O projecto de estabilização das arribas, que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) está prestes a iniciar na Nazaré, está a suscitar forte indignação junto da comunidade, que se opõe sobretudo à demolição dos muros no promontório, na zona do Bico da Memória. Avançar com uma providência cautelar contra a intervenção não está fora de questão.
Recorde-se que, em Janeiro, Pimenta Machado, vice-presidente da APA, apresentou na Nazaré o projecto para a estabilização das arribas, um investimento de cerca de 1,7 milhões de euros, para intervir desde o miradouro em frente ao largo de Nossa Senhora da Nazaré até à envolvente da plataforma superior do [LER_MAIS]ascensor. Explicou Pimenta Machado que “a intervenção visa a estabilização das arribas na zona do Sítio e envolvente da plataforma superior do ascensor”, uma “acção preventiva”, que irá actuar em locais “onde os diversos tipos de instabilizações são mais evidentes, garantindo a segurança de pessoas e bens”.
Se a intervenção junto ao ascensor está a ser encarada de forma pacífica, o mesmo não acontece com a obra programada para a zona onde se localiza o miradouro do Largo de Nossa Senhora da Nazaré. Nesta área, anunciou Pimenta Machado, será feita a “remoção de muros existentes” e “criada uma plataforma suspensa no Bico da Memória, onde a observação das praias passa a ser feita, retirando a sobrecarga actualmente existente sobre a arriba”.
Contudo, são várias as vozes que se opõem a esta solução, como ficou explicito durante as I Jornadas do Património da Nazaré, que se realizaram sábado, uma iniciativa organizada pela Associação Marés de Maio, com a Confraria de Nossa Senhora da Nazaré (CNSN) e a Liga dos Amigos da Nazaré. O evento teve precisamente por tema Bico da Memória: Património Identitário da Nazaré e de Portugal. Que Futuro?.
Nuno Batalha, presidente da CNSN, pediu ao presidente de câmara que não permita que tal Confraria da Nazaré pondera interpor providência cautelar contra projecto da APA Comunidade insurge-se contra demolição de muros no promontório “atentado contra o património” seja cometido, exortou a comunidade a mobilizar-se pela causa e não descartou a possibilidade de interpor uma providência cautelar contra a obra, que derrubará um muro com mais de 250 anos, mandado erguer pela Real Casa da Senhora da Nazaré, junto da Ermida da Memória, local de culto que a Confraria tem protegido há oito séculos.
O responsável lamentou o facto de não ter sido ouvida a Confraria neste processo e criticou que a APA, dona da obra, não se tivesse feito representar neste evento onde todos aguardavam esclarecimentos.
Catarina Coelho, subdirectora geral da Direcção-Geral do Património Cultural, informou que também a DGPC se mostrou reticente quanto à substituição de muros de alvenaria por metal, tendo aprovado a intervenção na condição de estes poderem ser pintados. Mostrou-se disponível para reapreciar o projecto, assim as entidades entendam alterá-lo.
“Além de não serem esteticamente agradáveis”, o que mais preocupa João Oliveira Monteiro, historiador, é a relação dos materiais previstos com “maresia e vendavais”.
Em representação do Círio da Prata Grande, João Simões considerou que também os peregrinos se sentem algo “mutilados” com a mudança.
Reforçar o diálogo com a APA, sensibilizando para a alteração deste ponto em concreto pode ser a solução. É preferível do que “extremar posições”, sugeriu o arquitecto José Aguiar, que apelou também à reclassificação da Ermida, para melhor proteger a área envolvente ao monumento considerado de interesse público.
Orlando Rodrigues, vereador com pelouro da Protecção Civil, realçou que a obra é da APA, que entendeu não ser preciso sujeitar o projecto a consulta pública, por considerar que já tudo tinha sido discutido em 2011. Foi nessa altura que o município apresentou à agência um estudo, com várias propostas de intervenção para o local, estudo esse que não foi alvo de contestação nem na câmara nem na Assembleia Municipal, recordou.
Entre o público, António Caria, membro do Movimento Cívico pela Defesa pelo Promontório da Nazaré, sublinhou que ninguém se opõe à intervenção para efeitos de segurança. Mas devem ser apresentados estudos geotécnicos que a sustentem e, se possível, consideradas alternativas.