A licenciatura em Desporto e Bem-Estar tem vindo a afirmar-se no panorama nacional. Em que difere este curso de outros do País?
Nos últimos 5, 6, 7 anos o curso tem-se vindo a afirmar, como prova o elevado número de estudantes que nos procuram. Levamos normalmente 50/51 vagas ao Concurso Nacional de Acesso e temos cerca de sete vezes mais procura. A tendência tem sido crescente. Por exemplo, em 2019, o curso tinha cerca de 4,35 vezes mais procura face à oferta e nos últimos dois anos andamos na casa das sete vezes. Também correspondemos às necessidades do mercado de trabalho, tendo uma taxa de 80/90% de estudantes que ficam empregados nas suas áreas de formação. É o único curso dentro desta região de Leiria e Oeste, portanto, temos esta força. Do ponto de vista da média de entrada, que também é um indicador da qualidade da formação, não só pedagógica, mas sobretudo a alicerçada em bases científicas sólidas, é já perto de 14 valores.
Na primeira opção, quantos estudantes ficam de fora?
Temos cerca de 330 a 370 candidatos, dos quais entre 70 a 90 em primeira opção, o que significa que o curso fica cheio na primeira fase. Temos estudantes que querem mesmo Desporto e Bem-Estar em Leiria e não entram. E se formos à segunda fase, dobra o número de candidatos que concorrem, pelo que, se o curso crescesse, poderíamos ter facilmente 100, 120 alunos e ainda ficaríamos abaixo daquilo que são os números da procura.
O estigma sobre os alunos que escolhem esta licenciatura já se esbateu ou ainda se pensa que é um curso fácil e pouco exigente?
O estigma tem vindo a desaparecer. Actualmente, o desporto é entendido como uma forma de actividade física, definida como qualquer movimento realizado pelo sistema músculo-esquelético que implique dispêndio energético. Nesta perspectiva, a actividade física, manifesta-se, sobretudo, através do exercício físico e do desporto, mais no âmbito do treino desportivo, que são as duas áreas que constituem o principal foco da nossa formação. A exigência científica e prática do curso é bem reconhecida, pelo que a formação é séria e prepara profissionais altamente qualificados. Damos uma base sólida em termos de Ciências do Desporto, o que permite aos estudantes procurar formações mais específicas ao nível do segundo ciclo.
Que novas ofertas formativas estão previstas?
Somos um grupo bastante dinâmico, com provas dadas naquilo que somos capazes de fazer, não só do ponto de vista pedagógico, mas também do ponto de vista científico, com muita produção científica e muitos projectos associados. Na semana passada, saíram os resultados da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) relativamente às unidades de investigação, onde o Politécnico teve resultados excelentes e o Centro de Investigação e Desporto de Saúde e Desenvolvimento Humano (CIDeSD), em particular, chegou ao excelente. Esta unidade de investigação que trouxemos para o Politécnico terá um financiamento na ordem dos 3,7 milhões de euros para investigar. Não só fazemos parte dessa unidade, como também somos um polo de gestão, o que nos permite outorgar o grau de doutor. Submetemos agora o mestrado em Desporto para Pessoas com Deficiência. Esta é uma área onde temos muitos projectos de intervenção comunitária e que têm formado estudantes ao nível do mestrado e do doutoramento. Com isto, temos formado estudantes e colegas que enveredam por estas linhas de investigação também associadas ao CIDeSD, onde criam conhecimento de ponta. O curso TeSP [Técnico Superior Profissional] de Intervenção Sociocultural e Desportiva atrai muitos estudantes. Aproveito para referir que a licenciatura em Desporto e Bem-Estar foi acreditada, em Janeiro, por mais seis anos pela A3ES (Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior), o que demonstra a evolução que tivemos. Neste momento, estamos saudáveis, sólidos e com uma procura muito grande, suportados por grandes alicerces pedagógicos e científicos. Temos também um mestrado em Prescrição de Exercício e Promoção da Saúde que é diferenciador, e que vai atraindo muitos profissionais, como treinadores de desporto, fisioterapeutas, enfermeiros ou médicos, que procuram esta especialização.
Que projectos têm junto da comunidade e qual a importância que dão ao desporto adaptado?
Temos uma essência do ponto de vista do ensino: os estudantes aprendem fazendo. Por exemplo, temos a unidade curricular de actividade física adaptada, que no antigo plano de estudos tinha 45 horas de contacto. Face à necessidade de os estudantes explorarem dimensões práticas associadas a diferentes deficiências pedimos à A3ES um aumento de 15 horas. Assim, os estudantes têm as aulas ditas teóricas, pois têm de ter uma base científica e pedagógica, e procuramos levá-los a instituições para que aprendam fazendo. Foi criado o projecto Desporto para Todos, que permite melhorar a qualidade de vida desta população, mas também recolher dados para investigação e nos podermos catapultar para outros patamares, nomeadamente, melhorar o nosso foco em termos de intervenção. A área da deficiência é cada vez mais emergente e onde se assiste a necessidades e a programas específicos de exercício, com vista a melhorar, sobretudo, a qualidade de vida das pessoas.
Este curso tem contribuído para a qualificação dos técnicos nos ginásios da região?
O desporto tem particularidades e podemos ter treinadores de desporto ou técnicos de exercício físico que não vêm da academia. Obviamente, aquilo que privilegiamos é que quem esteja a intervir com as pessoas seja formado na academia, porque tem uma base científica e pedagógica muito mais alargada. Procuramos, neste sentido, especializar cada vez mais os nossos estudantes para as necessidades da população, que está cada vez mais envelhecida. Percebemos que com o avançar da idade vão-se desenvolvendo determinadas patologias e a actividade física previne várias doenças e ajuda a atenuar outras. Quando prescrita de forma correcta, com intensidades adequadas, a actividade física pode funcionar como um amortecedor no combate a diferentes doenças. Na unidade curricular de gerontomotricidade, os estudantes vão a diferentes lares para perceber no terreno as dificuldades que os idosos sentem. O programa de exercício tem de ser cada vez mais ajustado às características de cada pessoa.
