Às vezes, quanto maior é o mundo a que podemos em qualquer momento aceder mais parece encolher o mundo que arrumamos dentro da cabeça e nos circunscreve as opiniões a defender ao transe, as emoções a ferver num lume muito vivo, e os desejos de justiça, de vingança, e de vencer, como se fossem os últimos.
Olhamos em frente demasiado focados na nossa ideia de bem e de mal para conseguirmos ver alguma coisa, o certo e o errado são da cor que nós usamos e de mais nenhuma, e explicamos com uma definitiva certeza como foi, como deverá ser, ou como deveria ter sido feito.
Colectamos indícios e opiniões, seleccionamos visões a condizer, congregamos factos que nos sirvam de arrimo e, seguríssimos, quais Quixotes sem Sancho Pança, agarramos moinhos pelos colarinhos, retalhamos-lhes as velas, esgrimimos contra o vento, e vamos ladrando à Lua para que não deixem de nos ouvir. Pouco importa a Dulcineia, o que importa é o ferro e o fogo de cada batalha, a ser ganha ao transe, porque ganhar é bom e faz-nos muito bem ter razão. Do outro, de quem inevitavelmente tratam essas batalhas, nem vê-lo.
[LER_MAIS] Procurar entender por que fez, por que não terá feito, o que pensou, por que não sentiu, o que terá sentido, por que permaneceu ou por que se foi embora, isso não importa, porque sobre esse outro somos nós quem dá todas as respostas, sapientes e seguríssimos das suas motivações e circunstâncias, e mais do que certos da nossa abalizada opinião. E ficamos, claro, sem saber absolutamente nada sobre o que realmente importa: o outro de que a história trate.
Empatia. É um três em um que junta a capacidade de compreender um estado emocional (pathos), a capacidade de elaborar pensamento sobre esse estado, e a capacidade de lhe criar uma resposta. É um olhar o outro através de nós, mas sem nos confundirmos com ele; é calçar os seus sapatos, não os nossos, e percorrer o seu caminho.
É um se eu fosse tu, como faria/sentiria eu? Às vezes será melhor talvez parar, e demorarmo-nos a ouvir o que soar até que tudo o que realmente não interessa se reduza lentamente a um zumbido e sobre por fim um espaço para pensar. Um espaço para ter razão, sim, mas aonde tenham já também chegado as razões do outro.
*Professora de dança