O litígio arrasta-se há mais de uma década. De um lado, há uma fundação, criada por uma freira e pelo seu sobrinho e a uma congregação com sede em Fátima, na qual aquela religiosa foi superiora e que está à beira da extinção, por falta de elementos. Do outro, encontra-se a Diocese de Leiria-Fátima.
Em disputa, há um vasto património acumulado pela congregação, composto por mais de uma dúzia de imóveis, entre casas de habitação, terrenos e outras propriedades espalhadas por todo o País, incluindo os Açores.
O litígio deu origem a diversos processos judiciais, em várias instâncias. Um deles conhecerá novos desenvolvimentos na próxima semana, com o início de um julgamento no Tribunal de Leiria – Juízo Centro Cível. No centro da contenda está um prédio, localizado em Ponta Delgada, avaliado em 822.400 euros.
A presente acção foi interposta pela Fundação Divino Coração de Jesus e pela Pia União das Escravas do Divino Coração de Jesus contra a Diocese de Leiria-Fátima, o seu bispo, D. António Marto, e Luís Anselmo, ligado ao Conselho Diocesano de Assuntos Económicos de Angra do Heroísmo que, em 2008, foi nomeado pelo bispo de Leiria como comissário-adjunto, conferindo-lhe poderes de representação daquela congregação religiosa. A acção visa ainda um instituto religioso, o Seminário Pio XII.
De acordo com o processo a que o JORNAL DE LEIRIA teve acesso, os autores da acção pedem a nulidade de actos praticados por aquele comissário. No caso em apreço, solicita- se que seja considerada nula a “confissão” que fez em representação da Pia União, através da qual a congregação aceita a “nulidade da escritura de justificação” de como era “dona e legítima possuidora de prédio sito à Rua Barão das Laranjeiras, nº 164”, na cidade de Ponta Delgada, e reconhece o Seminário Pio XII com seu “legítimo proprietário”.
[LER_MAIS] O edifício em causa é constituído por “casa de habitação de rés- -do-chão, primeiro andar e sótão, com área coberta de 452,98 metros quadrados [m2], mantendo um logradouro afecto a essa construção com a área de 737,02 m2”.
Os autores sustentam este seu pedido na alegada falta de poderes de Luís Anselmo para representar a Pia União, não reconhecendo validade ao decreto episcopal que determinou a sua nomeação como comissário-adjunto para coadjuvar na administração da congregação, com poderes de a representar.
Este processo, cuja audiência está marcada para a próxima terça- feira no Juízo Central Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, é mais um episódio num caso que se arrasta nos tribunais desde 2007, com a Diocese de Leiria-Fátima a pedir a nulidade da escritura, outorgada em 2006, que criou a fundação, para a qual foi transferida grande parte do património da congregação.
A instituição diocesana tem alegado, entre outros fundamentos, que é “nula” a credencial, emitida em 2005 pelo anterior bispo de Leiria-Fátima, na qual o prelado concede à superiora da congregação “poderes para pôr em prática actos necessários à criação de uma fundação de natureza social, que garanta no futuro a permanência do espírito que presidiu à organização e fins da Pia União”, nomeadamente, “assegurar a continuidade da sua acção social junto das comunidades locais”.
Por seu lado, os representantes da fundação alegam que a Pia União é “uma associação privada de fieis sobre cujos bens a diocese não tem poderes de administração directa ou indirecta” e que “não carece de qualquer autorização para constituir fundação ou para afectação de bens à mesma”.
Diocese alega estar a zelar por “bens eclesiásticos”
Na única posição pública tomada pela Diocese de Leiria-Fátima sobre o assunto, transmitida em forma de comunicado publicado em 2010, a instituição justificava a sua acção, nomeadamente a interposição de processos em tribunal, com a necessidade de “zelar para que os bens da Pia União sejam usados para as finalidades próprias, religiosas e caritativas, para as quais foram doados”.
Nesse comunicado, a diocese assegurava ainda que, em caso de extinção da Pia União, o destino dos seus bens “respeitará inteiramente a finalidade que orientou a actividade deste entidade religiosa, conforme as determinações do Direito Canónico”.