Alunos de máscara, gel desinfectante espalhado pela escola e circuitos bem definidos são algumas das diferenças que os alunos vão encontrar quando regressarem à escola, a maioria no dia 17 de Setembro.
A pandemia da Covid-19 obrigou os directores areinventar a escola e a garantir segurança máxima para toda a comunidade educativa. O risco não é zero, mas todos estão empenhados em minimizá-lo ao máximo.
Intervalos mais curtos, aulas a começar mais cedo e a terminar mais tarde e cantinas com serviço de take away são algumas das mudanças previstaspara o próximo ano lectivo.
No entanto, a pouco mais de duas semanas do início das aulas, previstas para começar entre 14 e 17 de Setembro, ainda há muitas dúvidas no ar.
Os directores das escolas aguardam mais orientações do Ministério daEducação e da Direcção-Geral da Saúde (DGS) para tomarem decisões sobre a prática de desporto, por exemplo.
A Educação Física, uma disciplina que exige contacto, poderá ter de abolir alguns desportos colectivos.
Na segunda-feira, Graça Freitas, directora-geral da DGS, garantiu que as escolas não vão fechar sempre que surgir um caso suspeito.
“O referencial para as escolas estará concluído no dia 7 e prevê uma facilidade comunicacional entre as escolas, os pais e a saúde para que, se aparecer um caso suspeito ou positivo na escola, se saiba quem telefona a quem e qual deve ser a actuação a ter”, salientou a responsável na habitual conferência de imprensa.
Graça Freitas sublinha que se pretende que a actuação das escolas “seja direccionada e focada e não expandida a toda a escola, de modo a perturbar o mínimo possível e a garantira segurança”.
[LER_MAIS]Esse é também o entendimento dos responsáveis dos estabelecimentos de ensino, que estão a preparar o funcionamento da escola de forma a criar ‘bolhas’. Ou seja, os grupos de alunos mantêm-se sempre os mesmos, evitando ao máximo o contacto entre si.
Assim, se surgir um caso suspeito ou até mesmo positivo é mais fácil isolar o grupo e restringi-lo a uma quarentena. Ao início desta semana, as escolas com quem o JORNAL DE LEIRIA falou já tinham a base dos seus planos de funcionamento preparada, estando a ultimar pequenos ajustes e cenários possíveis.
O pânico é um dos receios de quem lidera as escolas num contexto de pandemia, nunca antes vivido por nenhum dos responsáveis. Por isso, Graça Freitas apela ao bom senso de todos, nomeadamente dos pais.
“Tem de haver uma atitude muito pedagógica da parte das escolas junto dos pais, para que entendam que as situações são diferentes e há que manter alguma calma perante um caso suspeito e não ter pânico nem a tendência de querer encerrar uma escola com milhares ou centenas de alunos.”
Depois de um final de ano em que os alunos e professores experimentaram o ensino à distância, o novo ano lectivo começa presencialmente. Aliás, este é o plano A do Ministério da Educação, que pretende que se mantenha até ao final dos três períodos, sendo que a qualquer momento poder-se-á passar para um modelo de ensino misto ou à distância.
As escolas tiveram de ser imaginativas para encontrar as melhores soluções para acolher as centenas de alunos – que terão o mesmo horário curricular – garantindo-lhes a máxima segurança sanitária.
O uso de máscara é obrigatório e a higienização das mãos terá de ser frequente, à semelhança do que já sucedeu no regresso às aulas em Junho para os alunos que efectuaram exames nacionais.
Entradas e saídas a horas diferentes, refeições e intervalos desfasados e circuitos previamente estabelecidos são algumas das normas adoptadas pelas escolas, que encontram na falta de salas e no seu tamanho um dos problemas quase impossível de ultrapassar.
Na Escola Secundária Afonso Lopes Vieira (ESALV), em Leiria, o 3.º ciclo vai funcionar essencialmente durante o período da manhã, recorrendo-se a algumas horas da tarde em determinados dias, tendo em conta a carga horária, explica a directora, Celeste Frazão.
Os alunos do secundário terão aulas da parte da tarde. A excepção são os alunos que integram a Unidade de Apoio ao Alto Rendimento na Escolas, entre os quais os estudantes do Conservatório Internacional de Ballet e Dança Annarella Sanchez, e do ensino profissional, que terão aulas durante todo o dia.
