Há coisas com que não se brinca – e uma delas é a cornucópia da Alcôa, que segue uma receita com centenas de anos e se tornou instituição na cidade de Alcobaça, mas, também, no universo da doçaria conventual.
Um dos segredos “é ser feita, manualmente, tal como se fazia há cinco séculos atrás, pelas freiras, nos conventos”, explica Paula Alves. Mas, há outros, a começar pela matéria-prima, cuja qualidade é de primeira selecção, sem produtos pasteurizados.
“Partimos os ovos no momento e fazemos o doce de ovos em tacho de cobre, da mesma maneira que elas”, descreve a proprietária da pastelaria instalada junto ao Mosteiro, antes de sublinhar a importância do factor humano. “O amor e o carinho que pomos todos os dias naquilo que fazemos tem muita influência no trabalho final. A mão humana faz a diferença”.
Ou seja, a fábrica não é mais do que “uma cozinha grande”, onde não existem máquinas para dar forma ao doce que é “a imagem de marca” da casa. “A massa é esticada a rolo à mão e tem de ser muito fina para que depois, quando a pessoa come, sinta o crocante. Além disso, ainda hoje é frita em azeite, tal como as freiras fritavam”.
Um processo demorado, que tem um tempo próprio, que é essencial respeitar. Um tacho de cobre com doce de ovos leva quase uma hora a ficar pronto – e é assim que tem de ser.
“Para fazer doces conventuais não pode haver pressa”, realça Paula Alves, que entrou na pastelaria Alcôa em 1983, e, actualmente, em conjunto com o marido e as duas filhas, gere um negócio de referência na divulgação e comercialização de receitas conventuais recuperadas do esquecimento, como é o caso da cornucópia, que tem origem no convento de Cós.
Os ingredientes base são ovos e açúcar para o recheio e farinha, manteiga, ovos, água e sal para a massa exterior. A combinação já tem direito a prémio atribuido no contexto da Mostra Internacional de Doces e Licores Conventuais de Alcobaça.
Na pastelaria original, na Praça 25 de Abril, cada unidade custa 2,55 euros. O preço sobe em Lisboa, nas lojas do Chiado e do Corte Inglés, inauguradas em 2017, desde logo, por causa dos custos de transporte – é que as cornucópias comercializadas em Alcobaça e em Lisboa são produzidas pelas mesmas pessoas, no mesmo local, com o mesmo processo, e seguem diariamente para a capital, por vezes, dependendo da procura, em mais do que uma viagem.
Há só um doce que ameaça a popularidade da cornucópia na Alcôa: a coroa da abadessa, o segundo mais vendido, foi apresentado ao Papa Francisco durante o Centenário das Aparições em Fátima. Mas toda a oferta se destaca pela qualidade. Há um percurso de anos, na recolha e recuperação de receitas conventuais, que se traduz em prestígio e prémios, vários prémios.
“Não queremos mais lojas”, garante Paula Alves. O objectivo é deixar “o trabalho de uma vida” nas mãos da segunda geração e garantir que a Alcôa continua a ser “uma empresa familiar” e “uma marca com tradição e história”.