Tumores do pulmão, cólon e recto, próstata, estômago e mama são os cancros mais comuns e mais mortais em Portugal e, como tal, são também aqueles que o Centro Hospitalar de Leiria (CHL) trata com mais frequência, dando resposta a “quase 90%” das situações oncológicas que diagnostica.
Sem tratamento na região estão ainda tumores ao nível ginecológico e da hematologia (sangue) e casos “muito específicos” de outras especialidades.
“Tratamos as patologias mais frequentes e prevalentes. Quase 90% das situações oncológicas que diagnosticamos são aqui tratadas”, revela Alcina Ponte, directora do Hospital de Dia e do Serviço de Medicina Interna do CHL.
A médica explica que as situações que não podem ser tratadas em Leiria se devem essencialmente ao “défice de especialistas”. É o que acontece, por exemplo, com a hematologia. “Já tivemos, mas como presentemente não existe nenhum hematologista, não conseguimos dar resposta a esse nível”, refere.
Se em algumas áreas a falta de especialistas obriga os doentes a procurar resposta noutras regiões, nomeadamente em Coimbra, outras há em que o CHL é considerado uma “referência”. A instituição está, desde 2016, reconhecida como centro de referência para a área de oncologia de adultos no cancro hepato-biliopancreático (pâncreas, fígado e vias biliares) e do cólon e recto.
“Significa que as várias especialidades médicas envolvidas no tratamento da doença, desde a cirurgia, anatomia patológica, anestesiologia, gastrenterologia, oncologia médica até à radioterapia, oferecem ao doente um tratamento de acordo com as normas internacionais de melhor excelência, incluindo o timing óptimo, desde o diagnóstico e avaliação em reunião multidisciplinar até ao tratamento”, explica a oncologista Cristina Pissarro.
Além da “diferenciação dos elementos da equipa”, a classificação de um centro de referência reconheceu também a “capacidade técnica e tecnológica” do CHL no tratamento daqueles cancros.
“É centro de referência o serviço, departamento ou unidade de saúde reconhecido como o expoente mais elevado de competências na prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade, em situações clínicas que exigem uma concentração de recursos técnicos e tecnológicos altamente diferenciados, de conhecimento e experiência, devido à baixa prevalência da doença, à complexidade no seu diagnóstico ou tratamento e/ou aos custos elevados da mesma”, explica o portal do Serviço Nacional de Saúde.
No caso do cancro do fígado, pâncreas e vias biliares, o reconhecimento como centro de referência foi o “culminar de uma prática continuada e persistente de cirurgia”, dirigida “sobretudo para a área oncológica, iniciada há mais de 20 anos”, pode ler-se num artigo publicado, na última edição da revista do CHL, datada de Outubro, onde é sublinhada a importância da criação de equipas saúde especialmente dedicadas a esta patologia.
[LER_MAIS] Em 2015 foi constituída a Unidade Funcional de Cirurgia Bilio- Pancreática, que recebe anualmente “cerca de 60 a 70 novos casos” deste tipo de cancro, “tendo- -se verificado um aumento exponencial do número de casos tratados”.
Ao nível do cancro do cólon e recto, o CHL regista, em média, cerca de “200 casos por ano, sendo que um terço são neoplasias do recto”, refere aquela publicação.
Vida saudável evitaria um terço dos tumores
Se é verdade que muitos casos de cancro se devem à genética e a mutações aleatórias nos genes, também é verdade que há estilos de vida que favorecem o aparecimento de determinados cancros.
“Existem factores genéticos e ambientais. Mas a investigação produzida mostra que se pode reduzir até um terço os casos de cancro com hábitos de vida saudáveis”, frisa Ana Raimundo, coordenadora do Serviço de Oncologia do Instituto CUF de Oncologia, citada num artigo publicado recentemente no Diário de Notícias, com a médica a referir a alimentação e o tabagismo como dois dos factores “ambientais” que mais impactos têm no combate ao cancro.
“Ter hábitos de vida saudável, com uma alimentação cuidada, exercício físico e evitando maus hábitos, como alcoolismo, tabagismo, consumo de drogas e exposição ao sol a horas impróprias, é a melhor forma de combater o cancro”, acrescenta Cristina Pissarro, oncologista do CHL.
Além da prevenção, que considera “fundamental”, Alcina Ponte aponta o diagnóstico precoce como outro factor “crucial” na luta contra o cancro.
“Poder tratar a doença na sua fase inicial e poder garantir ao doente um tratamento curativo é complemente diferente de apanharmos a doença numa fase mais avançada, em que já não há tratamento curativo, que permita dizer ao doente que está livre de doença, mas antes um tratamento que prolonga a vida”, frisa a directora do Hospital de Dia do CHL, onde os doentes “já chegam com a patologia”. E, muitas vezes, “aparecem com a doença bastante avançada e disseminada”, nota a médica.
“O ideal é que a patologia seja detectada numa fase em que ainda pode ser removida”, reforça Cristina Pissarro, que sublinha a importância de estar atento “aos sinais de alerta” e “aos sintomas diferentes do habitual”, emitidos pelo corpo, e de participar em rastreios.
A título de exemplo, a oncologista refere o programa de rastreio do cancro da mama, no qual a região Centro foi pioneira, “estando comprovado” que nas mulheres diagnosticadas por esta via, “a mortalidade reduziu bastante”.
Portugal no “pelotão” da frente nas taxas de sobrevivência
O último retrato da situação do cancro a nível mundial, um vasto estudo do Global Survival Cancer publicado no início deste mês na revista Lancet e citado pelo jornal Público, coloca Portugal no grupo dos países europeus com melhores taxas de sobrevivência a doenças oncológicas.
Segundo o estudo, na maior parte dos tumores está a aumentar a percentagem de portugueses que sobrevivem. A excepção são, segundo refere o Público, os cancros do cólon, do recto e do estômago, cuja taxa de sobrevivência (cinco anos após o diagnóstico) baixou ligeiramente. No caso do cólon passou de 60,9%, no período entre 2005 e 2009, para 60,3%, entre 2010 e 2014. Nos tumores do estômago, a taxa baixou de 32,4 para 32,2%.
Nos cancros da mama, o estudo revela que, nos últimos cinco anos, 87,6% das mulheres portuguesas afectadas estavam vivas cinco anos após o diagnóstico. A taxa de sobrevivência era de 90,9% nos tumores da próstata, de 15,7% nos do pulmão, de 18,7% nos do fígado, de 10,7% nos do pâncreas e de 83,7% no melanoma.
"São dados que já conhecíamos. Estamos no pelotão da frente, no núcleo de países com maiores taxas de sobrevivência, mas isto não é motivo para adormecermos à sombra da bananeira. A mortalidade no cancro colo-rectal é um pouco maior do que gostaríamos”, reconhece o director do Programa Nacional para as Doenças Oncológicas.
Em declaração ao jornal Público, Nuno Miranda mostra-se ainda particularmente preocupado com o cancro do pulmão, aquele que mais mata em Portugal, sendo que cerca de 90% dos casos “seriam evitáveis, uma vez que estão associados ao tabaco”.
Quanto ao cancro de mama, numa altura em que surgem cerca de seis mil novos casos por ano, a situação está “cada vez melhor”, mas ainda há cerca de 1600 mortes por ano, nota aquele especialista.