“Vamos fixar uma turma numa única sala, dentro do possível. Não conseguimos mudar totalmente os tempos de entrada e saída dos alunos por causa do horário dos autocarros, mas faremos pequenos ajustamentos”, explica Celeste Frazão.
Na ESALV haverá sempre um intervalo de 10 minutos de manhã e outro à tarde. “Ainda não sabemos se mantemos os alunos dentro da sala ou se encontramos uma maneira de virem à rua mantendo o distanciamento”, afirma a docente, que revela que as pausas serão desfasadas para impedir ajuntamentos.
Além da falta de salas e destas terem uma dimensão pequena para garantir a distância de, pelo menos, um metro por aluno, Celeste Frazão enfrenta a falta de assistentes operacionais. “Perdemos agora três e ainda vai demorar algum tempo a chegar o reforço.”
O refeitório funcionará preferencialmente no regime take away. “Temos de ver onde vão comer os alunos. Com o tempo bom podem ficar cá fora, mas quando começar a chover teremos de encontrar uma alternativa”, confessa.
Nesta escola, haverá também circuitos de entrada e saída e está a ser estudado um plano B.
“Na quinta-feira [hoje] vamos ter reunião com o Conselho Pedagógico para preparar um cenário de ensino misto. Poder-se-á colocar metade da turma presencialmente e a restante a assistir às aulas em casa em directo. Desafio os directores das outras escolas para um encontro, para podermos discutir ideias e partilhar sugestões.”
“É tudo uma grande incógnita. Esperamos que não seja preciso o plano C, porque as aulas à distância não são o desejável. Já tivemos uma reunião com a delegada de saúde e se houver um caso positivo não haverá encerramento da escola. Como os alunos estão divididos em grupos será mais fácil controlar”, revela Celeste Frazão.
A directora admite, contudo, estar apreensiva com o desenrolar do ano lectivo, até porque a escola terá sempre cerca de 800 alunos em cada turno.
As aulas na ESALV iniciam-se no dia 17. Antes haverá a recepção aos alunos, que não terá a tradicional reunião geral. Cada aluno receberá um kit de protecção, mas a máscara será reutilizável.
Mais aulas e menos férias
Os alunos vão ter mais dias de aulas e menos dias de férias no próximo ano lectivo. A pausa lectiva da Páscoa é encurtada e a duração do ano lectivo será prolongada.
No Agrupamento de Escolas (AE) de Pombal as medidas não serão muito diferentes. Fernando Mota também organizou os horários por forma a dividir as turmas entre aulas de manhã e à tarde. O director do AE de Pombal afirma que, além do uso obrigatório de máscara em todos os espaços, haverá um controlo nas idas ao refeitório, que terá um horário alargado para evitar ajuntamentos.
“As nossas salas são de mesas com dois lugares, pelo que o distanciamento de um metro ou metro e meio está fora de questão”, lamenta, ao afirmar que estão a criar circuitos.
De manhã e à tarde está previsto um intervalo de dez minutos e os horários de entrada e de saída do início das aulas sofreram alterações. “Antes entrava- se às 8:25 e agora será às 8:10 horas. A saída será às 18 horas, dez minutos depois do habitual”, conta.
Este novo horário foi articulado com o Município de Pombal para garantir os transportes públicos aos alunos.
Com a indefinição sobre a evolução da pandemia, Fernando Mota vai fazer o levantamento, logo na primeira semana, das necessidades informáticas dos alunos. O director considera ainda que se tiver de transmitir aulas em directo isso vai implicar um investimento “que não devem ser as escolas a suportar”.
“O ideal seria o Ministério avançar.”
Em Pombal os balneários vão ser utilizados por menos estudantes, desfasando os horários da disciplina. “O principal objectivo é manter os grupos isolados uns dos outros e vamos alertar a comunidade escolar que se alguém tiver febre não deve vir à escola, nem medicamentado”, sublinha.
O início das aulas está marcado para o dia 17 e os cursos profissionais vão já arrancar com os estágios, “pelo menos uma vez por semana”.
