De tudo o que envolveu a tragédia do incêndio de Pedrógão, houve pelo menos um aspeto positivo: a enorme onda de solidariedade espontânea dos portugueses.
De norte a sul, os portugueses, de forma individual ou de forma mais organizada, procuraram ajudar a minimizar a dor daqueles que perderam os seus bens e os seus familiares em resultado dos incêndios.
Foram milhões de euros de donativos que mostram bem a solidariedade e o sentimento de entreajuda que caracterizam o povo português.
Face à gravidade de tudo o que aconteceu, em especial à triste circunstância de termos nesse incêndio assistido à morte de 66 pessoas, seria expectável que fossem canalizadas estas verbas para a ajuda à reconstrução de casas de primeira habitação.
Ou seja, fossem canalizadas para aqueles cuja vida foi súbita e repentinamente afetada pelos incêndios. Mas não.
Já tínhamos alertado para a enorme confusão e atraso na reconstrução, para a discricionariedade das reconstruções, para a divergência do número de casas ardidas referido pelo Governo ou constante no Fundo Revita, mas o pior foi tornado público a semana passada.
Terão existido casas reconstruídas de pessoas [LER_MAIS] que não tinham a sua residência permanente na zona afetada à data dos incêndios. Por outro lado, há casas de pessoas que efetivamente foram afetadas pelos incêndios e que eram de primeira habitação que continuam exatamente como o fogo as deixou.
Além do chique-espertismo abjeto em torno da tragédia humana do que se passou em Pedrógão, é particularmente grave este episódio. Porque abala a confiança que as pessoas têm nas instituições – recorde-se que há suspeitas de que tenha havido compadrio político local nestas situações, nas pessoas e na sociedade em geral.
Aliás, a onda de solidariedade que se gerou em outubro foi bem menor do que nos incêndios de junho, a que não será certamente alheio o facto de nessa altura existirem já muitas dúvidas quanto à forma como foram utilizadas as ajudas e os donativos entregues quatro meses antes.
Importa referir que este tipo de postura e de mentalidade é transversal à sociedade portuguesa e só se combate desde muito cedo na vida de cada um de nós.
Com uma cultura de maior exigência, de intolerância face a situações de injustiça ou de corrupção, fazendo de nós também coletivamente melhores. E isto faz-se através da Educação. Porque infelizmente as mentalidades não se mudam por decreto.
*Deputada do PSD
Texto escrito de acordo com a nova ortografia