recrutamento para o qual possuem habilitações, de forma a evitar injustiças”, explica.
Inês Santo tem estado nos últimos 13 anos no Arquipélago dos Açores, onde deu aulas em cinco das nove ilhas. Docente há 18 anos efectivou agora na Escola Básica 2, 3 de Marrazes, em Leiria, podendo ficar junto da família. Com 42 anos, o seu percurso começou por Lisboa e Alentejo.
Professora de Educação Física vinculou nos Açores e por lá ficou. “A ideia era ter ficado um ano e depois regressar. Tinha uma relação estável e seria para casar”, revela.
Entre vários ‘ingredientes’, a distância terá sido um dos que contribuiu para o fim do namoro e Inês Santo acabou por não regressar, mas as saudades, sobretudo dos sobrinhos, foram aumentando, situação que a pandemia fez sobressair. “Inicialmente concorri para saber em que lugar estava e até acabei por desistir do concurso, porque sabia que não teria hipóteses, porque é uma zona muito procurada. Pelos vistos, não anulei bem o processo e acabei por ficar colocadaem Leiria”, conta Inês Santo, satisfeita com o resultado.
Para a docente, este é um “bom momento para regressar a casa”. “Estou a precisar do carinho e do ninho familiar. A pandemia faz- -nos pensar em quem nos é mais próximo e que podemos perder a qualquer momento.” Ser professor “é muito duro”, sobretudo, “para quem é agarrado à família” ou para casais e cada um “vai para o seu lado”. “É muito desgastante toda a instabilidade”, lamenta.
Apesar de ter 51 anos e 28 anos de carreira, Arne Bossen continua sem conseguir aproximar-se de Leiria. Docente de Educação Visual e Tecnológica, vinculou no QZP de Lisboa. “O mais que me aproximei foi da Lezíria”, relata, ao afirmar que a sua disciplina tem sofrido cortes e muitos professores passaram a ser dispensáveis. Quadro de uma escola na Póvoa de Santa Iria, desde 1997, tem passado por vários estabelecimentos de ensino desde o Alentejo ao distrito de Leiria. “Nunca dei aulas lá, mas também nunca consegui sair”, lamenta. Este ano decidiu pedir mobilidade por doença. Atleta de alta competição durante vários anos, o basquetebol deixou-lhe mazelas para a vida. “Nunca antes me tinha passado pela cabeça exercer esse direito. Mas, percebi que me ia reformar sem nunca ficar perto de casa e que esta era a possibilidade que tinha. Depois de garantida a mobilidade por doença, terei de a renovar anualmente”, explica. Arne Bossen vai agora dar aulas na EB 2,3 D. Dinis, escola onde estudou