Dois anos após o início do conflito – a invasão da Ucrânia pela Rússia aconteceu a 24 de Fevereiro de 2022 – e poucas ou nenhumas perspectivas de paz no horizonte, há outra data a preocupar a comunidade ucraniana acolhida em Portugal: o prazo da autorização temporária de residência, que expira já no próximo dia 1 de Março.
Yuliya Hryhoryeva, do núcleo em Leiria da associação Spilka, lembra que o documento é necessário, por exemplo, para a celebração de contratos de trabalho e são conhecidas situações de empresas que ameaçaram despedir os colaboradores se não apresentarem a renovação. O assunto tem vindo a gerar “desconforto” e “não está bem esclarecido”, considera. Além de não se encontrarem disponíveis indicações seguras sobre o que vai acontecer, a situação do antigo SEF, a que sucedeu a Agência para a Integração, Migrações e Asilo, não ajuda, continuando a existir relatos de “muitos atrasos” e “dificuldades” no processo de legalização.
Outro tema que afecta a população instalada em Portugal depois de rebentar a guerra é o da habitação, devido aos valores “astronómicos” das rendas relativamente aos salários “que ganham”, aponta Yuliya Hryhoryeva. “Na maioria das vezes, é uma mãe com crianças e [só] com um ordenado é muito difícil”, explica. Algumas pessoas “recebem ajuda da câmara”, de acordo com as regras previstas no sistema de apoios para habitantes do concelho, sejam estrangeiros ou portugueses, noutros casos “vivem duas famílias na mesma casa”.
Volvidos dois anos, no entanto, a principal preocupação, segundo a dirigente da associação com âmbito nacional que em Portugal representa os cidadãos ucranianos, é mesmo o prolongamento das operações militares. “Tinha esperança que estivéssemos numa posição melhor, mas vejo que não, estamos numa situação pior e temos muitas perdas, já morreu muita gente”, diz ao JORNAL DE LEIRIA. “É muito triste ver que o mundo continua a fazer negócio com a Rússia”. Yuliya Hryhoryeva fala de uma realidade “violenta” na Ucrânia, com “pouca gente para combater” e, no plano da política internacional, “soluções que não funcionam”.
Por cá, “a maioria” conseguiu emprego e o “reagrupamento familiar” tem sido possível, com diferentes agregados a receberem “os pais, avós, sobrinhos ou netos”. No ensino, “todos ficaram inseridos”, porém, há encarregados de educação “que optaram por a criança estudar online na escola ucraniana”. Já no nível pré-escolar, “não é a mesma coisa, é mais difícil” obter vaga, avalia.
Só pelo centro de acolhimento que o Município de Leiria colocou a funcionar no estádio municipal, entretanto desactivado, terão passado, segundo Yuliya Hryhoryeva, aproximadamente 300 famílias, que, em algum momento, entraram em contacto com a associação Spilka. Destas, “a maioria ficou” em Portugal, “uma parte regressou” à origem e “uma outra pequena parte emigrou para outro país”. Alguns “gostariam de voltar [à Ucrânia] mas não podem porque a casa fica na linha da frente e é perigoso”, outros “querem ficar porque gostaram do clima e arranjaram emprego”.