Nos cursos científico-humanísticos os alunos são preparados para o ingresso no superior. No profissional, o principal objectivo é a entrada no mercado de trabalho.
No entanto, isso não significa que os estudantes que optam pelo ensino profissional não queiram seguir para o superior.
“Tenho-me apercebido que há cada vez mais alunos que, ao chegar ao último ano do curso, pretendem continuar os estudos. Saber que no início não tinham vontade, mas que ao chegar ao final do ciclo colocam essa hipótese, é muito gratificante”, conta Manuela Silva, professora na área de integração aos cursos profissionais na Escola Secundária Calazans Duarte, na Marinha Grande.
Há alunos que procuram ajuda em explicações para conseguirem fazer os exames de ingresso ao ensino superior. “Fazem um trabalho mais autónomo porque sentem que alguns conteúdos não são tão trabalhados”, afirma Manuela Silva, sublinhando que nos cursos profissionais a carga horária é inferior relativamente aos científico-humanísticos.
Sofia Ferreira, psicóloga na Escola Profissional de Ourém e na Escola de Hotelaria de Fátima, reconhece que os alunos “só têm vantagens por terem frequentado um curso profissional”. “Os que prosseguem para licenciaturas têm um trabalho de preparação para os exames, também apoiado por nós, e conseguem bons resultados”,explica.
E se, por um lado, há alunos que só durante ou no final do curso decidem que querem continuar os estudos, também há aqueles que, quando optam pelo ensino profissional, já têm essa ambição. Quem o diz é Luís Simões, psicólogo no Agrupamento de Escolas da Batalha. Os alunos fazem esta escolha porque consideram que num curso profissional podem ter um ensino “mais específico e mais prático”, explica.
“Eles sabem que podem continuar, têm é de estudar mais para os exames e acho isso extraordinário.”
No entanto, uma vez que no ensino profissional o principal objectivo é preparar os alunos para o mercado de trabalho, é desenvolvido outro tipo de aptidões.
“Conceder um conjunto de tarefas diversificadas e que atendam às especificidades” de cada aluno é o maior desafio para a professora Manuela Silva, que procura fomentar nos alunos [LER_MAIS] competências mais práticas, tais como, a criatividade, o sentido de responsabilidade, organização e a iniciativa, explica.
“Privilegio muito o trabalho em grupo. Os alunos gostam de trabalhar em equipa e isso permite fomentar a partilha e a organização, por exemplo, que são competências muito importantes para o mundo do trabalho.”
Maria José Sampaio, professora no Escola Profissional de Agricultura de Alcobaça, nota ainda que “após a conclusão do curso o feedback das empresas é muito positivo: os alunos são habitualmente elogiados pelo seu espírito de iniciativa, capacidade de trabalho e profissionalismo exemplar”.
Programa “demasiado fácil”
“Já tive alunos que quiseram continuar os estudos mas depois vêem que não conseguem porque o programa é muito mais difícil”, conta Alexandra Freitas, que vive em Leiria e dá aulas de Matemática na Escola Secundária de Alcanena.
A professora, que este ano está a leccionar cursos profissionais, nota que muitos estudantes acabam por optar por esta via por terem dificuldades a algumas disciplinas. No entanto, considera que o programa “está fácil demais”.
“O que damos em Matemática é mesmo o básico, mais fácil não podia ser. ”Isto leva a que os alunos se “acomodem” e “prejudica” aqueles que pretendem seguir para o ensino superior. No entanto, adianta, “nem todos os alunos estão para estudar no ensino superior.”
“Também são precisas outras profissões e eles agarram-se a elas, que também são importantes.” O “estigma” de que os alunos dos cursos profissionais são pouco empenhados e disciplinados tem vindo a desaparecer, observa Manuela Silva.
“Já tive turmas espectaculares, em que podia deixá-los a trabalhar sozinhos que eles cumpriam tudo.” Opinião corroborada pela psicóloga Sofia Ferreira: “hoje, o ensino profissional já não é uma oferta alternativa para determinados alunos menos competentes ou indisciplinados, mas uma opção a ser considerada por todos os alunos”.
O ensino profissional foi criado “para proporcionar ao aluno uma formação integral, dotando-o de competências e ferramentas essenciais para a sua inserção no mercado do trabalho”, realça também Maria José Sampaio, reconhecendo, no entanto, que “ainda há alunos que se inscrevem no curso profissional porque lhes disseram que era mais fácil e não tinham de estudar muito”.
“Os conteúdos abordados nas disciplinas das diferentes componentes assumem uma perspetiva diferente. O aluno é responsabilizado na construção do seu saber, na partilha, na colaboração, na resolução de problemas.”
O psicólogo Luís Simões afirma ainda que a “aposta na valorização” dos cursos profissionais tem feito com que a sociedade tenha deixado de dar este ensino a conotação negativa que já lhe foi atribuída.
Para o psicólogo, uma das grandes conquistas foi ter bons alunos a optar por um curso profissional. “Aquilo que se nota é um sentimento de competência menor nos alunos dos cursos profissionais do que nos científico humanísticos”,remata.