Alunos separados por anos
No Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus, em Leiria, os alunos vão ter circuitos, salas e espaços de recreio autónomos, consoante os anos de escolaridade. Jorge Dias, director do AE, garante que os intervalos grandes da manhã e da tarde manter-se-ão, mas os horários lectivos foram desdobrados, pelos 5.º e 6.º anos, 7.º ano, e 8.º e 9.º.
“Há uma sala específica para cada turma e definimos percursos e espaços de recreio por anos lectivos. O buffet não vai funcionar e o refeitório vai ser limitado a cerca de 200 refeições, com turnos de meia em meia hora”, revela Jorge Dias.
Se durante o tempo seco será possível manter os estudantes nos espaços exteriores, o director terá um novo desafio quando a chuva chegar. “Ainda teremos de ver como vamos manter os alunos dentro do edifício, com as distâncias asseguradas.”
Dentro do edifício há marcações específicas para cada ano lectivo, evitando que os alunos se cruzem.
Também na Correia Mateus o distanciamento social dentro das salas de aula é impossível de cumprir. “Temos mesas duplas e turmas de 25 a 26 alunos.” Se antes já existia falta de assistentes operacionais no agrupamento, neste contexto, “ainda é mais necessário”.
“Vamos mobilizar os recursos para a limpeza e higienização dos espaços. Vão faltar pessoas para a vigilância”, assume o director.
É a incerteza do futuro que deixa Jorge Dias apreensivo e expectante. “Vamos começar no formato presencial, mas não sabemos se iremos mudar uma turma ou um ano de escolaridade para o ensino à distância, obrigando-nos a coordenar o ensino presencial e à distância. Há uma grande dificuldade em prever o funcionamento da escola, o que nos preocupa.”
Os alunos e a escola que os jovens vão ter é também uma preocupação para o director. “As regras, os intervalos que não vão ter, os espaços condicionados e os horários de almoço… tudo vai impedir a partilha que existia entre os estudantes e os seus momentos de descontracção. São situações que podem causar stress nos alunos”, alerta.
Os professores também vêem os seus tempos de pausa limitados. “Os alunos não mudam de sala, mas os professores sim. Na maioria das vezes não terão intervalo, porque esse é o tempo para trocarem de sala.”
No AE Correia Mateus, a Educação Física vai “privilegiar os desportos individuais” e a “condição física”.
“Esperamos mais orientações do Ministério, mas vamos ajustar os horários para que só haja uma turma no pavilhão e outra no espaço exterior”, disse o director ao JORNAL DE LEIRIA esta segunda-feira (o Ministério da Educação divulgou orientações na terça ao fim do dia).
No pré-escolar e no 1.º ciclo as regras estão também definidas e vão dar continuidade ao plano que foi aplicado em Junho, quando as crianças mais pequenas regressaram.
“A diferença é que tínhamos 30% das crianças e agora vão estar todas.”
A unidade de multideficiência que está no agrupamento vai manter o seu funcionamento normal, com um reforço da higienização.
Jorge Dias considera que “as escolas são um dos lugares mais seguros”, mas admite que “possam surgir casos”, que terão de “ser acompanhados com serenidade”.
Necessidades educativas
Pais preocupados com regresso
Os pais de alunos com necessidades educativas especiais (NEE) estão preocupados com o regresso às aulas presenciais, tendo em conta a falta de recursos.
No documento Orientações para a recuperação e consolidação das aprendizagens, produzido pelo Ministério da Educação, não há qualquer indicação para os alunos com NEE.
Em Julho, um grupo de pais juntou-se à porta do Ministério da Educação para denunciar a falta de condições necessárias para apoiar estes alunos no próximo ano lectivo.
Alexandra Sousa, mãe de um jovem com síndrome de asperger, admite ao JORNAL DE LEIRIA que o regresso à escola “é bom”, mas está apreensiva devido à falta de recursos humanos.
“Estes alunos têm menos responsabilidade e não há auxiliares que cheguem para os controlar. O meu filho como tem muito medo usa sempre máscara, mas na escola o contexto é outro”, refere esta mãe.
Durante o confinamento, Alexandra Sousa lamenta que as aprendizagens tenham sido poucas ou nenhumas. “É preciso haver uma recuperação das matérias.”