O frio que se fez sentir no final da tarde de sexta-feira, dia 17, não arrefeceu o entusiasmo de miúdos e graúdos, que se concentraram junto à igreja do Vidigal, ponto de partida para um périplo pelas ruas da aldeia para cantar as Janeiras à população.
À frente, como que a abrir caminho e a estabelecer contacto entre moradores e o grupo, seguia João Vieira, de 68 anos, que vive a cerca de 100 metros da EB1/Jardim de Infância do Vidigal e que é agora, juntamente com a esposa, uma presença regular na escola, apoiando nas saídas de campo como esta.
São, explica o professor Nelson Cardoso, actividades que decorrem no âmbito do Plano de Inovação Pedagógica – Aprender em Comunidade, que o Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus implementou no Vidigal e que tem na comunidade – vizinhos e família – parceiros importantes no processo de aprendizagem, cumprindo o velho provérbio africano, segundo o qual, é preciso uma aldeia para educar uma criança.
No centro do processo estão os alunos, assinala Jorge Dias, director do agrupamento, explicando que são eles que definem “os contextos em que querem desenvolver as aprendizagens”, sob orientação dos professores. “Decidem, em assembleia, se querem trabalhar determinado conteúdo em sala de aula, em saídas de campo ou com algum membro da comunidade”, especifica.
O plano de inovação arrancou no último ano lectivo e trouxe mudanças no processo de aprendizagem, a começar pela organização dos alunos na sala de aula. “Deixou de haver turmas”, com as crianças a serem distribuídas por grupos que, a cada momento, assumem diferentes configurações. “Podem estar os 45 [número de crianças do 1.º ciclo], só os de alguns anos de escolaridade ou apenas de uma ano”, descreve a professora Paula Almeida.
Sem turmas e com carga horária alterada
Também a carga horária das disciplinas sofreu alterações. Português e Matemática, por exemplo, têm apenas, cada uma, quatro horas no horário, em vez das sete previstas no currículo normal. Existe ainda uma hora por semana afecta a Inglês e a Educação Física. “Nas outras 16 horas, trabalham-se, de forma integrada, todas as áreas, que não assumem carácter de disciplina”, esclarece Nelson Cardoso.
Esse trabalho é desenvolvido de diferentes formas, seja através da oficina de aprendizagem, uma hora por dia, durante a qual os alunos procuram aprofundar ou melhorar o que eles e os professores identificam como necessário, ou através dos clubes de ciências experimentais, desafios matemáticos, tertúlias literárias e Eco’art. Há ainda as saídas de campo, realizadas semanalmente, com a participação rotativa dos grupos e com apoio de membros da comunidade.
“Já fomos ver um alambique, um moinho e castanheiros. Também estivemos na ribeira das Chitas, onde desemboca no rio Lis, e fomos ver fósseis”, conta o João Vieira, um dos vizinhos. “Ele e a D. Alice [a esposa] já fazem parte da mobília”, brinca a professora Paula Almeida, explicando que as visitas ao exterior são organizadas em função dos conteúdos das aprendizagens essenciais (que constam do programa curricular).
A docente destaca ainda as três horas semanais destinadas ao desenvolvimento de projectos, com temas escolhidos pelos alunos. Sob orientação dos professores, são também as crianças que planificam, pesquisam, recolhem e tratam a informação e preparam a apresentação do resultado final à comunidade.
“O melhor ano de escola”
Representante da associação de pais, Ivânia Soares reconhece que, inicialmente, as mudanças provocaram apreensão, receio que, garante, já se desvaneceu, com a dinâmica de trabalho da escola “de todos com todos”. “Está a ser o melhor ano de escola do meu filho. Nas férias de Natal houve crianças a perguntar quando recomeçavam as aulas, porque já tinham saudades”, partilha.
Também o director do agrupamento não tem dúvidas de que esta é uma aposta ganha. Jorge Dias conta que um dos motivos para a escolha da EB1/JI do Vidigal se prendeu com o facto de esta ser “uma escola de passagem”. Ou seja, “muitos alunos inscreviam-se, porque não havia vaga nas escolas mais urbanas e, assim que conseguiam lugar, pediam a transferência”. “Queríamos criar raízes, fazer com que as crianças gostassem de cá estar e quisessem continuar, objectivo que está plenamente conseguido.