A partir das 19:30 horas, todas as terças e sextas-feiras, é quase certo. Só compromissos profissionais impedem Susana Feitor de se juntar às cerca de 40 pessoas nos treinos funcionais do Grupo Desportivo de Pedreiras (GD Pedreiras), em Porto de Mós.
“Não vou lá dar treino, eu treino com eles”, frisa a antiga marchadora, que encontrou no GD Pedreiras um local para descontrair e, ao mesmo tempo, manter os hábitos desportivos.
Na carreira constam as medalhas de bronze nos Mundiais de Helsínquia (2005) e nos Europeus de Budapeste (1998), o título de campeã do Mundo e da Europa no escalão de júnior, ou o recorde nacional de 20 quilómetros marcha (2001), que manteve durante sete anos. No total, são 58 internacionalizações ao serviço de Portugal, a última em Maio de 2016.
Nada disso importa quando os treinos começam. Ali, são todos iguais e procuram alcançar os mesmos objectivos: criar hábitos desportivos saudáveis e, ao mesmo tempo, conviver.
O aquecimento precede um circuito de exercícios que trabalham o corpo todo. A marcha atlética está presente numa das estações, não fosse o treino então planeado por uma das mais conceituadas marchadoras do país.
“No outro dia ensinei o pessoal a marchar e expliquei alguns exercícios. Evito marchar porque fico com dores e é muito difícil. Os exercícios faço, claro. Aqui também tento preparar toda a musculatura. Muitas destas pessoas são exactamente como eu. Estamos demasiado tempo sentados, seja dentro do carro ou no escritório”, exemplificou a atleta.
A música de fundo dá ritmo a cada exercício, enquanto Susana Feitor motiva os parceiros. O divertimento e a persistência fazem parte de cada treino, onde é quase visível a união e espírito de entre-ajuda. “Sempre que puder conciliar a actividade profissional, seja de gestão ou do treino, nunca quero deixar de ter esta parte. Faz-me falta, eu gosto”, afirmou a também presidente da Fundação do Desporto.
A ligação ao GD Pedreiras surgiu no decorrer da vida académica. Os pódios apareceram rapidamente na carreira desta marchadora, que cedo percebeu as dificuldades associadas ao alto rendimento. “Uma coisa que o atleta tem certa é que, algum dia, vai terminar a carreira”.
Quando tirou o curso de treinador de atletismo – grau I, na Associação de Atletismo de Leiria, o estágio decorreu no GD Pedreiras, o clube mais próximo da sua residência, em Rio Maior. “Tinha marchadores jovens e muita criançada. Fui tão bem recebida que continuei a vir”, detalhou.
Primeiro, dava apoio à secção de atletismo e esteve responsável por alguns atletas de marcha. Ao mesmo tempo, tirava o curso de Técnico de Exercício Físico em Lisboa, o que obrigou a fazer algumas “piscinas”. Acumulou ainda a licenciatura em Gestão das Organizações Desportivas e a ligação ao GD Pedreiras continuou.
“Se não vier aqui não tenho tempo para treinar, praticamente. Venho, faço o treino com eles e divertimo-nos”.
Trabalho reconhecido
Luís Ribeiro, presidente do GD Pedreiras, reconhece o mérito de Susana Feitor no desenvolver do clube.
Sendo este um clube essencialmente de formação, com diversas modalidades que vão do atletismo ao karaté, a direcção quis colocar “a malta a fazer exercício”, quando viu os pais à espera dos atletas no recinto do clube. “O pessoal gostou tanto da Susana que esgotámos logo as inscrições. A ideia era ser só quando [as crianças] treinam, das 19:30 às 20:30, e tivemos de abrir uma segunda hora, das 20:30 às 21:30”, comentou.
Habituada a pisar grandes palcos internacionais, Susana Feitor admite que não sente falta dos pódios. “Sinto falta é do ambiente”, reconhece.
Com cinco Jogos Olímpicos no palmarés, a antiga recordista não esquece os valores adquiridos ao longo da carreira. “A partir do momento em que estamos na competição, damos tudo para conseguir sempre superar e fazer hoje melhor que ontem, para que amanhã a esperança se mantenha viva. Nós somos assim.”
Esta vontade de tentar sempre melhor mantém-se “entranhada” na vida profissional da antiga atleta olímpica, que assumiu há um ano a presidência do conselho de administração da Fundação do Desporto.
“Não tem sido fácil porque a fundação é coordenadora dos 13 Centros de Alto Rendimento em Portugal. Vejo um potencial enorme nesta entidade em angariar capital privado para apoiar projectos desportivos, atletas e clubes. Nomeadamente o desporto como o conhecem aqui, porque este desporto, se não forem os municípios a apoiar e alguns patrocínios [de empresas] que dão porque gostam de dar, deixa de existir”, sublinha.
Com toda uma vida ligada ao atletismo, a velocidade é um dos elementos que ainda tenta implementar na actividade profissional: “O caminho faz-se caminhando, mas gostava que fosse mais rápido”.