O envelhecimento activo é cada vez mais importante?
Sem dúvida alguma e a actividade física é uma aliada. O que queremos com as ferramentas práticas que leccionámos, com bases científicas sólidas, é que os estudantes que intervêm nestes contextos possam ajudar ou criar as condições para que essas pessoas tenham um envelhecimento cada vez mais activo, aumentando os seus níveis de actividade física diários.
O curso tem a acreditação de treinador de desporto pelo Instituto Português do Desporto e da Juventude em várias modalidades. Está agora em apreciação o futebol. Que vantagens trará?
Nós correspondemos àquilo que são os referenciais dos treinadores. Neste momento, temos já acreditado o andebol, basquetebol, natação, orientação, voleibol e surf. O futebol é um mundo à parte e temos insistido muito com a Federação Portuguesa de Futebol por causa da acreditação, porque há uma necessidade muito grande dos nossos parceiros. Todos os anos lançamos para estágio cerca de 55 a 60 estudantes e os clubes de futebol da região de Leiria e Oeste procuram-nos a pedir estagiários. Após afinarmos algumas questões dos programas das unidades curriculares, que nos permitem ter correspondência directa àquilo que são os referenciais de treinador para a modalidade de futebol, voltámos a submeter o pedido de acreditação. Queremos acreditar que desta vez será positiva. A vantagem é directa na região. Se tivermos a acreditação ao futebol, e considerando os dados disponibilizados no InfoCursos da Direcção-Geral do Ensino Superior, possivelmente teremos mais 100 candidatos para 50 vagas, porque o futebol é um chamariz muito grande. Também nos vai permitir “alimentar” todos os clubes que nos solicitam os estagiários no âmbito do futebol e vamos tornar-nos ainda mais atractivos.
E há capacidade de resposta para agregar mais estudantes, até em termos de espaço?
Contamos muito com os espaços exteriores, porque o campus não tem espaço para absorver as modalidades todas que oferecemos. A questão é que ou poderemos pedir para reafectar mais algumas vagas para termos mais estudantes, ou funcionaremos com turmas mais pequenas, desdobradas, para não perder a qualidade pedagógica e científica associada.
A criação da nova ESECS dar-vos-á melhores condições?
Assim o esperamos, porque será uma escola moderna, que terá mais espaço face às instalações actuais. Obviamente, contando sempre com os espaços exteriores, porque se estão aqui perto, não faz sentido estarmos a construir piscinas, campos ou pistas de atletismo na ESECS.
Este crescimento é um passo para criar uma escola de desporto no Politécnico de Leiria?
Isso é uma questão interna do Politécnico que só o senhor presidente poderá responder. Mas, para quem coordena um curso que está a crescer bastante, seria bom ter autonomia? Se me colocar as coisas nessa perspectiva, claro que é bom ter autonomia. Não digo que não gostava e acho que ganharíamos com isso. Agora, do gostar ao ser… é uma questão a que o senhor presidente terá de responder.
Os docentes da licenciatura em Desporto e Bem-Estar têm desenvolvido investigação?
A formação dos professores que leccionam no curso é importante, com projectos não só científicos como associados à intervenção mais comunitária. Os professores têm tido reconhecimento com vários prémios científicos, o que nos dá uma garantia de solidez pedagógica e científica e nos permite estar na vanguarda daquilo que as Ciências do Desporto preconizam nas suas diferentes ramificações. O corpo docente está a produzir em média 40 a 50 artigos por ano, em diferentes áreas do desporto, o que nos dá uma alavancagem muito grande. E estamos a conseguir que cerca de 50% dos estudantes de mestrado em Prescrição do Exercício Físico e Promoção da Saúde terminam com os trabalhos publicados em revistas científicas. Alguns seguem para doutoramento, pois sentem que as bases são sólidas, o que não deixa de ser também um indicador de excelência daquilo que fazemos. Tudo isto, associado à classificação de excelente do CIDeSD acompanha a transformação do Politécnico em Universidade.
Da sua experiência, a competição a sério deveria começar a partir de que idade?
Sou um defensor do modelo de intervenção do psicólogo canadiano Jean Côté. Ele chama-lhe o modelo do desenvolvimento da participação desportiva e baliza isto em três grandes faixas etárias. Se pensarmos nisto numa perspectiva de funil, entre os 6 e os 12 anos, os jovens devem aprimorar as suas competências motoras e, sobretudo, têm de se divertir com a prática desportiva e praticar o maior número possível de modalidades. Entre os 13 e os 15, os jovens podem praticar duas modalidades, aquelas em que se sentem mais confortáveis e onde se divertem efectivamente. A partir dos 16 anos chegamos ao fundo do funil, e eles podem especializar-se. Com isto evitamos especializações precoces, demasiadas pressões e estamos a criar uma base forte naquilo que é a própria promoção da actividade física. Uma vez que os níveis de actividade física são cada vez piores em Portugal, com este tipo de estratégias, conseguimos aumentar a prática da actividade física, porque um jovem que seja activo na sua infância, quando chegar à adolescência e à idade adulta tem melhores condições para continuar a ser activo, comparativamente a um jovem que não foi tão activo. O desporto tem de ser divertido. Isto é que é fundamental. O jovem tem de ir ao treino porque gosta e não porque alguém o pressiona ou porque quer ser convocado ao domingo.