Dono de uma extensa costa e de uma das maiores Zonas Económicas Exclusivas do mundo, Portugal “ainda se encontra muito aquém do seu potencial” em matéria de economia do mar, tendo em conta o know-how acumulado e a capacidade de investigação e desenvolvimento instalada, aponta o estudo A economia do mar em Portugal, efectuado pela EY/Augusto Mateus e Associados.
A propósito do Dia Mundial dos Oceanos, que se comemorou este sábado, fomos tentar perceber quanto vale a economia do mar e que desafios há ainda a superar. “O mar e os seus recursos cada vez mais se afirmam como um elemento chave indispensável das economias do futuro”, frisa aquele trabalho. No distrito de Leiria, são várias as empresas e entidades que já o perceberam e têm vindo a trabalhar em conjunto para valorizar e potenciar estes recursos.
“A efectiva valorização futura da economia do mar em Portugal representará um elemento decisivo para o crescimento e para o perfil futuro da economia nacional, seja como resposta às necessidades que as sociedades do futuro irão certamente enfrentar ou, mais estrategicamente, enquanto alavanca de afirmação do nosso país no Mundo”, aponta o documento.
O estudo da EY/AM&A, produzido para o Millennium BCP, focou-se em quatro fileiras-chave, “pela sua relevância e tradição”: pesca, aquicultura e indústria do pescado; transportes marítimos, portos e logística; construção, manutenção e reparação naval; turismo e lazer ligados ao mar.
Em conjunto, estas quatro áreas são responsáveis por cerca de 105,5 mil empregos, oito mil milhões de euros de volume de negócios anual e 2,8 mil milhões de Valor Acrescentado Bruto. Ou seja, asseguram cerca de 2,7% do emprego e 3% do VAB da economia nacional.
A fileira do turismo e lazer ligado ao mar é a mais relevante, seguindo-se a da pesca. A primeira gera um volume de negócios anual de 4,8 mil milhões de euros e emprega 77 mil pessoas. Mas “continua abaixo do seu potencial”, havendo “importantes oportunidades que podem ser capitalizadas”.
Uma delas é o surf, que “começa a ganhar protagonismo, com a divulgação e mediatização de destinos como Nazaré ou Ericeira”, mas também de Peniche, onde se tem realizado o Moche Rip Curl, cujos impactos económicos ultrapassam os 10,5 milhões de euros.
Quanto à fileira da pesca, aquicultura e indústria do pescado, “tem vindo a demonstrar uma dinâmica de crescimento assinalável”. Integra cerca de 4900 empresas, que empregam aproximadamente 20 mil trabalhadores e geram um volume de negócios de quase 1,8 mil milhões de euros. “A região Centro apresenta-se como a geografia mais significativa da fileira em Portugal, tanto em dimensão como em performance”.
Em 2016 (últimos dados disponíveis), de acordo com o estudo, Torres Vedras era o principal polo empresarial desta fileira, com 190 milhões de euros (para isto muito contribui a Riberalves, que factura mais de 100 milhões por ano). Seguia-se Ílhavo, com 182 milhões, e Peniche, com 139 milhões de euros.
É neste concelho, aliás, que está sediado um dos principais players desta fileira, a European Seafood Investments, que segundo o estudo regista um volume de negócios anual entre os 75 e os 100 milhões de euros.
Rui Azevedo, secretário-geral do Fórum Oceano, frisa ao JORNAL DE LEIRIA que quando se fala em economia do mar há que ter em conta que turismo, pesca e transformação, portos e logística e indústria naval são as áreas mais consolidadas, e que “constituem o essencial” do contributo dado à economia portuguesa. “Não é fácil fazer a contabilização, mas representam na ordem dos 3 a 3,5% do VAB e do emprego nacional”.
O responsável desta associação da economia do mar refere que os sectores emergentes – biotecnologia marinha, energias marítimas renováveis e exploração mineral – são os que apresentam um potencial de crescimento mais significativo a longo prazo. “Exigem tempo, investimentos elevados, tecnologia e conhecimento”.
Para promover e potenciar estas actividades emergentes colocam-se a Portugal vários desafios, num horizonte de 10-15 anos, aponta o estudo. Um deles é a criação de incentivos que promovam a transferência e valorização de conhecimento, bem como o investimento em novas actividades de elevado valor acrescentado ligadas ao mar, como a produção de eólicas offshore, biotecnologia azul, ou robótica multi-domínio, entre outras.
Há também que fazer uma aposta “incisiva” no ensino e formação, bem como na I&D ligada ao mar, “designadamente nas áreas consideradas prioritárias na agenda temática de investigação e inovação para o mar” definida pela Fundação para Ciência e Tecnologia.
Outros dos desafios situam-se ao nível da renovação dos modelos de negócios das actividades tradicionais da economia do mar. Nesta matéria, o estudo elaborado pela equipa liderada por Augusto Mateus assinala quatro grandes apostas, começando por recomendar o “desenvolvimento de esforços para a atracção de investimento com vista à reconversão e qualificação dos estaleiros nacionais, capacitando-os para a inserção (individual e em colaboração) nas cadeias produtivas europeias e globais da produção de componentes avançados e construção de navios de maior valor acrescentado”.
[LER_MAIS] Aconselha ainda o desenvolvimento de incentivos à modernização da frota pesqueira (navios maiores e mais eficientes e com outras valências como, por exemplo, processamento inicial em alto mar) e desenvolvimento de esforços diplomáticos para permitir o seu acesso a outras áreas de pesca (como ocorre nos principais países europeus)”.
A ameaça da poluição
A poluição é uma séria ameaça aos oceanos e tem crescido de ano para ano. Não sendo a única fonte de poluição, os plásticos ocupam uma posição de destaque nesta matéria. A ONU lembra na sua página da internet que oito milhões de toneladas deste material acabam todos os anos nos oceanos.
“A preservação do mar e dos seus ecossistemas, dada a sua importância para o planeta e para a vida em geral, assim como para a manutenção e sustentabilidade dos recursos económicos” é, assim, um dos “desafios nucleares” a que é preciso dar resposta, lê-se no estudo da EY/AM&A. Também Rui Azevedo, secretário-geral do Fórum Oceano, frisa que a preservação dos oceanos “é fundamental”.
Os agentes económicos “têm de ter em consideração a necessidade de minimizar os impactos sobre o mar”, por um lado, e a sociedade em geral tem também de ter consciência que é preciso preservar os oceanos. “80% da poluição dos mares tem origem na terra, quer nas actividades económicas quer em comportamentos inadequados das populações”.