Natural de Caldas da Rainha, mas radicado no Canadá há 10 anos, Ricardo Couto é um dos investigadores da Ceapro, empresa de biotecnologia canadiana, envolvidos num projecto que pode conduzir ao desenvolvimento de um fármaco para o tratamento da fibrose pulmonar, a partir de células extraídas da levedura usada na fermentação de cerveja.
Para já, está a ser preparado o lançamento no mercado de um suplemento alimentar que “melhora o sistema imunitário e ajuda a prevenir infecções e fibroses pulmonares”, avança o investigador, revelando que, no médio prazo, a intenção é provar, através de ensaios clínicos, que o produto pode ser usado como fármaco.
“É um processo mais difícil e muito dispendioso. Pelo que, começaremos por lançar um produto nutracêutico [suplemento alimentar]”, adianta Ricardo Couto, formado em Química Aplicada e que é especialista em fluídos super-críticos. “São fluídos com propriedades intermédias entre um gás e um líquido. Têm a densidade de um líquido, mas expandem-se e ocupam todo o espaço disponível como um gás”, explica o investigador, que aponta a descafeinização do café como uma das aplicações mais antigas dos fluídos super-críticos, como o dióxido de carbono.
Segundo o cientista, estas substâncias podem também ser usadas para “limpar o tricloroanisol da cortiça, o composto que dá o ‘sabor a rolha’ ao vinho”, ou para “extrair óleos de diferentes vegetais para consumo alimentar”.
Percurso académico no País
Ricardo Couto nasceu, há 45 anos, na cidade de Caldas da Rainha, onde viveu até aos 18 anos, quando foi estudar para Lisboa. Em criança, ainda sonhou ser arquitecto, mas cedo percebeu que “não tinha muito jeito”. Também gostava de Arqueologia e História. Contudo, quando terminou o 9.º ano, acabou por seguir a área de Ciências e Tecnologia. Nas aulas de Biologia do secundário interessou-se particularmente pelo campo da genética. Só que, em Portugal, “não havia muitas hipóteses” de seguir estudos nessa área.
“Uma opção era ir pela via da Medicina. Acabei por seguir Química Aplicada na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa que, nos últimos dois anos do curso, dava essa possibilidade”, conta. Foi nesta instituição que fez todo o seu percurso académico – licenciatura em Química Aplicada, mestrado em Biotecnologia e doutoramento em Química Sustentável -, e que descobriu e se introduziu no “maravilhoso mundo dos fluídos super-críticos”.
Da universidade para o privado
Com o País mergulhado nas restrições impostas pela troika, Ricardo Couto sentiu que as perspectivas “não eram as melhores” e que devia procurar oportunidades fora de Portugal. Em 2012, concorreu a um pós-doutoramento na Universidade de Bordéus e conseguiu um contrato por um ano. Enquanto trabalhava em França, respondeu a um anúncio para um lugar de pós-doutoramento na Universidade de Alberta, em Edmonton, no Canadá, no laboratório de uma das maiores especialistas mundiais em fluídos super-críticos. Foi seleccionado e acabou por ficar na instituição seis anos (2014 a 2020), dois dos quais como investigador associado.
Em 2020, recebeu um convite para integrar a Ceapro, empresa com a qual já colaborava no âmbito de uma parceria com a universidade. Da experiência de viver fora de Portugal, Ricardo Couto, que é também vice-presidente do Grupo de Químicos no Estrangeiro da Sociedade Portuguesa de Química, aponta como mais marcante o contacto com “múltiplas culturas” em Edmonton. “É uma cidade muito internacional. Há gente de todo o mundo… até canadianos”, ironiza, referindo que esta sua experiência lhe trouxe a constatação de que “a investigação que se faz em Portugal é de nível mundial, com formação que permite aos nossos cientistas estar lado a lado com os melhores”.