“Estamos a recusar obras por falta de pessoal”. A Construções Vieira Mendes, da Batalha, é uma das muitas empresas que se deparam com a dificuldade em recrutar trabalhadores. Há duas semanas que tem na rua um anúncio para recrutar um encarregado e um chefe de equipa, mas “está difícil” de conseguir. “Só apareceram pessoas estrangeiras, e poucas”, conta ao JORNAL DE LEIRIA Vítor Mendes.
O empresário acredita que a falta de mão-de-obra se deve a três factores: muitos profissionais da construção emigraram, outros tantos reformaram-se e os jovens não querem trabalhar nesta área. O problema, garante, não são os ordenados baixos. “Está-se a pagar muito bem. Um bom pedreiro ganha quase dois mil euros, mais do que um engenheiro”. Na sua empresa, diz Vítor Mendes, há trabalhadores a “ganhar mais do que dois mil euros limpos”.
Segundo a Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário, estão em falta 70 mil trabalhadores. Também a Associação Regional dos Industriais de Construção e Obras Públicas de Leiria e Ourém (Aricop) tem alertado para o problema da falta de trabalhadores.
“A gravidade do problema impõe que se procurem soluções a curto prazo que atenuem os efeitos deste estrangulamento provocado pela falta de mão-de-obra”, pelo que a associação lançou, em conjunto com o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), o projecto RAMP – Construction Academy, que consistirá em formação teórica e prática para jovens que queiram entrar no sector.
“Dada a dimensão e especificidade do problema”, a associação “tem a perfeita noção da necessidade de uma solução de âmbito global, mas este será o seu contributo para, em termos regionais, procurar atenuar a falta de mão-de-obra jovem e qualificada das empresas do sector da construção civil e obras públicas”, destaca José Luís Sismeiro[LER_MAIS], presidente da associação.
“Há várias semanas” que uma empresa de metalomecânica de Leiria tem um anúncio para recrutar um ajudante de serralheiro e um ajudante indiferenciado, “com vontade de aprender e de trabalhar”. Responderam “uma senhora de 40 e tal anos e um reformado com mais de 70”.
A dificuldade em contratar na região está a obrigar a gerência a ponderar tentar o recrutamento noutras zonas do País, assegurando o transporte dos trabalhadores. “Já fizemos isto em tempos, e até arrendámos casa para as pessoas ficarem durante a semana em Leiria”, conta Carlos Manuel.
Também para este empresário, o problema não está nos baixos ordenados. “Um indiferenciado ganhará entre 800 e 850 euros, mas mesmo assim não se arranja”.
Segundo o IEFP, em Outubro ficaram por preencher quase 24 mil ofertas de emprego. Actividades imobiliárias, administrativas e serviços de apoio, comércio, alojamento e restauração são os sectores mais afectados.
A Associação da Hotelaria e Restauração revelou recentemente que faltam mais de 40 mil trabalhadores no sector, dos quais cerca de 15 mil nos hotéis. Mas a escassez de pessoal é transversal a vários sectores, e sente-se quer no recrutramento de trabalhadores qualificados, quer indiferenciados.
A maioria (84%) dos empregadores ouvidos no último inquérito (Outubro) da Hays pretende recrutar em 2022, mas há menos trabalhadores qualificados disponíveis para mudar de emprego e a percentagem dos que recusaram ofertas este ano já atingiu 44%.
Para a consultora, a percentagem de empresas que tenciona recrutar é “um claro indicador de que os empregadores planeiam implementar em pleno” os seus planos de recuperação ou de crescimento. Intenção que pode ficar comprometida com a dificuldade em encontrar as pessoas certas. É que, segundo o Guia do Mercado Laboral, a percentagem de trabalhadores qualificados interessados em mudar de emprego caiu de 79% em 2021 para 74%.
Por outro lado, a percentagem de trabalhadores que recusou ofertas de emprego este ano atingiu os 44%, quando em 2020 tinha registado uma redução para 38%. Entre os principais motivos para a recusa de ofertas de emprego estão o salário, com respostas de 52% dos inquiridos nesse sentido (contra 49% em 2020), seguido pelo facto de o projeto não ser interessante (30%), ou pelo desacordo com as condições contratuais propostas (26%).
Os profissionais de tecnologias de informação foram os que mais recusaram ofertas de emprego em 2021, sendo que 19% assumiram ter recusado cinco ou mais ofertas, o que reflete “a grande procura que existe por este tipo de perfis”, realça a Hays.