Já no passado mês de Junho, também em Espanha, a efígie de São Jorge, exposta na igreja de Estella, em Navarra, sofreu o mesmo género de "restauro” por iniciativa de uma professora da localidade.
Por cá, é um painel de azulejos que está a fazer acender a polémica em Ansião. Há munícipes que contestam a substituição da obra com mais de 80 anos, por uma réplica, réplica essa que mantém a data dos azulejos originais, 1937, e que até tem uma inscrição sobre o restauro, de 2018.
Leonel Antunes, munícipe e um dos maiores contestatários desta troca, explica ao JORNAL DE LEIRIA que “é como se o quadro original da Mona Lisa fosse destruído para dar lugar a um poster A4 com um rosto parecido”.
Para o munícipe, não se trata de restauro nenhum e frisa: “manter a data de 1937 é enganador para quem não conhece Ansião e desonesto para quem daqui é. Isto é de 2018 e envergonha o original”.
Leonel Antunes informa que o antigo painel de azulejos, que estava numa propriedade privada, retratava uma das cenas mais importantes de Ansião, circunstância que terá sido a responsável pelo nome da localidade. Trata-se da representação da Rainha Santa Isabel, que ao passar por ali, terá dado esmola a um ancião.
O munícipe salienta que, no estado de conservação em que se encontravam os azulejos originais, não era necessário intervir no painel, uma obra que tinha “valor”, não só pela sua “antiguidade”, mas também por ser uma “referência” para a população. Uma vez que “o original foi deliberadamente destruído”, trata- se de um acto “criminoso”, acrescenta Leonel Antunes.
Opinião bem diferente tem António Domingues, presidente da Câmara de Ansião, que tomou a iniciativa de trocar os azulejos. O autarca explica que a intervenção decorreu no âmbito da requalificação daquela zona, denominada Fundo da Rua.
Sublinha que o painel original [LER_MAIS] estava destruído e que, segundo o técnico que avaliou a obra, nada garantia que os antigos azulejos resistissem a uma recolocação. E assim, como estava, o painel não “dignificava” a zona que se pretendia requalificar.
O autarca reconhece o “valor sentimental” do painel para a população, obra que “é um ícone de Ansião”, e diz que, por isso mesmo, foi pensada uma solução que mantivesse aquela figura. “A solução foi reproduzir o original”, aponta.
E, embora o painel estivesse embutido numa parede privada, António Domingues realça que os proprietários foram avisados. Recorda ainda que, embora a obra tenha sido executada por iniciativa de um privado, em 1937, foi a Câmara que nessa altura pagou o trabalho. O JORNAL DE LEIRIA sabe que a Polícia Judiciária já está acompanhar o caso.
O que diz a Lei?
Quanto ao enquadramento legal, recorde- se que, resultado da pressão exercida pelo Projecto SOS Azulejo junto das autoridades competentes, foi publicada no ano passado a lei 79/2017 de 18 de Agosto, uma lei que corresponde à 13.ª alteração ao regime urbanístico.
Na prática, a lei interdita a demolição de fachadas azulejadas ou remoção de azulejos das mesmas sem a devida autorização da câmara municipal. Isto, salvo os casos em que a câmara observe que o trabalho em causa é de diminuto valor patrimonial.
Em Julho de 2017, foi também publicada uma resolução da Assembleia da República, que recomenda ao Governo a protecção e a valorização do património azulejado português.
De acordo com informação avançada no site do Projecto SOS Azulejo, o que a lei n.º 79/2017 traz de novo é a interdição de demolição das fachadas revestidas a azulejo ou a sua remoção definitiva, “salvo em casos devidamente justificados, autorizados pela câmara municipal, em razão da ausência ou diminuto valor patrimonial relevante destes.”
1937
O painel de azulejos data de 1937 e encontrava-se instalado numa propriedade privada. O painel retratava uma representação da Rainha Santa Isabel que, ao passar por ali, terá dado esmola a um ancião