Vivemos num tempo sem tempo e, sobretudo, sem rumo, onde predomina a indiferença a tudo o que não nos atinja individualmente. Menosprezamos, como se ignorássemos, a evidência de que o que é mau para todos também o é, necessariamente, para nós, seja o degelo, a desflorestação da amazónia ou a poluição dos mares.
O primado do lucro e do dinheiro fácil conduz-nos, dia para dia, à morte do poder com base nas ideias, muito por causa da progressiva falta de qualidade ética e intelectual daqueles que têm dominado os aparelhos tradicionais de designação e escolha política, assistindo-se a uma cavalgante substituição do poder político pelo poder económico.
O alucinante avanço deste novo poder leva à competição desenfreada e à morte da cooperação, esta que foi, desde a “noite dos tempos”, a argamassa que cimentou as civilizações. É a vitória do niilismo e o soçobrar do humanismo.
Desde os bancos da pré-primária que as crianças são instigadas a competir entre si, formatadas, desde logo, a desenvolverem-se egoisticamente como futuros pilares da construção de um novo tempo em que impera o individualismo. Sejam os ratings das escolas, os quadros de honra ou as distinções de mérito, todos os caminhos incitam à [LER_MAIS] prossecução do objetivo primeiro, se não o único, que é “ganhar”.
Entretanto a escola, como se nada tivesse mudado no último quarto de século, continua com os mesmos métodos e a mesma filosofia limitando-se a aumentar, a níveis irracionais, o peso nas mochilas das crianças, ou a aderir às tendências de consumo como o dia do pai e o da mãe, que são uma violência para as crianças órfãs ou com progenitores disfuncionais.
A escola continua a ignorar as múltiplas debilidades a que está sujeito o universo escolar, sejam elas as disfuncionalidades familiares ou capacidades parentais deficitárias, continuando a basear-se no velho e enganoso chavão “a educação vem de casa”.
É a própria escola a refutar o seu nobre e imprescindível papel educacional, resignando-se à sua incumbência na transmissão do saber, renunciando, implicitamente, à função primordial de contribuir para a construção do Ser. A escola tem de ter em conta as realidades sociais e os contextos familiares.
A única forma de ensino, verdadeiramente, democrático é aquele que procura combater barreiras e esbater assimetrias. Tal objetivo só se consegue através de um ensino inclusivo e justo. E também não será com alterações cosméticas, como o fim do segundo ciclo, que motivaremos as nossas crianças e jovens que, cada vez mais, morrem de tédio ante um ensino da “era” do telefone fixo, pensado, na forma e conteúdo, para os seus pais e avós.
O vertiginoso mundo da informação antecipa, enormemente, tendências e preferências, razão pela qual devesse ser equacionada a possibilidade de os alunos poderem escolher no sétimo ano de escolaridade a via por onde querem seguir.
Algo tem de ser feito para trazer de volta o gosto pela escola e o amor pelo saber que são o combustível das ideias e do progresso da Humanidade.
*Movimento Cívico – INTERVIR JÁ
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990